
Por Felipe Campinas, do ATUAL
MANAUS – A DPE-AM (Defensoria Pública do Amazonas) apresentou ação civil pública, no dia 11 deste mês, para obrigar o Governo do Amazonas a fornecer comida a presos que aguardam audiência de custódia em delegacias de Polícia Civil. Segundo a Defensoria, os detidos dependem de familiares e até de cota de policiais para se alimentar e beber água. Às vezes, o jejum demora mais de um dia.
“É possível notar situações extremas, em que a privação de alimentos superou o período de 24 horas, como no caso de Leonardo Silva do Nascimento e Jefferson Cardoso Pereira (…) que foram presos por volta das 13h do dia 07/04/2023 e tiveram suas audiências de custódia realizadas às 17h do dia 08/04/2023 e, durante todo esse período, não receberam qualquer tipo de alimentação”, diz a defensora pública Josy Cristiane Lopes de Lima.
De acordo com a DPE, a falta de comida a presos na delegacia foi relatada em 43 audiências de custódia realizadas apenas neste ano, mas essa quantidade de casos é apenas uma parte do que, de fato, ocorre no estado.
“Esta não é a totalidade dos casos em que ocorreu a ausência do fornecimento de alimentação, sendo somente uma amostra qualitativa, acertadamente, registrada em audiência pela juíza Rosália Guimarães Sarmento [titular da 2ª Vara Especializada em Crimes de Uso e Tráfico de Entorpecentes]”, afirma a defensora Josy de Lima.
De acordo com a DPE, ao longo do ano passado, no decorrer da realização das audiências de custódia, constatou-se que, durante o intervalo entre a prisão e a apresentação do custodiado perante um juiz, os presos, “muitas vezes, encontravam-se em jejum de total alimentação e até mesmo de água”. A saída deles para o fórum ocorre entre 13h e 15h.
“Alguns, por longos períodos de privação de alimentos, outros que, apenas tinham se alimentado pois a família se dirigiu até a delegacia e levou alimentação”, diz a defensora Josy de Lima.
Ainda de acordo com a DPE, são comuns os relatos de hipoglicemia de jejum (quando os níveis de açúcar no sangue estão mais baixos que o normal), principalmente em pessoas mais vulneráveis como idosos, grávidas, portadores de doença crônica. E em alguns casos mais críticos, segundo Josy de Lima, a “situação faminta dos custodiados prejudicou a desenvoltura deles durante a audiência de custódia”.
A SSP-AM (Secretaria de Segurança Pública do Amazonas) confirmou que não fornece alimentos a presos. Conforme a secretaria, em alguns casos, quando o detido não tem família, policiais chegam a fazer cota para comprar comida.
Em ofício enviado à DPE, a secretaria informou que “não existe alimentação fornecida pela administração pública, e a mesma é providenciada pelos familiares dos detidos”. “Quando os detido não informam familiares a serem contatados, os policiais presentes no aludido plantão realizam cota e fornecem a alimentação a eles . Quanto ao fornecimento de água, quando a família não providencia, a mesma é cedida pela delegacia”, diz trecho do ofício.
Ainda conforme o documento, “não há horário fixo para fornecimento de água ou alimentação” e “não existe padrão no tipo de alimentação que os familiares levam, ou que os policiais adquirem na cota para fornecimento ao preso”.
A DPE classifica a situação de “degradante” e “desumana”. “Malgrado estarem sob a custódia do Estado, as pessoas detidas que aguardam a realização da audiência de custódia estão sofrendo uma restrição desarrazoada de seus direitos básicos, em relação ao direito à alimentação adequada, configurando-se verdadeiro ato degradante e desumano”, diz a defensora.
Procurada pela reportagem, a Polícia Civil do Amazonas informou que, até o momento, “desconhece a ação civil e quando notificada prestará os esclarecimentos necessários”.