Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – A subprocuradora-geral da República Ana Borges Coêlho Santos opinou favorável ao recurso do MP-AM (Ministério Público do Estado do Amazonas) no STJ (Superior Tribunal de Justiça) para obrigar o TJAM (Tribunal de Justiça do Amazonas) a receber a denúncia contra o prefeito de Coari, Adail Filho (PP), por calúnia contra o promotor de Justiça Weslei Machado.
A denúncia foi rejeitada e arquivada em fevereiro deste ano pelos desembargadores do TJAM. Eles alegaram que não há como afirmar que Adail Filho tinha plena certeza de que os episódios envolvendo o nome do promotor de Justiça seriam inverídicos.
Em parecer enviado ao STJ na segunda-feira, 27, Santos afirmou que para recebimento de denúncia é necessário que o fato narrado “se revele típico, haja indícios de autoria e elementos mínimos de materialidade”. No caso da denúncia contra Adail Filho, a subprocuradora-geral disse que o TJAM “adentrou no mérito da ação penal, julgando-a liminarmente improcedente, subtraindo o curso regular da ação penal”.
Para Santos, ao arquivar a denúncia, o TJAM cerceou o direito à produção de provas. Segundo ela, quando se trata do recebimento da denúncia, o “juízo se fixa na presença de justa causa para a ação penal, a demandar a análise dos elementos mínimos de materialidade em relação ao dolo do recorrido, o que se evidencia presente na denúncia, sem necessidade de qualquer revolvimento de provas”.
O MP-AM aguarda a decisão do ministro do STJ Sebastião Reis Júnior, que é o relator do processo.
A subprocuradora-geral da República destacou trecho da denúncia do MP-AM que envolve suposta tentativa de intimidação de Machado por um grupo ligado ao prefeito através da divulgação de trechos descontextualizados de conversas entre o promotor e o estagiário do TCE (Tribunal de Contas do Amazonas) Raione Queiroz, que teve o celular roubado.
No trecho destacado por Santos, a procuradora-geral de Justiça do Amazonas, Leda Mara Albuquerque, autora da ação penal contra o prefeito, afirma que naquela mesma semana o advogado Raphael Martins Borges disse a Machado que Joabe Rocha havia revelado ter armado um roubo a Raione para ter acesso ao aparelho celular do estagiário do TCE.
De acordo com Machado, o grupo acreditava existir algum tipo de conversa ilegal ou criminosa entre ele e Raione Queiroz. Para o promotor de Justiça, a situação de roubo com arma de fogo foi “tramada com a finalidade de tirar a credibilidade de minha atuação e integrava o plano para tentar o meu afastamento da 1ª Promotoria de Justiça de Coari”, disse Machado.
Machado afirmou que a divulgação dos trechos descontextualizados tinha objetivo de criar histórias em blogs e páginas no Facebook para que eles apresentassem representações na corregedoria do MP-AM e na Procuradoria-Geral de Justiça e evitar a permanência dele na promotoria de justiça de Coari.
Arquivado
A denúncia contra Adail Filho foi rejeitada e arquivada no dia 11 de fevereiro deste ano. O relator do processo, desembargador José Hamilton dos Santos, entendeu que o MP não provou que Adail sabia da inocência de Machado.
“O Parquet não logrou êxito em demonstrar a presença do dolo direto exigido no tipo penal, ou seja, a certeza da inocência do acusado ao qual foi imputado o crime de corrupção passiva”, afirmou Santos. Os demais desembargadores seguiram o voto do relator.
“Não restou provada a prévia ciência do, ora, Investigado [Adail], acerca da eventual inverdade de suas imputações ao Representante do Ministério Público [Weslei], assim, a tipicidade deve ser afastada, pelo simples estado de dúvida”, sustentou José Hamilton dos Santos.
Calúnia
A “guerra judicial” envolvendo integrantes do MP, o prefeito Adail Filho e até o juiz da Comarca de Coari Fábio Alfaia, começou em 2018, quando Machado ajuizou a maior parte das ações de improbidade administrativa contra o prefeito de Coari.
Naquele ano, Adail acusou Machado de persegui-lo politicamente e de fazer parte de esquema voltado para cassar o mandato dele. O prefeito disse que o promotor havia pedido propina de R$ 500 mil para deixar de apresentar denúncias de improbidade administrativa contra ele.
Em julho de 2018, o juiz Fábio Alfaia declarou o promotor suspeito para atuar em processo contra Adail. O magistrado alegou “situação de inimizade pública e concreta” entre o promotor e o prefeito e afirmou que a atuação de Machado era “retórica e pobre de juridicidade”
As acusações de Adail resultaram na abertura de investigação contra o promotor, mas o procedimento foi arquivado em outubro de 2018 por falta de provas. No mês seguinte, Machado pediu a suspeição de Alfaia para julgar processos de Adail alegando “total parcialidade”.
Weslei Machado, inclusive, citou informações de vereadores de que Alfaia receberia “mensalinho” de R$ 80 mil da família Pinheiro. O juiz e o prefeito negaram as acusações.
Após o arquivamento da investigação, Machado ajuizou representação contra o prefeito por denunciação caluniosa, sustentando que Adail havia noticiado fato inexistente e “tinha a plena ciência de que o fato narrado na petição de pedido de instauração” não tinha seu envolvimento.
A representação de Machado baseou a ação penal ajuizada pela procuradora-geral de Justiça, Leda Mara Albuquerque, em julho de 2019, contra Adail Filho.
À época, os advogados de Adail afirmaram que o prefeito havia sido surpreendido com notícia da denúncia, uma vez que ele havia “utilizado seu direito constitucional” de representar contra o promotor. O prefeito reforçou as acusações de “conluio para sacá-lo do cargo de alcaide”.
Em agosto de 2019, o MP enviou cinco promotores a Coari para dar celeridade aos processos investigatórios. À época, Leda Mara afirmou que aquela comarca era “extremamente complicada do ponto de vista da improbidade administrativa e do ponto de vista criminal”.
A chamada “força-tarefa” antecedeu a deflagração da Operação Patrinus, que prendeu Adail Filho em setembro passado. A operação apontava esquema de fraudes em licitações, lavagem de dinheiro e corrupção que desviou R$ 100 milhões da Prefeitura de Coari.
Além do prefeito, foram alvos de mandados de busca e apreensão e prisão temporária o presidente da Câmara de Coari, vereador Keiton Batista, o sargento da Polícia Militar Fernando Lima e o empresário Alexsuel Rodrigues, proprietário da rede de supermercados Rodrigues.
Na ocasião, Leda Mara afirmou que o MP tinha um quadro com excelentes promotores, mas queria ter 100 com o perfil de Weslei Machado. “Porque ele é promotor de Justiça na essência. Ele investiga, ele apura, é isso que se presta o Ministério Público”, afirmou.
Adail Filho e Keiton Batista foram soltos no início de outubro após decisões do ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Rogério Schietti Cruz.
O prefeito de Coari responde a ação penal oriunda da Operação Patrinus, que tramita em sigilo no TJAM.