Da Redação, com Ascom MPF
MANAUS – A Justiça Federal determinou ao Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Estado do Amazonas) que anule as licenças ambientais concedidas irregularmente para as atividades de extração de ouro no leito do Rio Madeira, em área de mais de 37 mil hectares, no Sul do Amazonas.
A sentença atende pedido do MPF (Ministério Público Federal) e manteve decisão liminar de dezembro de 2017. Com isso, toda atividade garimpeira antes amparada por essas licenças deve seguir paralisada. A ação civil pública tramita na 7ª Vara Federal e cabe recurso.
A Justiça considerou ilegais e inconstitucionais as licenças concedidas pelo Ipaam em razão da ausência de estudo de impacto ambiental para exploração mineral e danos ambientais com o uso indiscriminado de mercúrio.
De acordo com a sentença, as atividades autorizadas por essas licenças comprometem a segurança do meio ambiente, podendo ocasionar danos irreparáveis ao rio. Além dos prejuízos ecológicos, danos graves às comunidades tradicionais e os trabalhadores do garimpo foram documentados em relatórios produzidos pelo próprio Ipaam devido à contaminação da água por mercúrio.
Parecer técnico do próprio órgão que concedeu as licenças agora consideradas nulas aponta que, por se tratar de uma atividade com alto potencial de impacto as atividades garimpeiras podem “trazer danos irreversíveis principalmente para os garimpeiros e população ribeirinha que consomem os alimentos que estão no leito do rio”. Durante as fiscalizações foram observados diversos vazamentos de substâncias oleosas no piso de quase todas as embarcações de lavras verificadas.
Os documentos também mostraram que não há destinação adequada de resíduos sólidos. “Estes são queimados em uma metade de barril metálico, geralmente em uma das extremidades da draga (proa/popa), fato que poderá levar integrantes da embarcação a intoxicação por meio de gases e/ou vapores, os quais são dispersos na atmosfera. Outros problemas poderão ocorrer com a continuação da prática de queima de resíduos sólidos no interior das dragas, como: incêndio ou explosões em virtude de se encontrarem armazenados nestas, grande quantidade de combustíveis, os quais são utilizados nos diversos equipamentos e máquinas”, destaca outro trecho do relatório.
Outro problema identificado foi a ausência de utilização de equipamentos de proteção individual por parte dos operadores e auxiliares das dragas, como protetores auriculares em razão do grande ruído gerado pelos motores e bombas de sucção.
Omissão
Nas alegações finais da ação, o MPF apontou, por meio de relatórios e pareceres do Ipaam, a “sistemática omissão dos órgãos de fiscalização, quanto ao controle do uso do mercúrio, que resulta em predatória exploração mineral de ouro nos rios amazônicos”.
Para a Justiça, que confirmou o entendimento do MPF, esses relatórios demonstram o descaso com o meio ambiente por parte dos garimpeiros licenciados pelo Ipaam. O órgão ambiental estadual, “apesar de constatar todas essas irregularidades, continuou a licenciar a atividade garimpeira no leito do rio Madeira”, diz a sentença.
Estudos necessários
Na ação civil pública, o MPF também destacou a necessidade de estudos de impacto ambiental para concessão da licença de exploração, proposta que não foi apresentada pela cooperativa de garimpeiros. O Ipaam justificou a ausência desses documentos argumentando que a atividade é exercida no leito do rio Madeira há cerca de quarenta anos, sempre da mesma forma rudimentar, permitindo a sobrevivência de cerca de seis mil pessoas.
A sentença que anulou as licenças concedidas aos garimpeiros confirma que os estudos de impacto ambiental são necessários para validar o licenciamento e devem ser “íntegros quanto à localização, instalação, ampliação e operação do empreendimento, com vistas a subsidiar análise das possíveis externalidades negativas”.
Uso nocivo de mercúrio
A Justiça destaca também na sentença que o Ipaam não pode conceder licenças ambientais autorizando o garimpo que se vale do uso indiscriminado e descontrolado de mercúrio, já que o Brasil assumiu compromisso com a Convenção de Minamata, norma do direito ambiental internacional que tem por finalidade proteger a saúde humana e o meio ambiente das emissões e liberações antropogênicas de mercúrio e de compostos de mercúrio.
O acordo estabelece uma série de critérios e obrigações para armazenamento e destinação adequados dos resíduos de mercúrio usados no garimpo, com objetivo a reduzir os efeitos nocivos à saúde humana, à biodiversidade e ao meio ambiente.
“A Convenção está em vigor desde 8 de novembro de 2017, impondo ao Brasil (o que inclui todos os entes da federação) o compromisso internacional de progressivamente acabar com uso do mercúrio em atividades de garimpo artesanal, como medida necessária à proteção da saúde humana e do meio ambiente”, afirma trecho da sentença.