A ideia de que opiniões, declarações, mentiras, discursos, posicionamentos e achismo valem mais do que fatos tem sido lugar comum no Brasil nesses tempos de obscurantismo conservador. Os falsos argumentos têm pressionado o princípio básico dos fatos.
Curioso: nenhuma doutrina conservadora vingou até agora. Se são realmente boas como os doutrinados apregoam, por que ainda não tomaram as ruas em defesa de suas convicções? Ou das convicções que lhes são impostas?
Coincidentemente, a adesão a essa nova ideologia da irresponsabilidade pública não resultou em melhores condições de vida aos cidadãos. Mas tem servido para destruir políticas públicas de resultados invejáveis como as campanhas de vacinação. Da noite para o dia, vacina no Brasil deixa de ser uma coisa boa para ser ruim. E vão para o lixo décadas de sucesso em imunizações que livraram a população brasileira de doenças terríveis, já erradicadas no país.
Ganha corpo, nos cemitérios, o delírio de que fôlego de atleta, qualquer remédio no estômago, e arma na mão salvam mais que vacina. Com covas aos milhares nas necrópoles, os fatos insistem em se contrapor aos falsos argumentos.
Não há garantias de que a indústria farmacêutica tem estoque para abastecer o Brasil com cloroquina e invermectina aos milhões. Aderir a essa tese geraria uma corrida maluca às drogarias, mais pânico e pessoas se matando – que irônico – por uma caixinha de comprimidos.
A pandemia negacionista se espalha como vírus sobre a ciência buscando aniquilar o conhecimento. O saber tem sido desafiado pela teoria do “é assim porque eu estou dizendo”. Não é preciso provar mais nada, com algumas exceções dependendo do oportunismo político de ocasião.
Mas, quem diria, é contraditória a suas próprias ilusões. Ao mesmo tempo em que prega uma fé sagrada na retórica é descrente dos resultados que pretendem sejam alcançados. Tanto faz espirituais como materiais. O que foi dito em um momento, é negado em outro.
A própria esquerda peca em se catequizar no fundamento político de que o Estado é o único provedor da sociedade. Tem caído de joelhos perante os próprios fieis que já não comungam dessa premissa fracassada. Nem vou entrar no mérito do capitalismo de estado chinês, que é outra história.
Na narrativa do contágio conservador, fechar comércio e paralisar serviços é sentença de morte à economia. É meia verdade. O baque é grande, mas governos sem gastos supérfluos e comprometidos com a causa pública têm reservas econômicas para enfrentar crises e amenizar perdas. O auxílio emergencial é mais um fato a derrubar o falso argumento.
Verdadeiro mesmo é que a produção global já não tem a única finalidade de prover os seres humanos de produtos necessários à vida e gerar capital para reinvestimento na fabricação de bens de consumo, mas de alimentar a indústria financeira global em que a especulação da moeda domina os mercados. É o novo capitalismo, que se ampara na movimentação do dinheiro, gerado pela produção, para apostar nos títulos e fundos mais lucrativos.
Na fábula conservadora, vidas humanas são negociáveis, desde que não interfiram no projeto de poder. Se interferirem, são descartáveis. A história está aí para provar. Usar máscara e higienizar mãos com álcool em gel, por exemplo, é falsa receita médica, mesmo que os resultados eficazes de proteção sejam incontestáveis.
A negação da realidade é a fantasia ideológica do momento, mas a Covid-19 pôs o país em uma encruzilhada: decidir entre a fé cega e o livre arbítrio. Deus, segundo as escrituras, concedeu a opção de escolha: seguir insanidades de líderes políticos ou abrir os olhos, e a mente, aos fatos.
Faça sua escolha.
Cleber Oliveira é jornalista, graduado pela Faculdade de Comunicação e Turismo Hélio Alonso (RJ). Foi repórter e editor na Rádio Federal (RJ), jornal A Notícia (Manaus), Folha Popular (Manaus), e repórter, editor e editor-executivo da TV Cultura Amazonas (Funtec) e dos jornais Amazonas em Tempo e Diário do Amazonas, ambos em Manaus. Também foi articulista no Diário do Amazonas e atualmente é editor no site AMAZONAS ATUAL.
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