Por Iolanda Ventura, da Redação
MANAUS – Na contramão da proposta do governo de Jair Bolsonaro que reduz a quantidade de municípios no Brasil, no Amazonas nove distritos e comunidades entraram com pedidos junto à Comissão de Assuntos Municipais e Desenvolvimento Regional da ALE (Assembleia Legislativa do Amazonas) para que sejam reconhecidos como municípios.
Presidida pelo deputado Fausto Junior (PV), a comissão recebeu as solicitações de Caviana (Manacapuru), Cacau-Pirera (Iranduba), Purupuru e Janauacá (Careiro Castanho), Mocambo do Arari (Parintins), Canumã (Borba), Belém do Solimões (Tabatinga), Santo Antônio do Matupi (Manicoré) e Caiambé (Tefé) informando que estão aptos a se tornarem municípios.
A emancipação das comunidades dependerá da capacidade de se manter sem depender dos repasses governamentais. “Se a comunidade ou distrito não consegue se manter sozinho, não tem condições de virar município”, diz Fausto Júnior.
O deputado alega que houve várias tentativas para levar serviços às comunidades distantes dos centros do município, mas sem êxito.
“Nos Estados onde a criação de municípios foi feita de modo organizado, conseguiram levar diversos serviços às comunidades mais distantes, inclusive favorecendo o crescimento delas”, diz Fausto Júnior.
Esses dois pontos, o isolamento amazônico e autonomia financeira, são os principais argumentos para a permanência e criação de municípios no Amazonas.
O debate entre prefeitos e parlamentares surgido após a proposta do governo Bolsonaro para alterar as regras para criação, desmembramento e fusão de municípios no Brasil gira em torno das dificuldades de acesso e administração de recursos públicos.
Júnior Leite, presidente da AAM (Associação Amazonense dos Municípios) e prefeito de Maués, alega que além da distância da capital, dentro dos próprios municípios há dificuldades para o deslocamento, já que há moradores das áreas ribeirinhas e rurais que estão a horas e até dias de viagem das sedes.
Questionado sobre a necessidade de resolução dos problemas de mobilidade para levar o serviço público à toda a população, Júnior Leite afirma que a situação não se resume à mobilidade.
“A questão é que as cidades tem todo o aparato estatal como Ministério Público, Judiciário, segurança, saúde e, quando extinta ou quando acontece uma possível fusão, isso tudo acaba transtornando a situação já muitas vezes com várias dificuldades”, afirma.
A PEC proposta pelo governo central estabelece que cidades com arrecadação própria menor que 10% da receita total e com menos de 5 mil habitantes deverão ser fundidas ao município vizinho.
No Amazonas, apenas Japurá (a 744 quilômetros de Manaus), com 2,7 mil habitantes deve ser afetada se a proposta for aprovada no Congresso.
Entretanto, a maior parte dos municípios depende de repasses estaduais, como o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e federais, como o FPM (Fundo de Participação dos Municípios).
Indagado sobre uma possível dependência desses distritos, caso se tornassem municípios, Júnior Leite diz não serem apenas os municípios amazonenses que estão dependentes de repasse de verbas federais e estaduais.
“Estudos de entidades representativas do movimento municipalista brasileiro indicam que entre 90% a 95% dos municípios do País passam por esta situação, por diversos motivos”, diz Leite.
O cientista político Helso Ribeiro questiona o argumento de que é caro manter um município que não tem autonomia financeira, e afirma que o problema poderia ser minimizado com uma reforma política.
“Tinha que ser criado mais municípios sem o peso administrativo que nós temos hoje. Muitas repartições públicas e uma câmara municipal repleta de pessoas. A gente poderia pensar inclusive em tirar salários, já que o mandato é popular, a pessoa continuaria a exercer o seu trabalho”, diz Ribeiro.
Para Helso Ribeiro, a mudança no status dos distritos seria positivo, pois não ficariam dependentes da sede onde estão localizados e facilitaria a administração por ser um espaço menor.
“Se você cria um polo administrativo em um determinado lugar acaba confluindo comércio e serviços. Agora, quando você vai extinguir você vai isolar aquela comunidade”, pontua.
Ribeiro vê como desproporcional o tamanho do estado para a quantidade de municípios e acredita que a extinção pode sobrecarregar a capital.
“Eu acredito que vai haver uma tendência de empobrecer os municípios menores e ocorrer um êxodo para as capitais, que já estão lotadas e em condições não tão dignas de receber mais pessoas”, diz.
Estados com extensão territorial menor que o Amazonas, como Minas Gerais e Santa Catarina, têm 14 vezes e 5 vezes respectivamente mais municípios. Minas Gerais tem 853, e Santa Catarina, 295. O Amazonas tem apenas 62.