PARINTINS e MANAUS – Em 2010, o município de Parintins (AM) ganhou destaque na mídia nacional não pela tradicional festa dos bumbás Caprichoso e Garantido, mas porque uma empresa, a NV Construtora, derrubou 80 castanheiras adultas, centenárias, para construir um condomínio do programa Minha Casa, Minha Vida. As primeiras das 1.117 unidades do Residencial Vila Cristina ficaram prontas em 2012, mas o estrago ambiental até hoje não foi compensado, como definido pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam).
O Ipaam estabeleceu como compensação ambiental o plantio de 1.580 mudas de castanheira e a empresa teria que acompanhar o desenvolvimento delas até que não houvesse mais risco de elas morrerem. As mudas foram plantadas, mas metade não sobreviveu por falta de cuidados. É o que diz o homem responsável pelo plantio das mudas, o agricultor José Zeferino Braga de Souza, 68 anos, funcionário da Prefeitura de Parintins. Ela afirma que foi contratado pela empresa para plantar 1.600 mudas e cuidou das árvores nos primeiros anos, mas há mais de um ano a empresa rompeu o acordo e ele deixou de dar manutenção às mudas.
Em viagem de trabalho ao município de Parintins, o professor da Universidade Federal do Amazonas Menabarreto Segadilha França, colaborador do AMAZONAS ATUAL, visitou o local onde as castanheiras foram plantadas, acompanhados de Zeferino. É um terreno do Incra onde funcionou o curso de Zootecnia da Ufam, na comunidade Vila Amazônia. As mudas estão cercadas de mato, outras, em mata fechada, sem a insolação adequada para crescerem.
“Se elas não forem cuidadas, elas vão morrer, porque ela vive abafada com o mato. Assim como ele protege com a sombra, ele também prejudica o crescimento, porque elas não podem respirar. Tem que ser feira uma abertura na floresta, mais um pouco, para ela pegar a quentura do Sol no solo. A planta precisa de um carinho, também. É como uma criança”, disse Zeferino Braga. Algumas mudas mostradas nas imagens, no fim da matéria, vêm recebendo cuidados de Zeferino por conta própria, mas a maioria, segundo ele, está sob a mata fechada ou cercada de mato.
De acordo com o Ipaam, a empresa fez o plantio das mudas em três áreas: em um terreno adjacente ao Residencial Vila Cristina, em uma área da Universidade do Estado do Amazonas e outra na Vila Amazônia. De acordo com o professor Menabarreto, não ficou comprovado que foram plantadas mudas nas duas primeiras áreas apontadas pelo instituto. “O que o Zeferino Braga nos disse é que as mudas foram plantadas todas na Vila Amazônia. Nós estivemos nesses dois locais e não encontramos as mudas”, disse.
Pau-Brasil
Além da obrigação de plantar as 1.580 mudas de castanheira, o proprietário da NV Construtura, Valmir Nogueira, quis fazer média para mostrar que tinha preocupação com o meio ambiente. Em 2011, depois da repercussão negativa do crime ambiental na imprensa nacional, ele foi ao Rio de Janeiro e conheceu a Organização Não-Governamental Pau-Brasil, que produz mudas de pau-brasil e foi responsável por tirar essa espécie de árvore da lista de plantas ameaçadas de extinção.
Com a ONG ele firmou um convênio. Em uma matéria de uma página no jornal Amazonas Em Tempo, de 22 de maio de 2011, Nogueira prometia plantar 1 milhão de mudas de pau-brasil no Amazonas. Em entrevista ao jornal, ele prometia montar em um sítio da família uma espécie de filial da Pau-Brasil no Amazonas. Seriam construídos um horto em Manaus e outro em Parintins.
De acordo com o diretor-presidente da Pau-Brasil, Olavo Oliveira Rufino, naquele mesmo ano de 2011, ele enviou do Rio de Janeiro para Manaus a primeira remessa de mudas da planta. Foram três mil mudas que ninguém sabe aonde foram parar. “Até hoje a empresa NV Construtora não pagou as mudas e não sabemos o que foi feito com elas”. O projeto foi abandonado pelo proprietário da NV.
Outro lado
Procurado pelo AMAZONAS ATUAL, o dono da empresa NV Construtora, Valmir Nogueira, disse desconhecer a contratação do agricultor José Zeferino Braga de Souza para ficar responsável pela plantação das mudas de castanheira na área adjacente ao Residencial Vila Cristina. Valmir afirmou que o trabalho está sendo acompanhado por uma equipe técnica e que a empresa dele plantou o dobro de mudas da espécie recomendado pelo Ipaam.
“Contratamos dois engenheiros florestais para comandar a equipe responsável pela compensação ambiental na obra de Parintins e, honestamente, não lembro se no grupo havia esse senhor”, afirmou o empresário referindo-se a José Zeferino e continuou: “O que sei é que tenho documentado a plantação de mais de 3 mil mudas de castanheiras, ou seja, o dobro do que foi mandado pelo Ipaam e acredito que a metade vingou e outra não por questões ambientais. Isto é, cumprimos nosso acordo”, completou.
Valmir Nogueira atribuiu a denúncia a uma perseguição política por parte de outros empresários em Parintins. “Não entendo por que esse senhor (José Zeferino) procurou a imprensa para reclamar uma dívida e não nos procurou. Acredito que ele seja ligado a alguém contrário aos negócios da empresa, porque o que mais temos feito nos últimos anos é trabalhar em prol do meio ambiente”.
José Zeferino não cobra nenhuma dívida da empresa e nem procurou a imprensa. Ele foi procurado pelo professor Nenabarreto indicado por pessoas que conheciam o trabalho que ele realizou. Zeferino disse que foi procurado pela professora Líbia Saraiva, contratada da empresa, para realizar o serviço. Segundo ele, a empresa o pagou pelo serviço realizado, mas depois abandonou as castanheiras e não deu mais a manutenção necessária para o crescimento das árvores. (O vídeo abaixo, da NV Construtora, confirma que Zeferino trabalhou para a empresa)
Mudas de pau-brasil
Questionado sobre a promessa de 2011, quando anunciou a plantação de 1 milhão de mudas de pau-brasil no Amazonas para também compensar o ‘estrago’ da obra de Parintins, o empresário limitou-se a informar que cumpriu a promessa, mas que não lembrava quantas mudas tinham sido plantadas pela empresa. “Só no meu sítio foram várias”, disse Valmir.
Ipaam
Por telefone, a reportagem procurou o diretor-presidente do Ipaam, Antônio Ademir Stroski, mas ele não atendeu às ligações nem respondeu a mensagem enviada. A reportagem queria saber se a fiscalização do Ipaam visitou o local, porque na nota encaminhada à redação, no ano passado, o instituto diz que: “segundo a empresa, 200 mudas não vingaram no processo de plantio”.
Abaixo, a nota do Ipaam, enviada pela assessoria de comunicação em outubro de 2014, no primeiro contado sobre o assunto:
“O Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) confirma o plantio das mudas de castanheira na área de castanhal adjacente ao conjunto Vila Cristina, em Parintins, e também em área da Universidade do Estado do Amazonas e ainda outra parte na Vila Amazônia. Isto porque a área adjacente ao residencial não suportava o plantio das 1.580 castanheiras definidas como compensação ambiental no verso da Licença de Instalação, emitida em fevereiro de 2012, sendo necessário o uso de outra área que oferecesse condições para o plantio desta espécie de difícil convívio com o meio urbano pelo perigo dos ouriços na fase produtiva da árvore.
Segundo a construtora, 200 mudas não vingaram no processo de plantio. A respeito disso, o Ipaam informa que a construtora terá que plantar novamente esta quantidade. Lembra, ainda, que a construtora tem o dever de acompanhar as mudas plantadas e cumprir com os tratos culturais para que elas se desenvolvam.
Quanto ao relacionamento entre a Construtora e a ONG Pau Brasil, o Ipaam não tem nada a comentar, pois nada tem a ver com o processo de licenciamento ambiental da competência do Instituto.”
Reprodução de página do Jornal Amazonas Em Tempo, que mostra a dimensão do dano ambiental
Reprodução de página do jornal Amazonas Em Tempo em que o dono da NV promete plantar 1 milhão de mudas de Pau-Brasil no Amazonas
Imagens recentes das mudas que sobreviveram do plantio feito pela empresa NV Construtora
(Fotos: Aldenira Ferreira de Almeida)