Por Iolanda Ventura, do ATUAL
MANAUS – Para evitar tragédias como a que ocorreu com o deslizamento de terra que deixou oito mortos no bairro Jorge Teixeira, zona leste de Manaus, no último domingo (12), é preciso um programa de estado, e não apenas de governo, para remover famílias de áreas de risco. É o que defende Antônio Fábio Vieira, professor de Geografia na Ufam (Universidade Federal do Amazonas).
Antônio Vieira é autor da tese “Desenvolvimento e Distribuição de Voçorocas em Manaus (AM): Principais Fatores Controladores e Impactos Urbano-Ambientais“, defendida na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).
O professor considera que uma iniciativa permanente é a melhor opção, pois o problema não será resolvido em uma única gestão.
“Assim, penso que deva ocorrer gradativamente a diminuição de áreas de risco com um programa contínuo de remoção da população residente nestas áreas, a serem alojadas em outras áreas não susceptíveis a voçorocamentos, movimentos de massa ou inundações”, diz.
Voçorocas, explica Antônio Vieira, são feições erosivas resultantes do processo de erosão dos solos. Há o desgaste ou desagregação do solo ou rocha de forma contínua e lenta, e o produto desagregado pela água ou vento é transportado para locais distantes ou próximos da zona de ocorrência. No caso da Comunidade Nova Floresta, no Jorge Teixeira, a área não é uma voçoroca.
O que houve foi um movimento de massa, que ao contrário do processo de erosão dos solos, é rápido. Pode ser de vários tipos: deslizamentos ou escorregamentos, corridas de lama, tombamento, desmoronamentos, etc. Os principais agentes causadores do fenômeno são a gravidade e a água das chuvas.
“O que ocorreu nesse caso foi um misto de deslizamento e corrida de lama, onde a massa de solo se deslocou de forma contínua e rápida. Portanto, os deslizamentos não podem ser chamados de voçorocas, mas estes ocorrem com frequência na paredes dessas incisões. Ao que consta, na área da ocorrência não era uma voçoroca”, esclarece.
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O especialista pontua que, na natureza, existem áreas que podem ser identificadas como sendo suscetíveis a ocorrência de voçorocamentos e movimentos de massa. Incluem-se nesse grupo encostas com forte declividade, como na Comunidade Nova Floresta.
“Assim, essas encostas não deveriam ser ocupadas em hipótese alguma. Ao permitir a ocupação, estas tornam-se áreas de risco, juntamente com o fundo de vale, também ocupado”, alerta.
As casas destruídas no Jorge Teixeira ficavam em uma área desmatada, em uma depressão cercada por barrancos. O acesso ao local é difícil. Não há ruas asfaltadas, apenas uma escada e estrada de barro improvisadas, feitas pelos moradores que construíram barracos no centro do buraco. Segundo os bombeiros que atenderam a ocorrência, o solo na área é arenoso e instável.
O pesquisador Reinaldo Corrêa Costa, organizador do estudo “Riscos, Fragilidades e Problemas Ambientais Urbanos em Manaus”, publicado pelo Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), corrobora o pensamento. Costa também coordenou publicação de inventário preliminar sobre Áreas de Risco em Manaus.
Para ele, os poderes públicos podem e devem agir, dentro da lógica de política habitacional. “A maior parte da funcionalidade existente nas áreas de risco são de domicílios, são lares, são as residências das pessoas, por isso faz parte do direito à moradia digna. É um processo ligado a pobreza e tem conexão com o valor do solo urbano”, diz.
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Como alternativa para evitar que mais casas sejam feitas em locais de risco, Costa afirma que é preciso monitoramento constante, como um núcleo comunitário de defesa civil e nos lugares de topografia com declives que tenha vegetação protetora.
O pesquisador também sugere identificar os locais mais perigosos e alertar para os perigos de construir moradias nesses lugares. “É um processo de conscientização”, pontua.
Apesar do deslizamento ser um fenômeno extremamente rápido, o pesquisador informa que muitas vezes os movimentos de massa indicam fragilidades que alertam para o risco iminente, como: rachaduras no solo, árvores inclinadas, embarrigamento de muro de alvenaria, construções de madeiras que ficam tortas, portas que não fecham corretamente, etc.
“A questão é que muitas vezes o solo é coberto por vegetação rasteira, que não protege, mas esconde rachaduras. Além disso, geralmente há materiais úrbicos (detritos urbanos como
restos de material de construção) e gárbico (lixo de atividades humanas), ambos dificultam a visualização de alguns sinais”, explica.