Da Redação, com informações da assessoria do MPF
BRASÍLIA – O MPF (Ministério Público Federal) apresentou ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) denúncia contra a desembargadora do TJAM (Tribunal de Justiça do Amazonas) Encarnação Salgado e outras 14 pessoas, incluindo advogados e um ex-servidor do TJAM, pela venda de decisões judiciais para traficantes da facção criminosa FDN (Família do Norte).
O esquema foi desbaratado na Operação La Muralla 2, deflagrada em 2015. O MPF pede a condenação da desembargadora e do ex-servidor pelo crime de corrupção passiva (CP, art. 317, §1º), e dos demais por corrupção ativa (CP, art. 333, parágrafo único), além da condenação dos envolvidos pelo crime de organização criminosa (artigo 2º, § 4º, inciso II e IV, da Lei nº 12.850/2013). A denúncia é assinada pela subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo.
A desembargadora Encarnação Salgado permanece afastada de suas funções desde o dia 15 de junho de 2016 e já havia sido denunciada pela PGR (Procuradoria-Geral da República) também por venda de decisão judicial, fato apurado na Ação Penal 896/DF no STJ.
De acordo com o MPF, o esquema de venda de decisões chefiado pela desembargadora era utilizado pela organização criminosa FDN quando seus membros eram presos. Concentrada em Manaus, a facção praticava tráfico internacional de drogas, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, entre outros crimes.
Conversas interceptadas, depoimentos e trocas de mensagem mostraram que os integrantes da FDN usavam o plantão judiciário para obter decisões favoráveis da desembargadora. Em parte dos casos, foi verificada a apresentação de atestados médicos falsos para justificar a conversão de prisão preventiva em domiciliar. Todas as operações eram intermediadas por advogados e pelo servidor do Tribunal, que trabalhava como auxiliar da desembargadora.
Ainda de acordo com o MPF, o esquema funcionava assim: um grupo de advogados procurava um médico para fornecer atestado falso para doenças como aids ou tuberculose para os membros da facção que estavam presos. Com base nesse atestado, o advogado ingressava com petição junto ao juiz de plantão.
A quadrilha esperava as datas certas para ajuizar as petições, de modo a garantir que o pedido fosse analisado por Encarnação. Cada decisão chegava a custar até R$ 200 mil, a depender da capacidade financeira do preso. Segundo depoimento de um dos envolvidos, o valor era dividido entre o advogado, o médico que forneceu o atestado falso e o magistrado que proferiu a decisão favorável.
Além dos presos faccionados, as investigações revelaram que a desembargadora Encarnação Salgado também concedia liberdade mediante pagamento de propina a outros presos que tivessem condições financeiras de pagar os valores solicitados.
De acordo com a denúncia, o grande número de liminares deferidas pela desembargadora Encarnação Salgado em habeas corpus para um pequeno número de advogados chamou a atenção dos membros da Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) responsáveis por correição realizada entre 2013 e 2014.
A investigação mostrou também que a conta-corrente da desembargadora registrava movimentação financeira incompatível com seu salário. De 2012 a 2015, ela recebeu depósitos em dinheiro no total de R$ 165 mil, dos quais R$ 108 mil vieram de depositantes não identificados e R$ 56 mil da própria titular, além de créditos autorizados não identificados no total de R$ 13 mil.
Na denúncia, além da condenação pelos crimes de corrupção passiva, corrupção ativa e organização criminosa, o MPF pede que a magistrada continue afastada do cargo e a condenação ao pagamento de indenização por danos morais coletivos solidariamente, no montante equivalente à soma dos valores atribuídos a cada decisão negociada, com atualização monetária. Também requer a decretação da perda da função pública para os condenados que ocupem cargo público, nos termos do art. 92 do Código Penal.