Foi publicada na semana passada uma foto que descreve e ilustra com excelência alguns dos sintomas do perfil caótico e dramático vivido da política brasileira.
A foto foi tirada de dentro do que parece ser um salão de eventos do Congresso Nacional, onde aparecem várias pessoas bem vestidas, e bem servidas por espumantes, obviamente, de primeira linha. Enquanto isso, ao fundo, manifestantes protestam contra a PEC 55, e outras barbaridades, duramente reprimidos pelas forças policiais.
Diante de um dia trágico pra o mundo, pelo acidente na Colômbia, os congressistas aproveitaram a comoção nacional para assim votar tudo aquilo que representa os interesses mais mesquinhos.
Essa PEC, por mais que ainda alimente divergências de opiniões, é, sem dúvida, uma negação brutal da constituição de1988 – ao negar direitos fundamentais como saúde e educação (como se representassem grande parte do orçamento ou comprometessem a saúde fiscal do país) em nome da perpetuação de gastos descabidos e obscuros de sempre. E faz-se isso sem o mínimo de democracia, ou seja, não houve audiência muito menos convocação de um debate público – nem para que fosse dado uma aparente impressão de representatividade.
Ninguém está contente – e nem o poderia. Esquerda, direita e centro, concordam ao menos com um fato: o Brasil que conhecemos não tem mais controle, juízo ou governo. Em cena, uma série de forças contraditórias que não representam qualquerperspectiva futura, não representam um projeto sólido e emancipador de nação, não representam nada além dos seus velhos e carcomidos interesses.
Por uma manobra oportunístico de Temer, uma das piores medidas – além da PEC – teria sido aprovada nesta semana: o presidente disse que vetaria, mediante um acordo com Maia e Renan – este virou réu na Suprema Corte – a anistia para o crime de caixa dois. Buscou assim, aumentar sua pífia popularidade. No final, as medidas contra a corrupção foram deturpadas e votadas no desespero da classe política com as delações a caminho.
O que se revela com tudo isso é, até certo ponto, a velha tese de Maquiavel que o objetivo da política é tomar, se manter e doravante aumentar o poder. Todos esses acontecimentos formam uma ambiente caótico onde o que está por vir não, é totalmente inesperado, por que é seguramente muito sujo… Fazendo com que seja prudente temer nossa aproximação do abismo.
Se aproxima então, dessa forma, a eventualidade de um estado de exceção. A bruta cisão democrática não se deu somente no golpe sofrido por Dilma – não começou nem terminou lá. O desmonte de nosso tímido estado de bem estar social – pautado num keynesianismo mal lido – se faz sem o menor consenso popular ou intelectual. Se quebram ou modificam leis para que se adote uma vestimenta de legalidade. Acompanhado de uma espetaculização do discurso anti corrupção, não podemos fechar os olhos para sorrateiros abusos jurídicos.
A crise é tão grande que espalhou melancolia e descrença: o governo não governa, os parlamentares legislam em causa própria, sem respeito ou atenção às escolhas do povo, isto é: o povo não escolhe. Provando que as instituições de países da periferia funcionam até certo ponto, pois é curto o cobertor de sua consistência e aderência jurídica, a tendência é instalar-se a exceção. Porém, como já previa Walter Benjamim: a exceção tende perigosamente a se transformar na regra. Resta-nos permanecer alertas!
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