Com um relato didático e, ao mesmo tempo dramático, o representante do poder legislativo, Serafim Correa, chamou a atenção do ministro do Desenvolvimento, Marcos Pereira, para as contribuições da Zona Franca de Manaus para o Brasil, nestes 50 anos, e para os gargalos de infraestrutura que o governo federal continua impondo à região, fazendo de conta que não é de sua responsabilidade. Entre eles, o entrave energético é aquele que mais tem causado danos aos investidores, trabalhadores e suas famílias, atingindo de morte a competitividade do modelo ZFM. O relato se deu no desfecho da última reunião do Conselho de Administração da Suframa (CAS), que encerrou 2016 com a aprovação de 26 projetos, investimentos de US$ 145,7 milhões, e a geração de discretos 398 empregos diretos no Polo Industrial de Manaus em três anos. No ar, a melancolia de um ano que assinala um saldo sinistro de quase 30 mil empregos perdidos. O setor produtivo tem experimentado neste meio século o prejuízo da precariedade energética, desde variações prejudiciais, e picos de energia. Vimos as promessas de grandes investimentos ser transformadas em frustrações monumentais. E, apesar dos subsídios sobre o valor da energia elétrica industrial por MWh, este item compromete drasticamente a competitividade da indústria local. Os tributos federais e estaduais incidentes na conta de energia elétrica das indústrias (PIS, COFINS, ICMS) correspondem a mais de 30,5% do valor da tarifa. Ao longo desses 50 anos, este é um gargalo emblemático que traduz o esplendor do descaso federal com a Amazônia. A hidrelétrica de Balbina, por exemplo, que hoje, no ápice de sua geração energética, consegue apenas abastecer um dos shopping-center mais antigos de Manaus, virou a maior tragédia socioambiental da história do Amazonas. Depois, veio a miragem energética do gasoduto Urucu-Manaus, “a nova matriz energética da região”. No traçado do gasoduto, onde o projeto previa a instalação de cabos de fibra ótica para partilha do sinal de internet, como medida de compensação para os municípios alcançados pela obra, os militares do programa Amazônia Conectada não encontraram um metro de fibra destinada a este fim. E, como sói acontecer, nada acontecerá. Por fim, a promessa enganosa e onerosa do Linhão de Tucuruí, que chegou como anúncio de integração no Sistema Nacional de Energia. E qual foi a vantagem da façanha para a competitividade do setor produtivo? Aumento de 40% em média no custo de energia para os usuários locais e frequentes interrupções no sistema de abastecimento. Ninguém merece!
Embargo de soluções
Enquanto isso, a política industrial predatória do governo federal para a região, encarnada no terrível GT-PPB, proíbe o PPB para produção de placas fotovoltaicas no PIM, polo industrial de Manaus, que poderiam abastecer como alternativa energética uma região extremamente privilegiada por precipitação energética solar. A Ciência há muito já atestou que nesta floresta tropical, nas imediações da linha do Equador, a Amazônia recebe uma insolação (número de horas de brilho do Sol) superior a 3000 horas por ano, com uma incidência média diária entre 4,5 a 6 kWh. A Alemanha recebe quase metade dessa insolação e já produz metade da energia que consome a partir dos painéis fotovoltaicos. Em respeito ao Acordo do Clima, a propósito, aquele país pretende gradualmente abandonar as energias poluentes em favor de energias renováveis, contando mesmo com a desativação das suas plantas nucleares em 2022. No Amazonas, soluções como utilização de painéis fotovoltaicos no toldo de embarcações para fabricar gelo, entre outras soluções energéticas, poderiam revolucionar o aproveitamento alimentar da pesca artesanal, que joga no lixo, ou no rio, 15 toneladas de peixe por safra por falta de energia.
Alternativas de energia renovável
Antes do motor a vapor, poucos sabem, os barcos regionais – canoas gigantes – que transportavam borracha e outros produtos do comércio com o Velho Mundo, eram movidos a velas, rio Amazonas abaixo, até Belém, ilustrando que até a alternativa eólica existe e tem potencial comercialmente válido na Amazônia. Aqui, incluindo a biomassa, a abundância energética é espetacular, mesmo assim persistimos em negar as potencialidades e a efetividade dos benefícios aí contidos. Por dezenas de anos, os gestores do sistema elétrico (praticamente os mesmos) insistiram na tecla de que a fonte solar é cara, portanto inviável economicamente, quando comparadas com as tradicionais. Cara para quem e sob qual ponto de vista? Há um Planejamento Estratégico Energético sério que possa respaldar essa ilação? A resposta é óbvia. O enigma da não utilização da energia solar fotovoltaica no país é que ela não tem apoio, estímulo nem neste, nem nos governos passados. A insistência do CIEAM em conquistar assento para o setor produtivo na Universidade do Estado do Amazonas passa por este pacto entre universidades e empresas para identificar e apoiar linhas de pesquisas que tratem dessas soluções de infraestrutura para os gargalos regionais.
Precisamos estimular nos centros regionais de pesquisa as soluções de transporte, energia e comunicação, adequados a Amazônia. A política energética vigente, quando foca suas prioridades na área da geração simplesmente relega a fonte energética fotovoltaica ao cálculo burro de um custo x benefício restrito, esquecendo o longo prazo da compensação. Por isso, por inépcia, ou interesses sombrios, em pleno século XXI, a contribuição da eletricidade solar na matriz elétrica brasileira é pífia, praticamente simbólica. Acredite se puder.
Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected]