O novo aterro sanitário que está sendo implantado em Manaus vai gerar impactos ambientais e matar igarapés. Enquanto isso a Prefeitura de Manaus não implanta a política de resíduo sólido, onde “lixo” poderia ser transformado em renda e cidadania.
O aterro sanitário de Manaus, o antigo lixão, localizado no km 19, da estrada AM-010, na entrada da Avenifa das Flores (Av. Governador José Lindoso), próximo da chamada “barreira”, existe há décadas. Na gestão do prefeito Serafim Correa o lixão se transformou em aterro. Hoje é uma verdadeira montanha na entrada da cidade de Manaus. Um cartão postal negativo da cidade, pois os urubus comandam o espaço aéreo.
Há vários anos, ambientalistas alertam sobre a poluição do atual aterro e cobram providências. O Ministério Público também se manifestou e pressão foi feita para que a Prefeitura encontrasse outro local para “jogar o lixo” da cidade. E a empreitada foi passada para as empresas privadas, que detêm, há décadas, por concessão pública, o serviço de coleta e destinação final dos resíduos sólidos (lixo) da cidade de Manaus.
O novo aterro foi construído, segundo notícia no final de semana (A Crítica 26 e 27/08/23), no Ramal Itaúba, km 13, a BR-174, no bairro Tarumã, Zona Oeste de Manaus, pela empresa EcoManaus Ambiental S.A., administrada pela empresa Marquise Ambiental, mas foi construída sobre uma nascente de igarapé, o Igarapé do Leão, que fica a 100 metros do aterro.
Interessante que os órgãos ambientais (IPAAM, Sema) concederam licença ambiental para o empreendimento, através do estudo do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) e não viram esta situação? Não se preocuparam em averiguar a área e os possíveis impactos ambientais?
Esta situação faz lembrar o recente processo de concessão de uma licença ambiental para implantar um aterro em Iranduba, na estrada estadual AM-040, imediações do km 17, impacto às comunidades de produtores e agricultores locais, bem como de empreendimentos imobiliários e turísticos e até de possível ameaça a aterrissagem de vôos no aeroporto internacional Eduardo Gomes. A mobilização das comunidades, com nosso apoio, por ora, suspendeu o processo.
O que acontece em Manaus é que as sucessivas gestões municipais não cumprem a Lei federal n° 12.305/2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Esta lei prevê o fim dos lixões, a organização dos catadores, a implantação de políticas de coletas seletiva de resíduos sólidos, a reciclagem e ações de prevenção a impactos ambientais.
Esta lei foi resultado de uma luta de 21 anos dos movimentos sociais e entidades ambientalistas, em diálogo com o poder público, onde o tema Lixo e Cidadania foi debatido até nos Fóruns Sociais Mundiais, ocorridos no Brasil, com vistas a ter uma lei para transformar o “lixo” em renda, garantindo cidadania para os catadores e reduzindo os gastos das Prefeituras.
Até hoje a Prefeitura de Manaus não implantou o Sistema de Coleta Seletiva em cada bairro da cidade, onde entidades de catadores, associações de moradores poderiam realizar esta coleta de materiais destinados à reciclagem. Em Manaus já tem várias empresas industriais que compram esses materiais e transformam em insumos industriais. O Pólo de Reciclagem é um dos projetos que defendo há vários anos no parlamento e nas campanhas para prefeito que participei. E vou continuar defendendo.
Com a coleta seletiva, reduziria o gasto da Prefeitura com a coleta de lixo doméstico e sobraria recursos para investir no saneamento dos igarapés que viraram esgotos a ceu aberto e arborização da cidade, enfrentando o infernal calor que atualmente a população é vítima.
O orçamento de 2023, aprovada pela Prefeitura na Câmara Municipal, está previsto em R$ 8,5 bilhões, sendo que R$ 434 milhões é para serviço de limpeza pública, onde está incluso a coleta de resíduos sólidos. Com a coleta seletiva, poderia haver uma economia de mais de R$ 100 milhões por ano a serem investidos na área ambiental e melhorar a qualidade de vida da população.
Assim, lixo seria sinônimo de cidadania, aumento de renda para os catadores e associações, economia para a Prefeitura e mais investimentos sociais e ambientais. Falta coragem e vontade política da Prefeitura de Manaus para fazer isso.
José Ricardo Wendling é formado em Economia e em Direito. Pós-graduado em Gerência Financeira Empresarial e em Metodologia de Ensino Superior. Atuou como consultor econômico e professor universitário. Foi vereador de Manaus (2005 a 2010), deputado estadual (2011 a 2018) e deputado federal (2019 a 2022). Atualmente está concluindo mestrado em Estado, Governo e Políticas Públicas, pela escola Latina-Americana de Ciências Sociais.
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