Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – O ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Sebastião Reis Júnior negou recurso do MP-AM (Ministério Público do Amazonas) e manteve decisão do TJAM (Tribunal de Justiça do Amazonas) que arquivou denúncia contra o prefeito de Coari, Adail Filho, por supostamente caluniar o promotor de Justiça Weslei Machado.
Na decisão, assinada na segunda-feira, 19, o ministro sustentou que a alteração do entendimento do colegiado do TJAM ensejaria o reexame das provas apresentadas pelo MP-AM, o que é inadmissível em recurso especial, segundo jurisprudência do STJ. Para Sebastião Júnior, as cortes estaduais são soberanas na análise das provas.
A denúncia contra o prefeito de Coari foi rejeitada e arquivada em fevereiro deste ano pelos desembargadores do TJAM. Eles alegaram que não há como afirmar que Adail Filho tinha plena certeza de que os episódios envolvendo o nome do promotor de Justiça seriam inverídicos.
“É possível notar que o, ora, denunciado, não lançou fatos, sem indicação de provas, demonstrando sua convicção na veracidade dos acontecimentos, portanto, o elemento subjetivo do tipo, descrito no art. 339 do Código Penal (denunciação caluniosa) não restou provado”, diz trecho da decisão.
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A decisão do ministro contrariou o parecer da subprocuradora-geral da República Ana Borges Coêlho Santos que foi favorável ao recurso do MP-AM sob alegação de que, para o recebimento de denúncia, é necessário que o fato narrado “se revele típico, haja indícios de autoria e elementos mínimos de materialidade”.
Para Santos, no caso da denúncia contra Adail Filho, o TJAM “adentrou no mérito da ação penal, julgando-a liminarmente improcedente, subtraindo o curso regular da ação penal”. A subprocuradora-geral da República também afirmou que, ao arquivar a denúncia, os desembargadores do Amazonas cercearam o direito à produção de provas.
Ainda de acordo com Santos, quando se trata do recebimento da denúncia, o “juízo se fixa na presença de justa causa para a ação penal, a demandar a análise dos elementos mínimos de materialidade em relação ao dolo do recorrido, o que se evidencia presente na denúncia, sem necessidade de qualquer revolvimento de provas”.
Arquivado
A denúncia contra Adail Filho foi rejeitada e arquivada no dia 11 de fevereiro deste ano. O relator do processo, desembargador José Hamilton dos Santos, entendeu que o MP não provou que Adail sabia da inocência de Machado.
“O Parquet não logrou êxito em demonstrar a presença do dolo direto exigido no tipo penal, ou seja, a certeza da inocência do acusado ao qual foi imputado o crime de corrupção passiva”, afirmou Santos. Os demais desembargadores seguiram o voto do relator.
“Não restou provada a prévia ciência do, ora, Investigado [Adail], acerca da eventual inverdade de suas imputações ao Representante do Ministério Público [Weslei], assim, a tipicidade deve ser afastada, pelo simples estado de dúvida”, sustentou José Hamilton dos Santos.
Calúnia
A “guerra judicial” envolvendo integrantes do MP, o prefeito Adail Filho e até o juiz da Comarca de Coari Fábio Alfaia, começou em 2018 quando Machado ajuizou a maior parte das ações de improbidade administrativa contra o prefeito de Coari.
Naquele ano, Adail acusou Machado de persegui-lo politicamente e de fazer parte de esquema voltado para cassar o mandato dele. O prefeito disse que o promotor havia pedido propina de R$ 500 mil para deixar de apresentar denúncias de improbidade administrativa contra ele.
Em julho de 2018, o juiz Fábio Alfaia declarou o promotor suspeito para atuar em processo contra Adail. O magistrado alegou “situação de inimizade pública e concreta” entre o promotor e o prefeito e afirmou que a atuação de Machado era “retórica e pobre de juridicidade”
As acusações de Adail resultaram na abertura de investigação contra o promotor, mas o procedimento foi arquivado em outubro de 2018 por falta de provas. No mês seguinte, Machado pediu a suspeição de Alfaia para julgar processos de Adail alegando “total parcialidade”.
Weslei Machado, inclusive, citou informações de vereadores de que Alfaia receberia “mensalinho” de R$ 80 mil da família Pinheiro. O juiz e o prefeito negaram as acusações.
Após o arquivamento da investigação, Machado ajuizou representação contra o prefeito por denunciação caluniosa, sustentando que Adail havia noticiado fato inexistente e “tinha a plena ciência de que o fato narrado na petição de pedido de instauração” não tinha seu envolvimento.
A representação de Machado baseou a ação penal ajuizada pela procuradora-geral de Justiça, Leda Mara Albuquerque, em julho de 2019, contra Adail Filho.
À época, os advogados de Adail afirmaram que o prefeito havia sido surpreendido com notícia da denúncia, uma vez que ele havia “utilizado seu direito constitucional” de representar contra o promotor. O prefeito reforçou as acusações de “conluio para sacá-lo do cargo de alcaide”.
Em agosto de 2019, o MP enviou cinco promotores a Coari para dar celeridade aos processos investigatórios. À época, Leda Mara afirmou que aquela comarca era “extremamente complicada do ponto de vista da improbidade administrativa e do ponto de vista criminal”.
A chamada “força-tarefa” antecedeu a deflagração da Operação Patrinus, que prendeu Adail Filho em setembro passado. A operação apontava esquema de fraudes em licitações, lavagem de dinheiro e corrupção que desviou R$ 100 milhões da Prefeitura de Coari.
Além do prefeito, foram alvos de mandados de busca e apreensão e prisão temporária o presidente da Câmara de Coari, vereador Keiton Batista, o sargento da Polícia Militar Fernando Lima e o empresário Alexsuel Rodrigues, proprietário da rede de supermercados Rodrigues.
Na ocasião, Leda Mara afirmou que o MP tinha um quadro com excelentes promotores, mas queria ter 100 com o perfil de Weslei Machado. “Porque ele é promotor de Justiça na essência. Ele investiga, ele apura, é isso que se presta o Ministério Público”, afirmou.
Adail Filho e Keiton Batista foram soltos no início de outubro após decisões do ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Rogério Schietti Cruz.
O prefeito de Coari responde a ação penal oriunda da Operação Patrinus, que tramita em sigilo no TJAM.
Leia a decisão na íntegra: