Da Redação
MANAUS – Negar a motivação política do crime que vitimou Marcelo Arruda, o militante do PT assassinado pelo policial penal Jorge Guaranho durante festa de aniversário, “é praticar um terraplanismo jurídico”, afirma o Grupo Prerrogativas, composto por juristas, juízes, advogados, professores e pesquisadores de diversas áreas do Direito.
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Em nota pública, os especialistas classificam o caso como um “crime de ódio e inegavelmente político”. O assassinato ocorreu em Foz do Iguaçu, no Paraná, no último dia 9 de julho.
“Uma festa familiar e privada foi interrompida por um invasor armado, que entrou desferindo tiros e matou o aniversariante, um homem que comemorava seus cinquenta anos, em uma festa marcada pela modéstia e pelo tema: o PT e o Presidente Lula. Uma festa de amor e esperança. Foi esse o motivo da invasão. Aliás, foi esse o único motivo da invasão”, afirmam.
Para o Prerrogativas, a conclusão da Polícia Civil do Paraná de que o crime se trata de homicídio por motivo torpe, sem motivação política é “um disparate”.
“Não é isso o que se espera de uma instituição de estado. Não é isso o que se espera de agentes públicos que não são pagos para escamotear de forma pueril a realidade que rebrilha aos olhos de todos, não são pagos pelo contribuinte para exercer uma posição partidária que em nada contribui para a harmonia e a paz sociais”, diz a nota.
Mesmo admitida a motivação política, ela não consta no inquérito como motivo do crime, segundo a delegada Camila Cecconello, da Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa da Polícia Civil do Paraná.
“Quando ele [Jorge Guaranho] foi ao local pela primeira vez, foi no intuito de provocar a vítima. Ficou claro que houve uma provocação em termos de razões políticas. Mas não há provas suficientes que atestem que ele queria cometer um crime contra um partido político”, disse.
Guaranho, apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL), está internado em estado grave e foi indiciado por homicídio qualificado por motivo torpe e por perigo comum a outras pessoas.
De acordo com a delegada, a conclusão do inquérito foi com base na análise das imagens do local do crime e no depoimento de testemunhas. Guaranho soube da festa de aniversário de Arruda por imagens de segurança do local. Ele estava em um churrasco com amigos quando viu as imagens no celular de um dos presentes.
Ceccomello afirmou que Guaranho ficou quieto, mas depois saiu do churrasco. Momentos depois, ele apareceu na festa de aniversário de Arruda e houve a provocação. A delegada informou que Arruda jogou areia no carro de Guaranho.
Quando retornou à associação onde ocorria a festa de aniversário do militante do PT, Jorge Guaranho agiu por impulso. “Ele foi movido pelo impulso do que por algo que ele premeditou”, disse Camila. O crime político foi descartado porque o ato não se enquadra na lei que estabelece a infração.
O Prerrogativas considera que negar a motivação política do crime é inaceitável na medida em que contraria todas as evidências publicamente sabidas e por todos ressaltadas.
“Sabe-se que a capitulação dada pela polícia é provisória e espera o Grupo Prerrogativas, ciente da responsabilidade histórica e social que possui e da qual se orgulha, que o Ministério Público do Paraná corrija os rumos da persecução penal, dando nomes verdadeiros aos bois ou melhor, aos lobos, e que os contenha, nos rigores e nos limites da lei”, afirma.
O resultado do inquérito gerou repercussão entre aliados de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de Jair Bolsonaro (PL).
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O ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP), usou as conclusões da polícia para criticar a imprensa. “Um dos princípios do jornalismo não é a imparcialidade? Foram dezenas e dezenas de horas afirmando que a tragédia de Foz foi crime político. Agora não seria a hora de dezenas e dezenas de horas de esclarecimentos e pedidos de desculpa? Ou é isso ou a parcialidade vai ficar escancarada. Só que o povo não é bobo. E percebe. E na hora certa vai falar”, disse nas redes sociais.
A presidente nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), afirmou por sua vez que a conclusão das autoridades paranaenses é “açodada e contraditória aos fatos” e que ela significa “mais um incentivo aos crimes de ódio e à violência política comandadas por Bolsonaro”.
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