Faz parte do arsenal da ideologia dominante o uso de meias verdades a fim de culpabilizar sempre um alvo, ao menos, pelos problemas oriundos do próprio sistema que ela sustenta. Afinal, este é o grande propósito da ideologia: injetar a falsa consciência de forma a perpetuar a estruturação injusta do modo de produção em vigor.
Exemplos para elucidar esta inferência não faltam: o problema da violência é consequências da estrutura econômica global, ou dos nordestinos, negros e pobres sem qualificação. As crises recorrentes do capitalismo são inerentes a ele, ou simples erros administrativos dos governantes? A corrupção é sistemática, ou deve ser atribuída a um determinado partido político ?
Enfim, a estratégia é repetir mil vezes uma insinuação até que vire verdade, no formato da história sob encomenda de emissão de opiniões de jornalistas comprometidos. Importa assegurar no imaginário das multidões a impressão debate que esta configuração capitalista deu certo, não só para alguns, mas para todos. E que as adversidades são responsabilidades de individualidades isoladas, que atrasam o progresso rumo ao paraíso terrestre do consumo e bem estar.
O filme de terror da política brasileira parece não ter fim. Ademais, na medida que avança no tempo, ganha trajes mais sinistros. Não obstante o assalto ao poder político com o impeachment, a concretização do golpe deixou aberto espaço para medidas de mais retrocessos e desastres.
O infortúnio da vez atende pela sigla PEC 241, uma medida agressiva de emenda constitucional que divide opiniões. Parte significativa dos intelectuais se opõe veementemente à medida, enquanto, parte quase que total da mídia corporativa faz campanha descarada pela legitimação popular, mesmo após a esperada aprovação da proposta, numa das partes do grande balcão de negócios das elites, no caso, a Câmara dos Deputados.
É de plural concordância que o momento demanda um urgente remanejamento dos gastos públicos. O Estado brasileiro não é só gastão, é também persistentemente incompetente para cumprir os fins que justificam sua própria existência. Além de abrigar e coexistir com níveis de corrupções sistemáticas – algumas denunciadas, outras aceitadas com naturalidade, trata-se de um estado desqualificado.
Desta forma, avança no Congresso o entreguismo desesperador que boicota o projeto de nação. Com a privatização do pré-Sal – para o centro do império, num cover tardio de Fernando Henrique Cardoso – que se destinaria quase, que integralmente, para a educação, tem-se agora, também, o colocar de um limite de gastos sob questões fundamentais e básicas para o desenvolvimento mínimo de um povo: educação e saúde.
Como disse o historiador Leandro Karnal “Acho que salvar a economia é muito importante, mas temos que salvar com os passageiros, e não somente o barco”
Em outras palavras, não é um simples sacrifício. Uma operação que faz doer para que assim se estanque a sangria. É muito pior do que isso.
Torna-se dramática e concisa a citação de Karnal pois o funcionamento da proposta consiste em sacrificar o pouco de futuro que é dado para os que menos possuem, enquanto os Bancos Privados batem records de arrecadação e de aquisição dos títulos da dívida pública, por manobras perpetuadas pelos últimos governos.
Haveria, a priori, duas formas de fazer a economia respirar. Basicamente, aumentar a arrecadação, ou cortar/ congelar gastos. Porém a decisão desse dilema não se deu, nem por um segundo, com uma hesitação, demonstrando a relação simbiótica e promíscua entre burguesia e classe política.
Uma das formas mais diretas de se aumentar a arrecadação é efetuar um aumento da carga tributária. Contudo, num país onde a parte maior da carga tributária se dá na forma de taxação de bens de consumo, quem paga, proporcionalmente mais imposto, é o trabalhador assalariado. Enquanto os bilionários burgueses, banqueiros, e homens do agronegócio pagam taxas ínfimas diante de seus lucros colossais.
Mesmo assim, se negam a reduzir um pouco de sua “mamata open bar”. Reduzirão direitos básicos do povo em nome da manutenção religiosa do pagamento da dívida pública. Diariamente, para responder a questão ideológica das verdades fabricadas, quem paga o pato da FIESP é o povo.
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