O aumento no número de casos de coronavírus e sua rápida disseminação resultaram na decretação da pandemia, exigindo medidas de contenção nos países afetados pela doença, dentre elas o distanciamento social ampliado. A partir deste momento, a população ficou no meio do fogo cruzado das narrativas a favor ou contra o isolamento, intensificando o pânico, já que todos estão refém da sensação de que nada pode ser feito para controlar a enfermidade. Mesmo assim, inúmeras pessoas insistem em descumprir recomendações mínimas – como o uso de máscaras – ao frequentar locais públicos, ensejando a adoção de restrições ainda mais drásticas: o chamado lockdown. Para este, por se tratar de exceção, é importante que se discuta uma estratégia de acordo com a situação de cada lugar, principalmente quando o número de internações chegar perto de comprometer a rede de atendimento.
O dito popular diz que o brasileiro precisa ser estudado pela Nasa, pois, mesmo na desgraça, não perde a piada. No caso em questão, passou a designar que “lockdown é o parente da black friday e aí mesmo que o pessoal vai para a rua”; já chamou a medida de “lonquindom”; já disse até que é um remédio distribuído para combater o coronavírus. Brincadeiras à parte, lockdown significa confinamento ou fechamento total. É o método mais radical imposto para que as pessoas cumpram o período de isolamento social. Sua finalidade precípua é evitar que o total de infectados aumente rápido e isso cause sobrecarga nos hospitais.
Consiste, portanto, na interdição de ruas, proibindo deslocamentos e viagens não essenciais. Na prática, a população só sai para comprar alimentos e transportar doentes. O descumprimento da medida enseja medidas severas, que variam de multas até prisões, a exemplo do que está ocorrendo no Maranhão, Pará e São Paulo; este, inclusive, determinou: empresas que não cumprirem as medidas terão as portas de seus estabelecimentos soldadas pelos fiscais da prefeitura – método sendo aplicado.
A maior parte dos Estados colocou em prática o distanciamento social ampliado, no qual a população é instada a permanecer em casa, evitar aglomerações e restringir ao máximo o contato entre as pessoas. Medida menos agressiva, mas que precisa da colaboração do povo, agindo de forma consciente e principalmente cumprindo as regras básicas da boa higiene, educação e às determinadas pelo Ministério da Saúde.
Porém, não é o que acontece. Parte da população continua nas ruas, sem máscaras, muitos apenas com intuito de tentar “desmascarar” o “mito”. O baile funk continua “comendo solto” – o organizador alega que não há risco, “cada um tem que cuidar da sua vida e deixar quem quer se divertir”; churrasco na casa dos outros e supermercados vendendo bebidas alcoólicas como nunca, ou seja, é “#sextou” agora todos os dias.
A saúde pública no Brasil atravessa inúmeras crises a décadas, que matam milhares de pessoas: só em 2019 foram 156.629 mil casos de malária; 40.721 mil mortos por acidente de trânsito e mais de 63 mil mortos por câncer. No entanto, além do interesse científico, os sérios problemas recebem status de pandemia mais por objetivos políticos, ou seja, para reduzir a burocracia estatal, ou melhor, facilitar a adoção de medidas não tão democráticas.
Voltando à crise mais recente, a população clama por medidas urgentes que tragam esperança de dias melhores, achatando a tal curva de crescimento da doença. O impacto na vida das pessoas, psicológica e economicamente, é incalculável. O povo brasileiro já sente os efeitos. Por conta do índice elevado de desemprego, um lockdown afetaria seriamente a renda dos trabalhadores informais. Para os que têm o salário mensal garantido, o isolamento é férias. Opa! É home office! De outro lado, alguém sem renda fixa clama por medidas mais brandas que não prejudiquem seu labor.
Que fique claro aos governantes que usam esta pandemia para cunho político: o Brasil é formado em sua maioria por trabalhadores autônomos – uber, faxineiras, pedreiros e trabalhadores de pequenas e médias empresas. Portanto, é bom levar isso em conta antes de tomarem medidas que não sejam comprovadamente efetivas. Sem falar que a Operação ‘Covidão’ e o japonês da PF estão de olho nas dispensas de licitações.
Seja por incompetência, desconhecimento ou má-fé, muitos Estados não intervieram com antecedência e prudência o que a crise exigia e assim evitando seu agravamento. Observando os entes com maior número de vítimas, é fácil entender o porquê da morosidade: há um acúmulo de descaso com a coisa pública, todos antes da pandemia já possuíam um sistema de saúde pública em colapso. Portanto, a pandemia foi apenas o golpe de misericórdia para decretação do caos.
Como a população possui direitos máximos e deveres mínimos face ao Estado, reivindica-os sem dó. Compete ao Estado, e somente a ele, todos os esforços no combate à pandemia. (Em um país sério, o povo precisa cumprir com suas obrigações e não apenas jogar a culpa ao Estado). Sem aprofundar o tema, apenas para reflexão: em um país onde o povo tem liberdade de escolha, os impostos pagos para custear o SUS – não é de graça e é um monopólio – poderiam ser utilizados para pagar um excelente plano de saúde. Dessa forma, diminuir-se-ia a carga do Estado, que poderia realmente oferecer um serviço digno e o cidadão teria opções de outros atendimentos na saúde privada.
É necessário um amplo debate entre os setores envolvidos – governo, empresários e a população, para que através de esforços mútuos atinjam as medidas necessárias para superar esta pandemia. Os exemplos de pandemias anteriores ensinaram que não há uma formula única e mágica para se combater um problema dessa magnitude.
O sofrimento do povo já está no limite, o qual não quer saber qual medida mais eficiente ou teoricamente mais aplicável. O desejo imediato da população é a própria segurança e de seus próximos, exigindo do Estado que cumpra, durante a crise, o dever de casa, o qual deveria ter sido realizado antes do agravamento da pandemia. A população quer apenas o retorno do antigo “#sextou” para suas sextas-feiras e assim comemorar a vida!
Sérgio Augusto Costa é Advogado, especialista em Direito Penal, Processo Penal e Eleitoral.
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