
Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – O procurador-geral da República, Augusto Aras, criou uma força-tarefa para atuar nas investigações sobre conflitos entre ribeirinhos, indígenas e policiais na região do Rio Abacaxis e da Terra Indígena Coatá Laranjal, nos municípios de Borba e Nova Olinda do Norte, ocorridos em agosto deste ano, no Amazonas. Os trabalhos da força-tarefa devem durar até outubro de 2021.
De acordo com a PR-AM (Procuradoria da República no Amazonas), o grupo vai investigar se houve violação a direitos fundamentais dos povos indígenas e comunidades tradicionais da região na operação deflagrada pela SSP-AM (Secretaria de Segurança Pública do Amazonas) supostamente para coibir o tráfico de drogas no local.
Aras designou oito procuradores regionais da República para atuarem junto a outros dois em 19 processos, incluindo inquéritos e representações, oriundos de denúncias sobre a operação que resultou na morte de dois policiais. A criação do grupo atendeu pedido das Câmaras Criminal e de Populações Indígenas e Comunidades do MPF feito em setembro deste ano.
A PR-AM afirma que, em apuração inicial, foram coletados relatos de graves abusos de direitos cometidos durante e após a incursão policial na área. Alertam também que fatos recentes indicam o risco iminente de morte de testemunhas-chaves de execuções e torturas no local, bem como de outras violações em andamento.
A procuradoria também cita que a Força Nacional atuou no local dos conflitos para reforçar a segurança e garantir que a Polícia Federal investigue as violações cometidas. “Diante da gravidade e urgência dos fatos, vislumbra-se como medida mais adequada e conveniente a criação da força-tarefa por prazo determinado”, afirmou a subprocuradora-geral da República Eliana Torelly.
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Entenda o caso
Nos dias 23 e 24 de julho, o secretário-executivo do Fundo de Promoção Social do Governo do Amazonas, Saulo Rezende, fazia pesca esportiva no Rio Abacaxis sem licença ambiental e, após desentendimento com os comunitários, foi ferido com um tiro no ombro. O MPF argumenta que o secretário-executivo usava uma embarcação particular. No dia do conflito, Saulo disse aos policiais que os suspeitos ameaçaram queimar a embarcação dele caso insistisse em seguir a viagem.
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No dia 3 de agosto, a SSP-AM enviou policias do COE (Comando de Operações Especiais) e do Batalhão Ambiental da Polícia Militar para realizar ação com a alegação de coibir o tráfico de drogas na região após o incidente. Segundo o MPF, os agentes não se identificaram mesmo após horas de atuação e abordagem inicial de lideranças extrativistas.
Ainda de acordo com a PR-AM, os policiais não usavam uniforme ou outra identificação e estavam em uma embarcação particular, a mesma que motivou, nos dias 23 e 24 de julho, conflito grave com os comunitários, por conta do uso do Rio Abacaxis para pesca esportiva sem licença ambiental, e culminou no conflito envolvendo Saulo Rezende.
Para o MPF, o uso de embarcação particular aliado à falta de identificação inicial causou pânico em todas as comunidades e aldeias. Os ribeirinhos pensaram se tratar de ato privado de vingança. Durante o conflito armado entre policiais e comunitários, o 3° sargento Manoel Wagner Silva Souza e o cabo Márcio Carlos de Souza foram assassinados.
No dia seguinte, a SSP enviou efetivo de 50 policiais, incluindo o comandante da Polícia Militar no Amazonas, coronel Airton Norte, para reforçar a ação no local. A partir daí, o MPF afirma que passou a receber relatos de diversos atos de abuso e violação de direitos por parte da Polícia Militar contra moradores tradicionais do Rio Abacaxis.
Entre os relatos estão a ocorrência de invasão das casas dos comunitários sem qualquer autorização ou mandado judicial, apreensão de telefones celulares usados para registrar os abusos, uso desproporcional de armas de fogo para intimidar os moradores, inclusive idosos e crianças, e a restrição de circulação no rio, impossibilitando o envio de alimentos e mantimentos e o socorro aos feridos pelas ações da Polícia Militar.
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De acordo com a SSP-AM, ataque a um cidadão foram iniciadas investigações e encontrados indícios dos crimes de tráfico de drogas e formação de milícia armada na região. A secretaria informou que há cinco anos, em atuação conjunta, as forças de segurança já haviam destruído uma plantação de maconha de aproximadamente três hectares nas proximidades.
A SSP-AM também afirmou que, no primeiro dia, os policiais realizaram o trabalho de forma velada, para identificar as possíveis ilegalidades. No fim da tarde, retornaram devidamente uniformizados e foram emboscados por membros do grupo criminoso. Outros dois policiais ficaram feridos.
Em setembro deste ano, a Polícia Civil do Amazonas indiciou 9 suspeitos de envolvimento no homicídio do 3º sargento Manoel Wagner Silva Souza e do cabo Márcio Carlos de Souza. A polícia diz que os policiais militares foram alvos de traficantes.