Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – Em despacho assinado no sábado (3), o desembargador Néviton Guedes, do TRF1 (Tribunal Regional Federal da 1 ª Região), em Brasília, deu dez dias para que o colega Ney Bello seja ouvido, com urgência, sobre o pedido de suspeição contra ele apontado pelo MPF (Ministério Público Federal) no âmbito da Operação Maus Caminhos.
“Não se ouviu o eminente desembargador Federal Ney Bello, na forma do art. 328 do RITRF1. Tudo considerado, chamando o feito à ordem, determino, com urgência, a imediata oitiva do eminente Desembargador Federal Ney Bello, na forma do art. 328 do RITRF1, no prazo de 10 (dez) dias”, diz trecho do despacho.
A suspeição (imparcialidade) de Bello foi levantada pelas procuradoras da República Caroline da Mata e Luciana Martins em ação ajuizada no último dia 4 de junho no TRF1. Na ação, as procuradoras pedem a anulação da decisão que declarou a Justiça federal incompetente para julgar as ações penais da ‘Maus Caminhos’.
De acordo com o MPF, antes de votar no julgamento que mandou as denúncias da operação para a justiça estadual, Bello havia se declarado suspeito para atuar em outro processo relacionado a operação que tinha o mesmo ‘paciente’, os mesmos advogados, o mesmo juízo e a mesma ação penal.
Na ocasião, o desembargador citou o Artigo 145 do Código de Processo Civil, que traz o seguinte teor: “Há suspeição do juiz: IV – interessado no julgamento do processo em favor de qualquer das partes. § 1º Poderá o juiz declarar-se suspeito por motivo de foro íntimo, sem necessidade de declarar suas razões”.
Para as procuradoras, não há motivos para que Bello declare a suspeição dele em um processo e em outro, com as mesmas características, peça vistas e profira “voto decisivo capaz de influenciar na declaração de incompetência da Justiça Federal” para analisar os processos da ‘Maus Caminhos’.
Caroline Mata e Luciana Martins também afirmam que Bello não poderia participar do julgamento desse habeas corpus porque é parente de 3º grau do advogado Ravik Bello Ribeiro, que representou Mouhamad Moustafá, um dos implicados na ‘Maus Caminhos’. Segundo elas, o voto de Bello beneficiou o cliente do parente dele.
No despacho assinado por Néviton Guedes no sábado (3), consta que Bello não reconheceu sua imparcialidade, mas o MPF apresentou a seguinte conclusão: “Isto posto, requer o Ministério Público Federal seja julgado procedente o pedido de suspeição e/ou impedimento do Nobre Desembargador Ney Bello”.
A urgência na manifestação de Bello se dá por um erro processual. Isso porque, segundo Guedes, em vez de ouvir Bello, a secretaria do gabinete dele encaminhou os autos diretamente ao MPF para manifestação. Segundo ele, o desembargador acusado de suspeição deveria ser ouvido antes do parecer do órgão ministerial.
Em dezembro de 2020, Bello foi o autor do voto-vista acolhido pela Terceira Turma do TRF1 que declarou a Justiça Federal incompetente para analisar a denúncia contra o ex-governador José Melo, a ex-primeira-dama do estado Edilene Gomes e ex-secretários estaduais.
A decisão foi tomada sob argumento de que o dinheiro desviado trata-se de repasses “fundo a fundo”, ou seja, são regulares ou automáticos. “Uma vez depositados nos fundos estaduais e municipais são incorporados ao patrimônio do respectivo ente federativo”, alegou Bello.
O julgamento desse habeas corpus começou em dezembro de 2019 quando a relatora, Mônica Sifuentes, votou pela manutenção das denúncias na esfera federal. Na ocasião, Bello pediu tempo para analisar o caso e um ano depois apresentou o voto divergente, que foi acolhido por Maria do Carmo Cardoso.
Em março deste ano, após a decisão do TRF, a juíza Ana Paula Serizawa, da 4ª Vara Federal do Amazonas, enviou a ação penal para a Justiça estadual. Na Comarca de Manaus, o processo caiu na 4ª Vara Criminal, foi remetido para a 5ª Vara Criminal e, depois, para a 8ª Vara Criminal.
Atualmente, na esfera estadual, o processo também é alvo de conflito de competência. O MP-AM (Ministério Público do Amazonas) alega que a ação penal deve ser analisada pela 8ª Vara Criminal, mas a defesa do ex-secretário de Saúde Wilson Alecrim sustenta que o processo deve ficar na 5ª Vara Criminal.
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