Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – A juíza Patrícia Campos, da 8ª Vara Criminal de Manaus, aceitou a denúncia do MP-AM (Ministério Público do Amazonas) contra a ex-secretária de Infraestrutura do Amazonas Waldívia Alencar por prometer R$ 100 mil a um fiscal da Secretaria para aprovar, sem análise técnica, obras antigas e R$ 10 mil por mês pela aprovação de obras em andamento.
Em decisão proferida no dia 19 de maio, Patrícia Campos afirmou que a ação penal preenche os requisitos para ser aceita e processada, pois “expõe satisfatoriamente o fato criminoso, constando a qualificação devida do denunciado, a classificação do crime perpetrado, com indicação de testemunhas e vítima”.
Com o recebimento da denúncia, Waldívia vira ré por corrupção ativa. Na justiça estadual, a ex-secretária responde a 23 denúncias, sendo 21 ações civis de improbidade administrativa e duas ações penais
A denúncia contra a ex-secretária foi apresentada à Justiça do Amazonas em junho de 2020 pelos promotores de justiça Luís Alberto Vasconcelos, Yara Rebeca de Paula e Flávio Mota Silveira, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) do MP-AM (Ministério Público do Estado do Amazonas).
Os promotores relataram que a promessa foi feita ao engenheiro civil Glaupércio Santos Castelo Branco em 2014, quando ele era chefe do Laboratório de Análise de Solos e Asfalto da secretaria. Esse setor existia para realizar contraprova aos dados fornecidos pela empresa contratada pelo governo e atestar se as obras deveriam ou não ser aprovadas.
De acordo com o MP, Waldívia queria que Glaupércio aprovasse laudos laboratoriais atestando a qualidade das obras da secretaria, de forma retroativa, sem a coleta do material de análise. A produção de laudos falsos tinha objetivo de “possibilitar que fosse dada a aparência de regularidade às obras feitas enquanto a denunciada Waldívia Ferreira Alencar era titular da pasta”.
Para os promotores, a inexistência dos dados do laboratório “facilitava a entrega de estradas vicinais ou rodovias com redução substancial de vida útil e propiciava fraudes mediante a indevida aprovação de obras que não atendiam as especificações técnicas, advindas da redução da quantidade do material utilizado (insumos) em desacordo com o contratado pelo Estado”.
Waldívia Alencar atuou como secretária de Infraestrutura entre agosto de 2009 e outubro de 2015, passando pelos governos de Eduardo Braga, Omar Aziz e José Melo. Em 2018, ela foi presa na Operação Concreto Armado, que investigou a existência de suposta organização criminosa que agiu na pasta no período em que ela foi secretária.
As investigações apontaram que Waldívia e os parentes, em nome próprio e por intermédio de empresas, se tornaram proprietários de 23 imóveis em Manaus e Florianópolis (SC) avaliados em R$ 11 milhões. Entre as aquisições incluem duas casas no Condomínio Ephygênio Sales, em região nobre de Manaus, e um supermercado em Florianópolis.
Fiscalização
De acordo com o MP, Glaupércio era servidor da Secretaria de Infraestrutura do Amazonas e tinha a função de fiscalizar o sistema viário, as estradas vicinais e as rodovias em todo o estado, atuando no Laboratório de Análise de Solos e Asfalto da pasta entre 2013 e 2014. O laboratório tinha a finalidade de realizar ensaios técnicos de viabilidade das obras.
O servidor público afirmou que, ao perceber que o laboratório não estava sendo utilizado, informou a ex-secretária sobre a necessidade de realizar os ensaios, mas não obteve resposta. Dias depois, a secretária o procurou para informar que usaria o laboratório “apenas para preencher as fichas de ensaios técnicos atestando a regularidades das obras”.
O engenheiro disse que se opôs à proposta de Waldívia Alencar, mas ela insistiu, dizendo que ele era “inteligente e saberia como aprovar as obras antigas e em andamento”. O fiscal disse que a então secretária sondou a vida financeira dele para depois afirmar que ele não tinha uma “vida financeira estável e agradável” e ofereceu o dinheiro, mas ele rejeitou a oferta.
O MP afirma que a ex-secretária, frustrada com a rejeição da proposta, passou a enfraquecer as atividades do laboratório e contratou uma empresa por R$ 133 milhões para realizar os mesmos serviços “que sairiam por um valor infinitamente menor se fossem feitos pelo laboratório”. A empresa contratada foi a Egus Consult Engenharia e Projetos.
De acordo com as investigações do MP, o laboratório só voltou a funcionar na gestão do ex-secretário Gilberto de Deus, em outubro de 2015. No entanto, Gilberto ficou no cargo apenas por 27 dias e foi substituído pelo ex-secretário Américo Gorayeb, que, conforme a denúncia, fechou as atividades do laboratório de análises.
Denúncia
Gilberto foi quem denunciou as irregularidades na pasta, que incluíam o pagamento de obras não realizadas, a contratação de projetos e serviços não entregues e superfaturamento em obras e serviços. O ex-secretário comunicou o então governador José Melo, que não quis seguir a orientação. Por esse motivo, eles teriam discutido e Gilberto decidiu deixar o governo.
As denúncias motivaram o MPC (Ministério Público de Contas) a abrir investigação e a pedir a suspensão de pagamentos da secretaria e a realização de uma inspeção extraordinária em todas as obras suspeitas de irregularidades. O pedido de inspeção foi negado pelo TCE (Tribunal de Contas do Amazonas) à época.