Ainda não foi provado por A mais Z que as escolas públicas brasileiras são dominadas por demônios comunistas que têm nas salas de aula um campo fértil de mentes infanto-juvenis prontas para serem doutrinadas em sua ingenuidade política. Para um tal movimento ‘Escola Sem Partido’ essa conspiração de professores é real e ameaça a sociedade brasileira com a formação de exércitos armados com foices e martelos que vão deflagrar a revolução do proletariado liderados por uma horda de gays dispostos a extinguir as famílias tradicionais.
Essa lição que a nova Moral e Cívica tenta ‘ensinar’ à opinião pública é falsa, leviana, mal-intencionada e inconstitucional. Para os defensores dessa nova ordem social, na Matemática os alunos não aprendem as operações com a exatidão dos números, como por exemplo que 1 + 3 = 4, mas sim que o resultado final da soma é 13.
Em História, os professores estariam instruindo seus ‘guerrilheiros’ mirins que o socialismo é a salvação da Pátria Amada que deve permanecer gentil ao grande e único líder. Na Geografia, os conspiradores do magistério estariam orientando que o Brasil pertence ao continente sul-bolivariano. E na Língua Portuguesa, na frase ‘a corrupção é endêmica no Brasil’ o sujeito é o PT e o predicado é Lula.
Esse delírio oligofrênico típico de momentos políticos instáveis tem servido a três propósitos: criar um inimigo público número 1, no caso os professores, eleitos para serem vilanizados como se fossem membros de facções criminosas que precisam ser vigiados e denunciados; moldar um Estado com forte influência de dogmas religiosos – que se dane a laicidade – e se apropriar da lei para impor à força valores morais duvidosos.
O que está em curso é a tentativa de instalar uma utopia centrada na luta do bem contra o mal – quem é quem nessa história –, da direita contra a esquerda e do fascismo contra o comunismo em que a democracia é a peça de manobra para que grupos conservadores confisquem a lei para conferir a si mesmo o poder de decidir quem o cidadão deve ser. Não seremos mais donos do próprio destino, mas sim o governo, o big brother onipresente. A leitura de Karl Max e Friedrich Nietzsche será proibida.
Nessa cruzada em defesa dos ‘bons costumes’ e da educação livre de amarras políticas, os partidários da ‘Escola Sem Partido’ demonstram terem faltado às aulas de História. Deveriam saber o quanto é violento e inútil usar a força em questões de moralidade e religião.
Tão subjuntivo quanto o termo é sua implicação prática. Uma escola sem partido pressupõe uma educação apolítica. Como adotar essa neutralidade em aulas de História e Geografia? Política econômica será um termo herege em sala de aula ou uma exceção quando se referir ao grupo político no poder? Se a missão dos alunos será vigiar os professores para que não saiam da nova linha ideológica, ir à escola será uma função policial e não de formação sociocultural.
É cedo para afirmar que nesse quadro negro não haverá ideias iluministas. Mas é preocupante constatar que a prova elaborada pelos legisladores para avaliar a juventude, de fato, não tende a ser baseada no conhecimento amplo e diversificado sobre a humanidade e na livre manifestação do pensamento.
O que os apologistas da ‘Escola Sem Partido’ ainda não explicaram é como crianças e adolescentes, que ainda não têm uma formação sociocultural podem adotar uma ideologia partidária. E pelo princípio da denominação, supõem que a escola é a única fonte de conhecimento possível desprezando a família, as manifestações culturais e as relações sociais de forma geral. Não se ouviu uma palavra até agora de um poder público sem corrupção.
Esses arautos da escola sem partido demonstram pouco apreço aos livros. Devem odiar obras como Dom Quixote, 1984, A Condição Humana, As Origens do Totalitarismo, Política, A República, A Revolução dos Bichos, entre tantas obras obrigatórias para o entendimento dos direitos civis e da liberdade humana.
A sugestão é que voltem ao banco da escola para serem novamente alfabetizados. Não para aprender consoantes e vogais, mas para saber como não transformar escola em peça de jogo político, professor em bandido e sim em fonte de amplo conhecimento e liberdade. A propósito: o personagem central de ‘A Revolução dos Bichos’ que toma o poder para acabar com a opressão e implanta um novo regime autoritário contra sua própria espécie se chama Major.
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