Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – Projeto de Lei que começou a tramitar na Assembleia Legislativa do Amazonas na última quinta-feira, 11, obriga a exposição, através de cartazes fixados em salas de audiências, da lei que trata do direito dos advogados de falar diretamente com os juízes, mesmo que não tenham marcado hora.
A autora do projeto, deputada estadual Alessandra Campêlo (MDB), justifica que “apesar dos avanços obtidos a advocacia brasileira enfrenta vários empecilhos no exercício da profissão”. Segundo ela, a “prática forense demonstra que alguns dos direitos dos advogados são diariamente desrespeitados”.
“(As prerrogativas garantem aos advogados) o direito de exercer a defesa plena de seus clientes, com independência e autonomia, sem receio ou temor de qualquer autoridade que possa tentar constrangê-los ou diminuir o seu papel enquanto defensores das liberdades e da cidadania”, afirma Campêlo.
Para a presidente da OAB-AM (Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Amazonas), Grace Benayon, a proposta é de “extrema importância”, mas só serve para o período pós-pandemia com a retomada das audiências presenciais, que estão suspensas desde março de 2020 em razão da pandemia da Covid-19.
“A gente não está indo para os espaços (físicos). Nós estamos no atendimento de forma virtual. Então, esse é um projeto de lei de extrema importância para o pós-Covid, para imediatamente assim que forem retomadas as audiências presenciais”, disse.
De acordo com a proposta de Campêlo, os cartazes deverão conter o seguinte teor: “É direito de todo advogado dirigir-se diretamente aos magistradores nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, devendo ser observada a ordem de chegada”.
‘Blindados’
Advogados ouvidos pela reportagem relatam que, apesar de a prerrogativa estar prevista na Lei nº 8.906/1994, na prática nem todo juiz trabalha com as portas abertas para recebê-los. Segundo eles, há casos em que, para chegar até os magistrados, deve-se falar com secretários, diretores e assessores.
Os advogados também relataram situações em que os magistrados os receberam “com nítida má vontade” e “expressa demonstração” que estavam “recebendo por obrigação” e nada do que eles falassem faria a diferença. No entanto, eles também afirmam que há juízes acessíveis no Amazonas.
A advogada Maria Benigno afirma que o cenário tem mudado após “várias incursões e reclamações” da OAB-AM. “Já fui muito mal recebida também. (…) Hoje, acaba que a maioria atende até para mostrar que é diferente. Não é daquela estirpe antiga para quem advogado e lixo era a mesma coisa”, disse.
Benigno afirma que a fixação dos cartazes com as prerrogativas ajudará os advogados que não têm conhecimento que é um direito deles ter acesso aos juízes. “O papel do advogado é argumentar, esclarecer, convencer. Como fazer isso sem falar com o magistrado?”, questionou a advogada.
O advogado Eduardo Deneriaz Bessa lembra que “as prerrogativas dizem que o advogado não precisa pedir licença e nem bater na porta para falar com o juiz”. “Ele simplesmente entra. Mas, é muito difícil você ter um juiz que trabalhe de forma aberta, que seja acessível ao advogado”, afirmou Bessa.
“Eu tenho o exemplo de um desembargador que trata o advogado com maior respeito do mundo, trabalha com as portas abertas, que o advogado tem livre acesso, que é o desembargador Domingos Chalub, que inclusive é o presidente do Tribunal (de Justiça do Amazonas)”, completou.
O advogado Lucas Obando cita casos de juízes que “não gostam de atender os advogados” e “sempre empurram para o assessor ou outro serventuário”. “Até comentava com alguns colegas advogados que era mais fácil despachar com os Ministros do STJ e STF do que com alguns juízes em Manaus”, afirmou.
Obando lembra que antes da pandemia os advogados já sofriam dificuldades para falar com juízes, mas com a suspensão de atendimento presencial, ficou mais difícil ainda. O advogado afirma que há bons exemplos e cita juízes da Comarca de Tabatinga, que disponibilizam até o contato telefônico.
Efeitos da pandemia
As dificuldades para falar com juízes relatadas por advogados se agravaram na pandemia de Covid-19, que exigiu medidas de prevenção. Em março de 2020, quando o estado registrou o primeiro caso de Covid-19, o TJAM (Tribunal de Justiça do Amazonas) suspendeu as atividades presenciais.
Em julho de 2020, o TJAM publicou a Portaria nº 1.586, de 29 de julho de 2020, regulamentando o atendimento, pelos magistrados, dos advogados, procuradores e defensores públicos através de plataformas de videoconferência durante o período de “excepcional distanciamento social”.
De acordo com a presidente da OAB-AM, “a advocacia foi atingida de forma brutal” pela pandemia e, devido a suspensão dos serviços presenciais, os advogados enfrentaram “inúmeras dificuldades” para ter acesso a justiça. A solução firmada com o TJAM foi a criação do ‘balcão virtual’.
“Em janeiro deste ano, a OAB solicitou dos tribunais o plano de retomada das atividades presenciais. A resposta que tivemos foi o ‘balcão virtual’, criado neste mês, que eu acho que é muito positivo, na medida que o advogado vai poder fazer videochamada com o juiz”, afirmou Grace Benayon.
Apesar de prever agendamento para acesso a juízes, o projeto, segundo a presidente da OAB-AM, “vai garantir a advocacia uma comunicação efetiva com os tribunais”. “O advogado poderá, de forma virtual, explicar para o juízo exatamente quais são as argumentações necessárias”, afirmou.
Para a presidente da OAB-AM, essas medidas, como a necessidade de marcar horário para falar com juízes pela internet, devem ser analisadas com equilíbrio, levando em consideração que “os serventuários da Justiça têm um horário de trabalho”. “Os servidores estavam sendo demandados a noite”, disse Benayon.
“Nesse período de pandemia, todo mundo teve que se reinventar. Os acessos foram de forma virtual. A gente precisou instalar mecanismos para, junto com o Tribunal, encontrar soluções para o atendimento, para as audiências, pois as pessoas não poderiam se deslocar”, disse a advogada.
A reportagem solicitou informações da deputada Alessandra Campêlo, mas até a publicação desta matéria nenhuma resposta foi enviada. O presidente da Amazon (Associação dos Magistrados do Amazonas), juiz Luís Márcio Nascimento Albuquerque, informou que não irá falar sobre o assunto.