Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – Em sessão na terça-feira, 1, os desembargadores da 3ª Turma do TRF1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) decidiram enviar para o TJAM (Tribunal de Justiça do Amazonas) uma ação penal oriunda da Operação Maus Caminhos em que o ex-governador José Melo e cinco ex-secretários de Estado são denunciados por supostamente compor uma organização criminosa.
Por maioria, os magistrados rejeitaram o entendimento da desembargadora Mônica Sifuentes, que é relatora do processo, e acompanharam a divergência apresentada pelo desembargador Ney Bello que declarou a Justiça Estadual competente para julgar a ação. “(Decido) conceder a ordem de habeas corpus para determinar a competência da Justiça Estadual”, afirmou Bello.
Além do ex-governador José Melo, que foi cassado em 2017 por compra de votos nas eleições de 2014, nessa ação o MPF (Ministério Público Federal) denunciou a ex-primeira-dama Edilene Gomes de Oliveira, os ex-secretários Raul Zaidan (Casa Civil), Evandro Melo (Administração), Afonso Lobo (Fazenda), Wilson Alecrim e Pedro Elias (Saúde), e outras três pessoas.
No TRF1, o habeas corpus foi ajuizado por Afonso Lobo em março de 2019 para declarar a Justiça Federal incompetente para processar e julgar a Ação Penal 867-98.2018.4.01.3200, que tramita na 4ª Vara Federal do Amazonas. O ex-secretário alegou que as verbas supostamente desviadas através do esquema de fraudes têm origem estadual e não federal.
No mesmo mês, Mônica Sifuentes negou a liminar alegando que, ao examinar a questão, não encontrou qualquer prova que demonstrasse, “de forma cabal”, a natureza estadual das verbas supostamente desviadas. A magistrada citou “conflito” entre o acórdão do TCE (Tribunal de Contas do Amazonas) e o Relatório de Inspeção da CGU (Controladoria Geral da União).
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Mesmo sem apreciação do mérito do pedido pela Terceira Turma do TRF1, Lobo recorreu ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) em setembro de 2019, onde teve o pedido negado pelo ministro Nefi Cordeiro. Depois, o ex-secretário foi ao STF (Supremo Tribunal Federal), onde conseguiu liminar em outubro do ano passado suspendendo a ação penal contra ele.
Jurista ouvido pela reportagem do ATUAL afirma que a decisão do TRF1 ainda pode ser contestada pelo MPF no STJ, e a matéria pode chegar ao STF. No entanto, caso o entendimento seja mantido, se opera o efeito “Erga omnes”, que significa que a decisão valerá para todos. Na prática, todas as 76 ações penais oriundas da operação seriam enviadas para o TJAM.
Ainda de acordo com o jurista, se as ações penais da ‘Maus Caminhos’ forem enviadas para a Justiça Estadual, a legislação prevê que o juízo competente deve analisar se irá preservar os atos praticados na esfera federal. No caso da operação contra fraudes na Saúde do Amazonas, as decisões da juíza federal Ana Paula Serizawa poderão ser anuladas.
Custo Político
Em agosto de 2019, Serizawa interrogou Afonso Lobo, José Melo, Evandro Melo, Pedro Elias, Raul Zaidan, Wilson Alecrim, Afonso Lobo e José Duarte Filho. No dia 7 de agosto, Lobo afirmou à juíza Ana Paula Serizawa que foi à casa de Mouhamad Moustafá apenas três vezes para almoçar e que não dava tratamento preferencial ao médico.
O ex-governador José Melo chorou no interrogatório e disse que nunca se reuniu com o médico Mouhamad, a quem chamou de “fanfarrão e mentiroso”. Melo também alegou “questão de ética” para justificar a manutenção de contratos do ex-governador Omar Aziz, alvo da Operação Vertex.
Outro réu que chorou no depoimento à juíza Ana Paula Serizawa foi o ex-secretário Pedro Elias de Souza, que disse que pensava ser brincadeira as ofertas de propinas feitas pelo médico Mouhamad Moustafá. O ex-secretário de Saúde também alegou que o dinheiro que ele recebeu de Mouhamad se tratava de empréstimo que posteriormente foi devolvido.
Raul Zaidan afirmou que Mouhamad esteve na sua casa duas vezes para participar “socialmente” de missas que eram realizadas periodicamente e não para entregar dinheiro de propina como denunciou o MPF (Ministério Público Federal). Zaidan alegou que conheceu o médico da ‘Maus Caminhos’ quando passou por uma cirurgia em São Paulo em 2014.
Wilson Alecrim disse à juíza Serizawa que a suposta propina mensal de R$ 133 mil “é a maior mentira contra uma pessoa” e que o nome dele foi usado por Mouhamad. Neste mês, Alecrim foi condenado a 13 anos e quatro meses de prisão pelo crime de corrupção passiva por receber R$ 3,3 milhões em propina entre 2014 e 2016.
Ao negar amizade com Mouhamad, Evandro Melo disse que o médico se “aproveitou” da doença da mulher dele para se aproximar da família Melo. O ex-secretário de Administração confirmou que Mouhamad frequentava a sua casa à época em que ocorreram as fraudes em contratos do Estado, mas alegou que a relação deles era de “fornecedor e Estado”.
Procurado pela reportagem, o MPF informou que, em razão de a íntegra da decisão ainda não estar disponível no PJe (Sistema de consulta processual), “não é possível saber a sua extensão”. Ainda de acordo com o MPF, por se tratar de uma decisão do TRF1, em Brasília, a manifestação no caso – eventual recurso – cabe à PRR1 (Procuradoria Regional da República na 1a Região).