Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – A juíza Margareth Rose Cruz Hoagen, da 4ª Vara Criminal de Manaus, se declarou suspeita para julgar a denúncia por formação de organização criminosa contra o ex-governador José Melo, a ex-primeira-dama Edilene Gomes e os ex-secretários estaduais Afonso Lobo, Evandro Melo, Pedro Elias de Souza, Raul Zaidan e Wilson Alecrim. A ação começou a tramitar na Justiça estadual na segunda-feira, 15.
Hoagen alegou “motivo de foro íntimo”, mas não detalhou as razões pelas quais não pode analisar a denúncia contra os réus. No entanto, legalmente, a magistrada não é obrigada a explicar os motivos, pois o Artigo 145 da Lei Federal nº 13.105, de 16 de março de 2015, prevê que “poderá o juiz declarar-se suspeito por motivo de foro íntimo, sem necessidade de declarar suas razões”.
A denúncia foi apresentada pelo MPF (Ministério Público Federal) em fevereiro de 2018 no âmbito da Operação Maus Caminhos, que investiga desvio de R$ 104 milhões da Saúde do Amazonas. No último dia 5 de março, cumprindo ordem do TRF1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), a juíza Ana Paula Serizawa, da 4ª Vara Criminal da Justiça Federal do Amazonas, enviou a denúncia para a Justiça estadual.
Voto-vista
Em dezembro de 2020, no julgamento de um habeas corpus movido pelo ex-secretário Afonso Lobo, a Terceira Turma do TRF1 declarou a justiça federal incompetente para julgar as denúncias oriundas da operação. O entendimento contrariou decisão do próprio TRF1 que já havia negado um pedido similar ao de Lobo ao julgar um habeas corpus movido por Ney Jefferson Barroso de Souza, que é réu na operação.
Maria do Carmo Cardoso rejeitou o entendimento de Mônica Sifuentes, que é relatora do processo e havia votado pela federalização da operação, e acompanhou a divergência apresentada por Ney Bello, que alegou que o dinheiro supostamente desviado trata-se de recursos repassados ao estado na modalidade ‘fundo a fundo’, ou seja, são regulares e automáticos.
Além dessa ação penal, a força-tarefa da ‘Maus Caminhos’ apresentou outras 76 denúncias envolvendo corrupção, peculato, lavagem de dinheiro, dispensa indevida de licitação, tráfico de influência e embaraço de investigação. A decisão de Serizawa sinaliza que a maioria dessas outras denúncias será remetida para a Comarca de Manaus.
Em recurso apresentado ao TRF1 em fevereiro deste ano, as procuradoras da República Caroline Maciel da Mata e Luciana Marcelino Martins apontaram omissões e contradições na decisão que mandou as denúncias para a Justiça do Amazonas e pediram que se reconheça a competência da Justiça federal para o julgamento das ações penais. O recurso ainda não foi analisado.
Custo Político
Em agosto de 2019, a juíza federal Ana Paula Serizawa interrogou Afonso Lobo, José Melo, Evandro Melo, Pedro Elias, Raul Zaidan, Wilson Alecrim, Afonso Lobo e José Duarte Filho. Eles foram questionados sobre a relação com o médico Mouhamad Moustafá, que é apontado pelo MPF como líder do esquema criminoso.
No dia 7 de agosto, Lobo afirmou à juíza Ana Paula Serizawa que foi à casa de Mouhamad apenas três vezes para almoçar e que não dava tratamento preferencial ao médico.
O ex-governador José Melo chorou no interrogatório e disse que nunca se reuniu com o médico Mouhamad, a quem chamou de “fanfarrão e mentiroso”. Melo também alegou “questão de ética” para justificar a manutenção de contratos do ex-governador Omar Aziz, alvo da Operação Vertex.
Ao negar amizade com Mouhamad, Evandro Melo disse que o médico se “aproveitou” da doença da mulher dele para se aproximar da família Melo. O ex-secretário de Administração confirmou que Mouhamad frequentava a sua casa à época em que ocorreram as fraudes em contratos do Estado, mas alegou que a relação deles era de “fornecedor e Estado”.
Raul Zaidan afirmou que Mouhamad esteve na sua casa duas vezes para participar “socialmente” de missas que eram realizadas periodicamente e não para entregar dinheiro de propina como denunciou o MPF. Zaidan alegou que conheceu o médico da ‘Maus Caminhos’ quando passou por uma cirurgia em São Paulo em 2014.
Wilson Alecrim disse à juíza Serizawa que a suposta propina mensal de R$ 133 mil “é a maior mentira contra uma pessoa” e que o nome dele foi usado por Mouhamad. Em novembro de 2020, Alecrim foi condenado a 13 anos e quatro meses de prisão pelo crime de corrupção passiva por receber R$ 3,3 milhões em propina entre 2014 e 2016.
Outro réu que chorou no depoimento foi o ex-secretário Pedro Elias de Souza, que disse que pensava ser brincadeira as ofertas de propinas feitas pelo médico. O ex-secretário de Saúde também alegou que o dinheiro que ele recebeu de Mouhamad se tratava de empréstimo que posteriormente foi devolvido.