Por Ana Carolina Barbosa, da Redação
MANAUS – Em entrevista exclusiva ao AMAZONAS ATUAL, a prefeita interina de Iranduba, Maria Madalena de Jesus Souza (sem partido), 55, que assumiu o comando do município após a prisão do prefeito Xinaik Medeiros (Pros), há duas semanas, já demonstra interesse nas eleições do próximo ano. Ela tem chances de permanecer no cargo caso se confirme a cassação do chefe do executivo, acusado de fraude e desvio de recursos públicos. Durante a conversa, ela fala da trajetória profissional e diz estar preocupada em entregar obras em andamento na cidade, que faz parte da Região Metropolitana e está situada a 24 quilômetros de Manaus. Natural de Manacapuru, Madá do Iranduba, como é conhecida nas comunidades, em especial, nas localizadas no Distrito do Cacau Pirêra, onde reside atualmente, a prefeita explica como foi sua relação conturbada com o prefeito e relata o desgaste da relação política e de amizade que a obrigou a afastar-se da prefeitura. Madalena iniciou a carreira política no PV, migrou para o PTB quando formou chapa para candidatura a vice-prefeita e hoje aguarda confirmação de filiação ao PSDB. “Eu era PV e estava agora no PTB. Agora, me filiei ao PSDB e estou aguardando”. A seguir, a entrevista realizada pela jornalista Ana Carolina Barbosa.
AMAZONAS ATUAL – Como nasceu sua parceria com o prefeito Xinaik Medeiros?
MADALENA DE JESUS – Ele era um taxista que trabalhava na comunidade e a família Medeiros tem nome no município. Não condeno ninguém. Ele é um ser humano. Fomos amigos de muito tempo. Ele teve uma votação expressiva para vereador e naquele corre-corre da balsa [antes da construção da ponte Rio Negro], entre 2011 e 2012, houve essa brincadeira de que poderíamos nos unir [para uma eventual candidatura]. Em 2012, houve uma reunião, um proprietário do Janauari [comunidade rural do município] fez uma reunião na feira do Santo Antônio [em Iranduba] e eu fui e lá e disse: “como dois lisos vão concorrer em uma eleição para prefeito?” Aí fomos e eu dizia que era vice do Xinaik e ele dizia que era candidato comigo. Por três vezes ele me perguntou se eu não queria sair primeiro [cabeça de chapa], porque por onde a gente ia o pessoal falava o meu nome. O Cacau era tão abandonado que eu dizia que queria cuidar daquele pedacinho de chão. Nosso plano de governo previa a criação de uma subprefeitura no Cacau, que nunca foi concretizada. Eu cuidaria do Cacau, da estrada Manuel Urbano e [das comunidades] do Rio Negro, e ele [Xinaik] estaria na sede do município nas comunidades do Solimões. Ambos teríamos que prestar contas dos recursos.
ATUAL – Ele não viabilizou a subprefeitura?
MADALENA – Nem a subprefeitura e nem me deu um gabinete. Agora [como prefeita], eu disse à população do Cacau que começaria agora com um choque de gestão no Nova Veneza para cuidar daquele povo como um todo.
ATUAL – A senhora disse em entrevista recente a uma emissora de rádio de Manaus que tinha conhecimento do esquema de desvio de verbas na prefeitura, mas que não denunciou porque não tinha provas. A senhora não considera que foi omissa por não ter denunciado o caso para iniciar uma investigação, já que havia indícios de corrupção no Executivo?
MADALENA – Tudo o que acontecia aqui dentro eu era colocada de lado. Nunca acompanhei nenhuma conversa.
ATUAL – Como a senhora tinha certeza?
MADALENA – A gente não é boba, mas eu não tinha provas. Eu desconfiava. Eu cheguei a ir (…) ao no Ministério Público junto com o Conselho Cidadão, só que o conselho fazia as denúncias pelas situações que encontrava com os amigos. Quando eu falava com os empresários, eles diziam que não tinha nada e eu ficava sempre na mesma situação: sem saber de nada.
ATUAL – A senhora assumiu a Secretaria de Saúde logo depois de assumir o cargo de vice-prefeita. Ficou quanto gerenciando a pasta?
MADALENA – Dois meses e 4 dias. O prefeito me exonerou e foi quando começamos nossas brigas. Tentei bater nele porque ele disse que vice-prefeito quando não fazia nada morria e, por isso, eu disse que ia registrar um B.O contra ele, mas não registrei.
ATUAL – Ele lhe ameaçou de morte?
MADALENA – Ele falou para uma amiga minha (que vice-prefeita que não fazia nada morria) e tivemos a discussão. Ele aproveitou o ensejo para me exonerar e aí, na casa dele, tivemos outra discussão feia porque ele alegou que não tinha falado isso para minha amiga.
ATUAL – Desde então a senhora não teve mais contato com o prefeito Xinaik Medeiros?
MADALENA – Desde lá para cá nosso contato foi muito pouco. Isso [a briga] foi em março de 2013. Chegamos a ficar seis meses sem contado. Parte da família dele deixou de falar comigo e eu vivi minha vida como vice-prefeita. Ele tirou meu gabinete.
ATUAL – A senhora disse que fazia atendimentos debaixo de árvores e nas escadarias. Que tipo de atendimento, já que a senhora diz que não tinha ingerência sobre recursos ou decisões da prefeitura?
MADALENA – Porque os comunitários vêm das comunidades para serem ouvidos e eles merecem isso. Eu fazia, os ouvia. Eu ouvia porque, graças a Deus, eu sou bem quista. Eu anotava a solicitação deles, anotava os pedidos com eles e alguns secretários, só que [os secretários] não ouviam, “porque era a Madá” [quem pedia].
ATUAL – A senhora acha que isso ocorria de forma proposital? Que era uma orientação do prefeito Xinaik?
MADALENA – Era proposital. “Vocês pensam que a Madá é a prefeita? Ela não é, não. Eu é que sou prefeito”, ele [Xinaik] falava por aí. Então, eu mantinha o meu contato [com os comunitários]. Eu conversava, abraçava, beijava o povo do Iranduba e era isso que eu fazia. O pouco que eu fiz foi pelo povo do Cacau Pirêra, que eu troquei uma tubulação do (bairro) Nova Veneza e vendi um carro que eu tinha para pagar, porque o prefeito não pagou. O trabalho custou cerca de R$ 8 mil. O primeiro tapa-buracos da estrada Manuel Urbano [Manaus/Manacapuru] também. Na época do Omar Aziz, [então governador], a gente conseguiu que a operação tapa-buracos ocorresse. Inclusive, foi um documento que eu enviei para o governador da época, que viabilizou. A gente conseguiu, mas os profissionais queriam ficar só até às 14h. Então eu aluguei uma van para levá-los e eles ficavam mais tempo no trabalho. Quanto a dívida estava em R$ 7 mil ou R$ 8 mil, eu fui ao prefeito cobrar o pagamento e ele me pediu para cobrar do governador. Mas como eu poderia fazer isso se não estava nada acertado? Então eu vendi um terreno meu para pagar o aluguel do carro. A única coisa que ele me fez foi uma proposta indecente para eu comprar uma van no meu nome e alugar para a Prefeitura.
ATUAL – Uma transação ilegal neste caso…
MADALENA – Super ilegal e eu não aceitei porque sou honesta.
ATUAL – A senhora diz que não teve participação na gestão, mas quando o prefeito viajava, a senhora não assumia a prefeitura?
MADALENA – Assumi três ou quatro vezes legalmente.
ATUAL – E não chegou a assinar contratos?
MADALENA – Em setembro, só fiz distratar uma firma do senhor Osnir, das UBSs [Unidades Básicas de Saúde], que não estavam concluídas. Elas tinham sido licitadas e tinham pago uma parcela e a obra estava por acabar. Entrou um novo rapaz [contratado], que agora também está respondendo [no processo que apura as irregularidades na prefeitura], porque o recurso destinado à obra é federal e ela não teve continuidade. Nunca fiquei com sequer R$ 0,10. Sempre metia a mão no meu bolso para ajudar as pessoas.
ATUAL – Senhora chegou a acompanhar a distribuição de material no período da cheia no Cacau Pirêra? O AMAZONAS ATUAL produziu reportagem quando houve a liberação do recurso federal para auxiliar as famílias, mas no período final da enchente. À época, a prefeitura alegou já ter injetado dinheiro para ajudar as famílias e o recurso federal apenas iria cobrir os gastos feitos pelo Executivo Municipal. Procede?
MADALENA – Eu soube dos comentários do recurso federal. Inclusive, temos que devolver R$ 3 mil e poucos reais, da Defesa Civil. Mas tem um recurso que foi tirado e eu não sei o valor e nem como foi aplicado. Ele [Xinaik] comprou cestas básicas, entregou e a empresa que ganhou para fornecer kits para a população, cerca de 800, vai ter que devolvê-los. Estou vasculhando, vou fazer a denúncia e vão ter que devolver os kits, que não chegaram à população.
ATUAL – Todos os contratos investigados foram suspensos? Como a senhora está trabalhando os serviços básicos, como limpeza pública, sem contratos em andamento?
MADALENA – Quando eu falei com o promotor Mauro Veras e com a promotora Laíse, do Ministério Público, eles me orientaram a fazer relatórios dizendo as necessidades. O lixo, distratamos o contrato com a empresa, e o valor era alto. Outros contratos fui orientada a não pagar. Tem proprietários de firma que estão kits com a prefeitura, mas não com quem executava os serviços (…) Tem gente que recebia e não pagava os funcionários. Tem gente que está há quatro meses sem receber. Se eu pagar os funcionários, terei que responder [judicialmente], porque os contratos já foram pagos. Pedi orientação ao Ministério Público e fui orientada a não pagar nada daqui para trás [o que foi contratado pelo prefeito Xinaik Medeiros].
ATUAL – Mas os serviços estão tendo continuidade?
MADALENA – O único problema agora é o transporte escolar, que tem verba específica. Conversei com os empresários para manter os serviços. O medo deles hoje é de não receber.
ATUAL – As mesmas empresas dos contratos irregulares continuam atuando no município?
MADALENA – Estão paradas em termos de obras, mas o transporte escolar estamos mantendo. Até quinta-feira (26) teremos resposta sobre as empresas que participarão das licitações e que receberam as cartas-convite. Precisamos entregar as obras. Tem obras que já querem entregar e estou de mãos atadas para receber. Algumas obras estão prontas e começam a ser depredadas. Preciso dar andamento, iniciar as licitações e cumprir prazos. Em algumas obras, os prazos encerram em dezembro. Preciso fazer as licitações. Vamos pedir, através de comunicado, que os empresários do município que queiram participar, se legalizem junto à prefeitura, para participar das licitações que terão início fim do mês e você sabe que são três meses [o processo licitatório].
ATUAL – Quantos bens a senhora têm em seu nome atualmente? Soube que a senhora comprou ambulâncias para o Cacau Pirêra com recursos próprios.
MADALENA – A serviço como vereadora, em 2004 – e em 2008 participei mais uma vez das eleições, fui bem votada mas não ganhei por causa do quociente eleitoral –, comprei a primeira ambulância. Eu não tinha apoio [político] e o Cacau não tinham ambulância. Usávamos uma Kombi velha que eu tinha para transportar os doentes. Fazia porque gostava e porque sou profissional da saúde [formada como técnica de enfermagem]. Eu não tinha a intenção de ser candidata naquela época, mas os comunitários me apoiaram e acabei me elegendo. Eu já era oposição ao governo municipal. Fui a uma concessionária e comprei um carro para transformar em ambulância. Dias depois vi uma ambulância à venda, do deputado Francisco Souza, e troquei a Fiorino que eu tinha comprado e completei com mais um valor parcelado. Eu tinha também um terreno no Cacau e transferi para o projeto SOS vida. Peguei sete profissionais para trabalhar nele. Dividia meu salário de vereadora e eu também trabalhava como técnica em enfermagem no [Hospital Universitário] Getúlio Vargas, em Manaus. Trabalhei como parteira desde os 14 anos e também como agente de saúde. Eu tirava plantões, horas extras, cheguei até a vender merenda e tinha uns amigos médicos que vinham prestar solidariedade à comunidade, o que gerou ciúmes ao governo municipal, que não queria que eu colocasse a ambulância para rodar. Antes que a gente brigasse, no segundo ano, comprei uma ambulância maior. Meu salário de vereadora foi todo para o povo e foi uma festa… Fiz o atendimento de quase 30 mil pessoas e isso fez com que eu tivesse votação como vice do Xinaik.
ATUAL – E sobre os bens?
MADALENA – Antes da política eu já tinha meus bens: 1 casa no São Jorge [Manaus], há mais de 20 anos; no Cacau, eu tenho uma casa mista [madeira e alvenaria], duas casas pequenas de alvenaria, um terreno no bairro Nova Veneza com uma casa de alvenaria que está no meu nome, mas é para o meu filho mais velho. Essa que eu havia cedido ao SOS Vida, fiz uma troca com a que eu moro hoje, no bairro Cascavel. Também tenho meu terreno na estrada de Novo Airão, que já está em processo para eu passar para o nome do meu filho e tenho um carro que não funciona mais, depois de um acidente.
ATUAL – A senhora exonerou todos os secretários nomeados pelo prefeito Xinaik Medeiros?
MADALENA – Ainda não anunciei meu secretariado. Ainda tenho duas situações. Exonerei todos e tenho duas pastas para resolver.
ATUAL – Já tem então 11 novos secretários definidos?
MADALENA – Sim, e quero unificar algumas secretarias. Quero que fiquem dez, mas se eu conseguir economizar o que eu pretendo, irei manter todas. Da gestão do Xinaik, talvez fique a Samia Rocha, da Habitação e Infraestrutura, mas ainda não está nomeada. Estamos em processo de requerer terras ao município e ela já está por dentro do processo. Precisamos que o Iranduba tenha suas terras. Quero diminuir a folha e tirar quem não trabalha. Tinha gente há dois anos sem aparecer no trabalho, só recebendo..
ATUAL – O chefe da Casa Civil, Ednor Pacheco, que a senhora nomeou assumiu ao MP-AM que precisou pagar propina ao prefeito Xinaik para conseguir receber o valor contratado com a prefeitura através da empresa dele. A senhora não considera isso grave?
MADALENA – O Ednor já foi vereador e é de minha inteira confiança. Estou sabendo o que aconteceu. Ele já chegou a dizer que pode ir preso e não é nenhum segredo para o irandubense. Ele está me dando suporte [na gestão]. Acho que não tem nenhum empresário que não tenha sido forçado a essa situação [pagamento de propina].
ATUAL – A senhora sabe quantos contratos foram suspensos depois da prisão do prefeito?
MADALENA – Não sei ainda, mas temos 52 obras que estou louca para entregar. As áreas da saúde e da educação estão paradas. Temos duas escolas padrão com catracas eletrônicas e com blindex. A do Cacau está pronta, só falta o segundo piso. Temos UBSs, quadras para entregar e temos não só na sede, mas nas comunidades. Minha preocupação hoje é que o ano que vem é um ano de eleição. Sobre a educação, estamos com o ano letivo até 18 de janeiro e o calendário está adequado com algumas escolas. Temos escolas que precisamos pisar em tábuas por causa da seca, em localidades do Solimões e Rio Negro.