A eleição à sucessão presidencial que se encerra neste domingo, 28, em segundo turno, é um marco da jovem democracia brasileira. Não pela polarização radical da campanha eleitoral como nunca vista antes neste País, mas pelo que virá depois.
Há, um de um lado, um sentimento de que das cinzas da corrupção e do apocalipse petista surgirá um novo Brasil, bíblico, militarmente disciplinado, abençoado por Deus e conduzido por um messias, ou melhor, um mito que resgatará a honra das famílias tradicionais, ressuscitará o País das covas da violência combatendo fogo com fogo e moldará uma nação feliz na qual só é possível dois únicos gêneros na união social e todos devem obedecer às ordens do líder onisciente para alcançar a terra prometida. Quem pensar diferente desse modelo utópico poderá escolher entre ser banido ou fuzilado em praça pública. Não há, portanto, a opção pelo contraditório. A nova ordem é a lavagem étnica e a eugenia. Que fique claro que esse é um discurso de campanha, devidamente trabalhado para satisfazer as massas desesperançadas e aprisionadas em sua própria inconformidade.
De outro, a pregação da velha ladainha de que só o socialismo é capaz de reduzir desigualdades sociais, gerar oportunidades de prosperidade para os pobres – de preferência com muitos programas de distribuição de renda pagas pelo próprio contribuinte beneficiado –, garantir direitos constitucionais e, claro, humanos, permitir a liberdade religiosa, de gêneros, e assegurar um governo justo e da maioria, defendido pelo oráculo do petismo, aquele que está preso por ter traído os princípios éticos e se igualar aos 300 picaretas infiltrados no parlamento democrático que tanto combatia.
As promessas de um novo Brasil apresentadas ao eleitor são fundamentadas em velhas práticas, todas fracassadas. Esse futuro de arrebatamento público é resultado da delinquência política que se instalou no País esculpida em uma simbiose corrupta entre as instituições e o interesse privado numa espécie de Sodoma e Gomorra tropical em que a elite desfruta das benesses geradas pelas mazelas públicas criadas justamente para manter o status quo devidamente do jeito que está. As opções apresentadas nas urnas neste domingo foram gestadas nesse ambiente político no qual foram omissas e coniventes.
O cidadão foi o único a pagar o preço pela sangria da coisa pública em anos de assalto ao Estado. Preços de combustíveis e energia elétrica nas alturas são efeitos do uso eleitoral de serviços básicos em detrimento do bem-estar social e econômico. Impostos a perder de vista são consequências da incompetência administrativa e má fé dos gestores públicos para proporcionar serviços baratos e eficientes. Justiça quase inacessível é sequela de um Judiciário cada vez mais caro, enclausurado em privilégios, injusto e com entendimento muito pessoal da lei. Falta de oportunidades é decorrência da relação espúria entre público e privado na qual o primeiro é sempre sugado para satisfazer o segundo. Violência em ambiente de guerra é a face cruel da inépcia pública em se sobrepor ao crime.
Não é nenhuma surpresa, portanto, o domínio das fake news na cruzada eleitoral, de ambos os lados. A mentira é uma ‘virtude’ política e funciona como arma de dominação sobre seres humanos ignorantes que conduzem suas vidas a partir de uma falsa percepção da realidade porque são incapazes de exercer o senso crítico.
São prisioneiros em suas cavernas sociais enxergando apenas sombras manipuladas na parede que julgam ser a realidade. Como na parábola de Platão, os candidatos se apresentam como fugitivos da caverna, descobriram um mundo novo e prometem compartilhá-lo com a maioria ainda presa as suas ideias pré-estabelecidas.
O povo está dividido entre duas versões de Brasil que lhes são apresentadas como verdadeiras. Mas há uma inversão nessa história. Ninguém acreditou no fugitivo, considerou-o louco e o matou para evitar a disseminação de ideias revolucionárias que ameaçavam o senso comum na caverna. Estavam felizes com as sombras na parede.
Qualquer que seja a escolha, há um preço a pagar. O brasileiro está farto de delinquentes políticos e disposto a abraçar um novo Brasil, espera-se mais igual, de paz e justo. A decisão é se farão isso permanecendo alheios ao senso crítico e aceitando as ideias e conceitos que são impostos por um grupo dominante, ou exercerão o pensamento racional libertando-se das correntes que o impedem de questionar ‘realidades’ pré-definidas.
Deixo o leitor que chegou até aqui com um questionamento: seu novo Brasil está dentro ou fora da caverna?
Cleber Oliveira é jornalista, graduado pela Faculdade de Comunicação e Turismo Hélio Alonso (RJ). Foi repórter e editor na Rádio Federal (RJ), jornal A Notícia (Manaus), Folha Popular (Manaus), e repórter, editor e editor-executivo da TV Cultura Amazonas (Funtec) e dos jornais Amazonas em Tempo e Diário do Amazonas, ambos em Manaus. Também foi articulista no Diário do Amazonas e atualmente é editor no site AMAZONAS ATUAL.
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