Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – A desembargadora aposentada do TJAM (Tribunal de Justiça do Amazonas) Encarnação das Graças Sampaio Salgado, que recebeu R$ 2,7 milhões sem trabalhar entre 2016 e 2021, acumulou rendimento líquido de R$ 659.781,08 no mês de dezembro de 2021. Maior parte desse valor foi referente a férias que, segundo o Tribunal, ela não usufruiu.
Salgado foi condenada à pena de aposentadoria compulsória pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) em junho do ano passado por proferir decisões irregulares em plantões judiciais. O colegiado aprovou o relatório do conselheiro Mário Guerreiro, que concluiu que a consequência das decisões de Encarnação foi a soltura indiscriminada de presos perigosos.
A aposentadoria da desembargadora, no entanto, só foi efetivada em outubro do ano passado, quando o presidente do Tribunal, desembargador Domingos Chalub, assinou o Ato nº 739, de 21 de outubro de 2021. O ato fixou o valor da aposentadoria dela em R$ 34,5 mil – equivalente ao salário integral de um desembargador da ativa.
A folha de pagamento de servidores do TJAM referente ao mês de dezembro registra que a magistrada recebeu R$ 100 mil da PAE (Parcela Autônoma de Equivalência). Esse valor foi a terceira parcela dos R$ 300 mil que cada magistrado que tem direito ao benefício recebeu no final do ano passado como forma de abatimento da dívida.
“Essa decisão (abatimento da PAE) foi possível graças ao aumento da arrecadação tributária do Estado no ano passado, elevando, por consequência, o repasse do duodécimo ao Judiciário, o que permitiu a quitação ou a amortização de dívidas da Corte, dentre elas, a amortização da PAE”, informou o TJAM.
Leia mais: Para abater PAE, TJAM pagará R$ 300 mil a cada magistrado até o fim do ano
Ainda conforme a folha de pagamento, além do abatimento da PAE, Salgado recebeu mais R$ 13 mil de indenizações (incluindo o valor de R$ 10 mil da PAE que mensalmente é pago para todos os magistrados), e indenização de R$ 546.781,08. Com esses valores, o rendimento líquido dela alcançou R$ 659.781,08 no mês de dezembro.
De acordo com o TJAM, o valor de meio milhão de indenização pago a desembargadora é decorrente de indenização de férias que ela tinha em aberto, ou seja, “não tirou férias quando do exercício regular de suas atividades no Judiciário Estadual”, e o valor foi pago na sua aposentadoria. Segundo o Tribunal, o pagamento teve aval do CNJ.
“Ressalta-se que o pagamento a título de indenização foi executado mediante consulta prévia ao Conselho Nacional de Justica (CNJ), realizada nos dias 18/08/2021 e 24/11/2021, conforme estabelece a Recomendação CNJ n. ° 31/2018 e o Provimento CNJ n.° 64/2017”, diz trecho de nota enviada pelo TJAM à reportagem do ATUAL.
Além de Encarnação, outro magistrado aposentado com rendimento líquido que ultrapassa a casa de meio milhão foi Sabino da Silva Marques, que recebeu R$ 882.900,80 no mês de dezembro. Desse valor, R$ 767.027,48 foi de indenização referente as férias, R$ 100 mil do abatimento da PAE, R$ 13 mil do valor mensal da PAE e R$ 2.873,32 de 13º salário.
De acordo com o TJAM, todos os valores pagos aos magistrados atendem a legislação brasileira. “Cabe, ainda, mencionar que todos os pagamentos realizados pelo Tribunal de Justiça do Amazonas estão lastreados na Constituição da República, nas leis infraconstitucionais e seguindo as recomendações do CNJ”, informou a instituição.
Afastamento de Salgado
Encarnação Salgado atuava como juíza da 1ª Vara Criminal da Comarca de Manaus quando foi escolhida, por aclamação, para ocupar a vaga deixada por João Bezerra de Souza, em eleição realizada no dia 19 de fevereiro de 2009. O ato que promoveu Encarnação ao cargo de desembargadora foi publicado no dia 6 de março daquele ano.
Como desembargadora, a magistrada trabalhou até junho de 2016, quando foi afastada pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) em desdobramento da Operação La Muralla, do MPF (Ministério Público Federal) e Polícia Federal. A operação investigou um suposto esquema de venda de alvarás de soltura para presos envolvidos com o tráfico de drogas.
O afastamento de Salgado foi prorrogado diversas vezes até que, em 2018, no âmbito de outra investigação na qual a magistrada é suspeita de receber R$ 50 mil em troca de decisão favorável em um habeas corpus a favor de um rapaz que usou falso diploma de engenheiro civil, o colegiado a afastou até que a denúncia fosse apreciada – o que ainda não ocorreu.
Em junho de 2020, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) decidiu afastar Encarnação ao abrir uma investigação para averiguar denúncia feita pelo MPF de concessão irregular de liminares em favor de traficantes de drogas em diversos plantões. A decisão apenas reforçou o afastamento da magistrada, pois ela já estava longe das funções por decisão do STJ.
A denúncia referente à Operação La Muralla só foi oferecida pelo MPF no STJ em janeiro deste ano, cinco anos após a deflagração do desdobramento da operação. Além de Encarnação, outras 14 pessoas, incluindo advogados e um ex-servidor do TJAM, foram denunciados pela venda de decisões judiciais para traficantes de uma facção criminosa.
Leia mais: Desembargadora do TJAM e outras 14 pessoas são denunciadas por venda de decisões judiciais
No CNJ, em junho de 2021, a desembargadora foi condenada à pena de aposentadoria compulsória proporcional ao tempo de trabalho. O colegiado aprovou o relatório do conselheiro Mário Guerreiro, que concluiu que a consequência das decisões de Encarnação foi a soltura indiscriminada de presos perigosos.
A folha de pagamento do TJAM referente ao mês de dezembro pode ser consultada AQUI.