O Brasil, país com grandes atributos naturais, possui uma cultura que alimenta a agressão contra a natureza. Trata-se de uma contradição tão grande quanto o fenômeno da desigualdade social, uma vez que nosso país, apesar da crise econômica que vive hoje, ainda figura entre os países mais ricos do mundo, possuindo taxas de pobreza alarmantes.
A natureza exuberante presente no Brasil constitui marca nacional enaltecida em símbolos como a bandeira nacional, o hino nacional e o brasão da república, mas a disposição para proteger e preservar estas riquezas naturais é visivelmente tênue. Não somos ecologicamente alfabetizados, chegando até a nos orgulhar de nossa aversão contra a natureza, nos esforçando, inclusive, para a sua depredação e aniquilamento.
Assimilamos com facilidade a oposição entre cultura e natureza, configurada no século XVIII, com a irrupção da revolução industrial. Com esta concepção, o ser humano não somente se divorciou da natureza, mas se virou contra ela, produzindo tecnologias ecologicamente agressivas e mortíferas. A entrada do capitalismo no território nacional aprofundou esta dinâmica ao fazer da depredação e da exploração irresponsável formas de lucro, para enriquecer as elites nacionais e internacionais.
Os modos de vida adaptados à natureza são perseguidos e tomados como empecilhos da modernidade e do desenvolvimento. Comunidades tradicionais de indígenas, ribeirinhas e camponesas, que elaboram suas culturas em diálogo respeitoso com a natureza são consideradas inimigas a serem dizimadas. Os movimentos sociais e lideranças que defendem a natureza são comumente perseguidos e assassinados, com a mais completa conivência e omissão da justiça oficial.
O atual governo federal reforça esta atitude na medida em que busca anistiar grileiros, incentivar invasão de terras indígenas e estimular as queimadas e o desmatamento. Além disso, o tal governo reduz investimos de projetos que incidem nas mudanças climáticas, na preservação da biodiversidade e na qualidade ambiental, trabalhando para desestruturar organismos de fiscalização na Amazônia e em todo o Brasil. Assim, ele dá sinal aos grandes destruidores (agronegociantes, latifundiários, mineradoras e garimpeiros ilegais), indicando que podem avançar nos seus intuitos ecocidas.
Tal desprezo pela natureza só pode ser comparado ao desprezo orientado contra as populações mais vulneráveis. Trata-se da aporofobia, o ódio ao pobre, ao fraco, ao necessitado, que gera violência e aprofunda a desigualdade social. É fácil concluir que tais aversões são fenômenos estreitamente relacionados. Não é por acaso que o Papa Francisco assegurou que não há uma crise social e outra ambiental. Para ele, existe uma única e complexa crise socioambiental (Francisco, 2015).
Mesmo em contexto desfavorável é necessário resistir, fazer parcerias e unir forças contra esta cultura da morte, que se materializa em grupos bem definidos dentro e fora do Brasil. Que as forças e energias que fluem e mantêm a vida se articulem e se sintonizem com os defensores da natureza, formando uma teia de proteção abrangente e atuante. Talvez assim possamos ver um dia a vida prevalecer sobre as suas ameaças.
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