Da Redação
MANAUS – O endocrinologista Flávio Cadegiani, pesquisador principal do estudo com o medicamento proxalutamida no tratamento da Covid-19, que contou com a participação de pacientes internados nos hospitais da Samel em Manaus, afirmou que a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) foi induzida ao erro por informações falsas fornecidas pela Conep (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa).
O médico se manifestou em nota divulgada no Twitter nesta segunda-feira (11), após a Unesco divulgar declaração em que aponta “violação dos direitos humanos” e infrações éticas graves na pesquisa coordenada por Cadegiani.
Em setembro, a Conep denunciou a pesquisa à Procuradoria-Geral da República. Em declaração divulgada no último sábado (9), a Unesco considerou a denúncia de 200 mortes de voluntários de pesquisa clínica com a proxalutamida feita no Amazonas uma violação aos direitos humanos e uma das infrações éticas mais graves e sérias da história da América Latina.
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Na nota, Flavio Cadegiani diz que a Unesco foi levada ao erro por declarações tendenciosas e acusa a Conep de fornecer informações inverídicas e distorcidas, que segundo ele, decorrem de “vazamentos ilegais, os quais são objeto de investigações pelos órgãos de controle e pela Justiça Federal”.
O pesquisador afirma que com relação à afirmação de suspeitas sobre 200 mortes no estudo da proxalutamida não houve nenhum óbito suspeito pela Conep.
“Um parecer emitido pelo sistema CEP/Conep aprovou todos os procedimentos e relatórios acerca do estudo no Amazonas (Parecer nº 4.690.573). Esse parecer foi desconsiderado pela Conep sem qualquer justificativa, sendo emitido outro. Mas, de qualquer forma, é certo que não houve nenhuma morte suspeita, uma vez que, após esse estudo, foram aprovados outros 25 estudos com proxalutamida”, disse.
De acordo com Cadegiani, nunca houve divergência do número total de óbitos e todos foram por Covid-19, sem relação com o medicamento usado na pesquisa.
“Ou seja, no dia 11 de março de 2021 foram apresentados dados de pacientes que fizeram o tratamento adequadamente, sem abandono, por 14 dias. O estudo foi finalizado no dia 15 de abril de 2021. Mesmo após o encerramento do estudo, os pacientes continuaram sendo monitorados até a cura completa da doença ou atestado de óbito. Os dados finais foram inseridos no Clinical Trials no dia 23 de junho de 2021, com todos os pacientes que participaram do estudo, mesmo aqueles que não fizeram o tratamento completo de 14 dias, e são dados de 28 dias, e não 14 dias após iniciado o tratamento. Obviamente, mais de três meses e meio depois da apresentação inicial ocorreram mais óbitos”, justificou.
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Quanto à informação na denúncia de que houve autorização para a realização da pesquisa com 294 voluntários em Brasília, mas que, segundo a comissão, o protocolo começou a aplicado no Amazonas em fevereiro sem autorização, no total de 645 pessoas, Cadegiani afirma que o estudo aprovado pela Conep não previa nenhum hospital em Brasília. Segundo ele, o estudo foi aprovado para ser realizado em hospitais no Brasil, ficando em aberto o rol desses hospitais.
O pesquisador nega que as informações sobre óbitos não foram prestadas no prazo. “Conforme protocolo aprovado pela Conep, o compromisso ético seria comunicar eventos adversos sérios em 24 horas, mas apenas os decorrentes da medicação em teste. No entanto, nenhum evento adverso sério decorreu da medicação em teste”, disse.
A Unesco considerou igualmente condenável a denúncia de que os pesquisadores, apesar de terem conhecimento dos sucessivos óbitos e dos eventos adversos graves, continuassem com o recrutamento e a execução dos estudos.
Cadegiani diz que quanto à alegação de que os testes deveriam ser interrompidos, conforme parecer de aprovação do estudo emitido pela Conep, a interrupção somente ocorreria se os óbitos fossem devidos ao uso da medicação em estudo.
“Uma comissão independente, indicada no Protocolo da Pesquisa e devidamente aprovada pela Conep, acompanhava constantemente os eventos adversos graves e óbitos, e recomendou a interrupção no momento adequado, e não em razão dos óbitos, uma vez que, um total de zero óbitos ou eventos adversos graves foi associada à droga”, afirmou.
O pesquisador acusa a Conep de mudar o posicionamento quanto ao estudo após interesse do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pelo medicamento.
“É nítida a mudança de comportamento da Conep com relação à utilização das normativas conforme a conveniência, valendo-se ainda de interpretações esdrúxulas de normas aleatórias, após a demonstração de interesse do presidente Jair Bolsonaro pela proxalutamida”.
Cadegiani afirma que por conta da declaração e supostas irregularidades na condução dos procedimentos pela Conep, e pelo suposto vazamento de informações, foram feitas representações junto ao Ministério da Saúde, CGU (Controladoria Geral da União) e à Procuradoria-Geral da República.
O ATUAL entrou em contato com a Samel questionando se a rede de hospitais tem conhecimento dos pontos informados na matéria citados na denúncia da Conep e se além da participação dos pacientes da Samel no estudo, quais foram as outras formas de atuação do hospital na pesquisa. A reportagem aguarda resposta.
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