Todo fim de ano acendem-se as fogueiras da vaidade nos poderes da república baré. Não é exclusividade desta terra, é bem verdade, mas nessas que já foram chamadas de Paris dos Trópicos, o glamour parece mais contagiante. O Porto de Lenha talvez nunca seja Liverpool, mas nele se alimenta o sonho típico das realezas, na camada palaciana ou cortesã. Uma elite que não se contenta em servir-se dos generosos orçamentos construídos com a pesada carga tributária sobre os trabalhadores; é preciso exibir esse modo de vida, afinal, de que vale o brilho se ele não pode ser visto? E assim se criam, ano após ano, as medalhas, as condecorações, as homenagens.
Não basta comer e beber às custas da patuleia; na basta usufruir do tesouro real, através das pensões e cargos públicos; é preciso massagear os egos, “elevar a autoestima”, exibir as coroas e cetros. E assim, cada ducado realiza a sua festa para distribuir os títulos à nobre casta. O Poder Legislativo, o Poder Judiciário, as Forças Armadas, a elite empresarial distribuem entre essa casta as medalhas de fim de ano.
O motivo alegado para tais condecorações são os “relevantes serviços prestados à sociedade”. Contam-se nos dedos aqueles que realmente são merecedores de tal prêmio. A maioria prestou relevantes serviços para o grupo que lhe presta a homenagem. O que está por trás das escolhas, na maioria dos casos, são os interesses políticos e econômicos. Como nos tempos remotos, paga-se o preço que for necessário para se estar no palácio e receber os cumprimentos do rei.
A patuleia assiste embasbacada o desfile de figuras sem qualquer relação social com a cidade ou o Estado. O mais comum é um gesto de surpresa pela figura agraciada e o questionamento sobre o que a levou a receber tal prêmio. Não há qualquer envolvimento dos andares de baixo. Os súditos não participam da escolha dos nobres.
Mas é esse o alimento da alma daqueles que não acordaram para a realidade, que teimam em viver em um mundo de fantasias. A reviravolta cultural não foi capaz de acordá-los do sonho. O mundo de igualdade, em que essa casta está para servir e não para ser servida, é uma ilusão. Importa uma medalha no peito e as benesses do poder. Aos súditos resta trabalhar mais e mais para manter a nobreza no conforto de seus palácios.
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