Por Diogo Rocha, do ATUAL
MANAUS – O limite entre a liberdade de manifestação e o abuso de autoridade divide especialistas em Direito quando envolve políticos com mandatos eletivos. A lei proporciona entendimentos conforme o ato do agente público, seja na Constituição ou na Lei de Abuso de Autoridade.
O analista político Carlos Santiago afirma que um caso como, por exemplo, da deputada estadual Joana Darc (União Brasil-AM) e o imbróglio com o Ibama que envolve uma capivara, pode ter punições severas no âmbito político. Uma delas é a perda do mandato se for comprovado o abuso de autoridade e a quebra de decoro.
O Ibama atribui a parlamentar a divulgação de informações falsas sobre a validade de medicamentos no Cetas (Centro de Triagem de Animais Silvestres), na sede do instituto em Manaus, e de intimidar servidores.
“Conduta fora daquilo que a Constituição autoriza é cabível a perda do mandato ou uma punição de censura e outras formas de penalidades”, diz Santiago, que também é advogado. “Mas isso tudo vai depender muito dos depoimentos das pessoas que serão ouvidas, das imagens e fotografias”, completou.
Santiago explica que quando um político ultrapassa os limites da lei, a casa legislativa deve averiguar a conduta para esclarecer a opinião pública. Segundo ele, os vereadores e deputados (estaduais e federais) não podem ser omissos quando há evidências de abuso de autoridade.
“Quando o parlamento não age no sentido de conter a falta de decoro dos seus membros é complicado porque isso mostra que o parlamento não tem nenhum compromisso de defesa da democracia e da Constituição”, disse o analista.
Fora da competência
A advogada Ingrid Godinho, vice-presidente da Comissão de Direito Administrativo da OAB-AM, disse ao ATUAL que um político deve realizar fiscalizações dentro da competência do cargo. Por exemplo, vereadores devem se restringir às secretarias, instituições e órgãos municipais e deputados aos da esfera estadual.
Conforme Ingrid, um parlamentar pode, como qualquer cidadão e agindo por interesse público, solicitar informações e até denunciar um órgão público.
“Eu, por exemplo, como cidadã e advogada, requeiro informações [de um órgão público]. Isso posso fazer porque sou cidadã. O que eu não devo é a situação de fiscalização. Justamente por isso tem a questão da descentralização política para que cada um fiscalize o que é de sua competência”, explicou.
“A parte de fiscalização, de controle externo, não pode [por um político com mandato eletivo]. Cabe ao órgão específico [municipal, estadual ou federal]”, completou.
Para a advogada, o comportamento de um vereador e deputado estadual será tipificado como abuso de autoridade se for comprovado que o parlamentar excedeu sua competência ou cometeu desvio de finalidade.
“O abuso de autoridade e de poder está ligado ao interesse público. Se isso [a conduta de um político] desvia do interesse público pode caracterizar abuso de autoridade. Depende da forma como isso é feito e depende do porquê”, disse Ingrid Godinho.
Sem abuso
Na análise da também advogada Simone Rosado, especialista em Direito Público, a fiscalização de um órgão é permitida independente da esfera e compete a qualquer cidadão. Ela reforçou que a Lei de Acesso à Informação permite que todos, sejam políticos ou não, solicitem dados do poder público.
“Assim, ainda que não esteja dentro da função típica da função pública da autoridade de determinado ente público, fiscalizar a legalidade dos atos de órgãos de outros entes, nada impede que o faça enquanto cidadão. É importante que se destaque, contudo, que há casos em que, mesmo se tratando de entes públicos distintos, há esta função de fiscalização”, explicou.
E sobre o caso Filó, a advogada não viu abuso de autoridade na conduta da deputada. No dia 30 de abril, a parlamentar entrou, sem autorização, no Cetas e exigiu que agentes de segurança da unidade de tratamento e reabilitação a obedecessem.
“Entendo que o simples fato de adentrar a órgão público, por si, não configura abuso de poder, muito embora possa vir acompanhada de outras ações que possam configurar o mencionado crime”, afirmou Simone.
“Além disso, não há na Lei de Abuso de Autoridade (Lei Federal nº 13.869/2019) qualquer delito referente a ‘dar ordens’ [neste caso, em servidores do Ibama]”, finalizou.
O ATUAL procurou a deputada Joana Darc por meio da assessoria sobre sua ação no Ibama, mas não obteve resposta.