O projeto da Reforma da Previdência, a PEC 06/19, foi aprovado em primeiro turno nessa quarta-feira, 10, na Câmara dos Deputados. O Governo Federal, com o apoio de sua bancada, tem intenção de ainda esta semana votar nos dois turnos. O governo precisava de 308 votos favoráveis e teve 379, contra 131 da oposição. Do Amazonas, dos oito deputados federais, somente José Ricardo votou contra.
Ainda teve votação de um destaque (emenda) para tirar os professores da reforma e deixá-los nas regras atuais. Mas somente 265 votaram a favor, insuficiente para a aprovação. Precisava de 308. Os professores perderam.
Na verdade, o entendimento é que o governo Bolsonaro decidiu usar a velha tática do “toma lá, dá cá”, para aprovar o projeto, beneficiando os deputados de sua base política e os deputados do chamado “centrão”.
No Diário Oficial da União, do dia 8 de julho de 2019, saiu a lista de verbas que o governo está liberando para tentar aprovar o projeto da Reforma da Previdência. São centenas de parlamentares que serão beneficiados e estão sendo convencidos pela promessa da liberação desses recursos para suas bases políticas. Estou fora disso.
O valor total chega a R$ 1 bilhão para aprovar a ‘nova previdência’. O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, reconheceu que essa liberação é um “esforço pró-previdência”, uma prática imoral. Porém, foi descoberto que uma parte desses recursos, cerca de R$ 444 milhões, não está previsto no Orçamento, não tem autorização legislativa. Motivo de ações na Justiça. Será que os deputados receberão um “cheque sem fundo”?
E tem mais: para agradar a bancada ruralista, que é grande no Congresso Nacional, o governo conseguiu aprovar na comissão da reforma emenda que perdoa dívidas de latifundiários e grandes proprietários de terras, que chega a R$ 84 bilhões.
Continuo dizendo que o governo não precisaria dessa reforma. Diz que a arrecadação para a previdência é insuficiente para pagar as aposentadorias. Mas a verdade é que arrecadação para a seguridade social (previdência, assistência social e saúde), prevista na Constituição Federal, com recursos de impostos, vai aumentar quando melhorar a economia, aumentar o emprego. Mas o governo não tem nenhum plano para a economia. Lógico: sem emprego, não tem arrecadação. O governo deveria era cobrar as dívidas das grandes empresas em impostos e previdência, que alcançam algo em torno de R$ 900 bilhões.
O certo é que sobre o conteúdo do projeto da reforma não está havendo debate com a sociedade. A maioria das pessoas não sabe o que vai mudar na sua aposentadoria. Os grandes meios de comunicação, pagos pela publicidade do governo, nada explicam, não dizem qual realmente é o ganho das pessoas.
Na verdade, não haverá ganhos, só perdas. Para quem entra no mercado de trabalho, seja funcionário público ou privado, terá que ter uma idade de 65 anos e ter no mínimo 20 anos de contribuição, para recebe apenas 60% do valor da aposentadoria. Neste caso, milhões de pessoas ficarão de fora, pois devido o desemprego e a informalidade, não conseguem comprovar os 20 anos.
Se as pessoas quiserem receber 100% do valor, terão que contribuir 40 anos para a previdência. Vai ser para pouquíssimos.
Para quem está trabalhando hoje, haverá a transição. Todos terão que trabalhar vários anos a mais. Alguns terão que trabalhar o dobro de anos restantes. Ora, quem tem um emprego concursado, público, talvez consiga cumprir esse novo prazo. Mas 90% dos trabalhadores são da iniciativa privada. Não têm garantias de emprego. E se ficar desempregado com idade acima de 55 anos, dificilmente consegue emprego e recolhimento de previdência.
O novo cálculo do valor médio para a aposentadoria vai reduzir o valor final. Um exemplo ajuda a entender. Um porteiro que tenha 62 anos de idade e tenha 25 anos de contribuição. Pela regra atual, ele poderia estar recebendo R$ 2.112 para se aposentar. Mas pelas regras do projeto a ser votado na Câmara, o valor final seria de R$ 1.462. Uma perda de 31% do valor. Onde está o ganho com a Reforma da Previdência?
E tem mais: o projeto está deixando de fora os estados e municípios, e os militares. Não mexe nos privilégios do judiciário, do legislativo, do executivo, do Tribunal de Contas, do Ministério Público dos 26 estados e do Distrito Federal.
Estou admirado com o que acontece em Brasília. Um projeto que afeta a vida de milhões de brasileiros, e está havendo manifestações tímidas nesses dias de votação. Será que o governo conseguiu silenciar e enfraquecer os movimentos sociais e sindicais?
Por essa razão, não apoio esse projeto. Votei contra. O governo dá para os deputados que o apoiam R$ 1 bilhão para tirar da população R$ 1 trilhão. É injusto e prejudica a ampla maioria do povo brasileiro, principalmente, os que ganham menos.
José Ricardo Wendling é formado em Economia e em Direito. Pós-graduado em Gerência Financeira Empresarial e em Metodologia de Ensino Superior. Atuou como consultor econômico e professor universitário. Foi vereador de Manaus (2005 a 2010), deputado estadual (2011 a 2018) e deputado federal (2019 a 2022). Atualmente está concluindo mestrado em Estado, Governo e Políticas Públicas, pela escola Latina-Americana de Ciências Sociais.
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