Que tipo de reforma política o país precisa? Certamente não são certos projetos, inclusive já apresentados, maquiados com alguma inovação ou encenação para, na realidade, não alterar nem reformar coisa alguma. O país necessita urgentemente de uma reforma política conseqüente, que seja efetiva e não mero “jogo de cartas marcadas”.
Uma reforma política que aponte na direção certa e contribua para repor o país na rota do aprimoramento de sua própria experiência democrática. Não sei se precisa se constituir, como afirmam alguns, numa espécie de “exorcismo político”. Considero que não seja preciso chegar a tanto. Porém, se tiver de ser, que seja! Importa é que o país supere o ciclo da subpolítica no qual estacionou, redescubra a trilha pela busca da qualidade das instituições de mediação política e reinsira-se na dinâmica de desenvolvimento do regime democrático.
Infelizmente, nenhuma legislatura até aqui reformou e dificilmente as vindouras irão alterar as regras do sistema político-eleitoral, pois as últimas gerações e também as atuais elites políticas parlamentares se acomodaram com a viciada lógica do modelo de disputa eleitoral e se beneficiam dela, inclusive monetariamente.
Por esse motivo, dentre outros, não dá mais pra ficar esperando um parlamento ideal ser eleito para fazer as reformas fundamentais que o país precisa. Basta lembrar do processo para aprovação e implementação da lei da “ficha limpa”. Essa lei somente foi aprovada e efetivada, não porque o parlamento propriamente quis, mas por causa de ter sido convertida projeto de lei de iniciativa popular, o qual contou com grande clamor e mobilização popular. As reformas essenciais, salvo exceções que confirmam a regra, são assim. A sociedade é que tem de fazê-las e pressionar por elas, pois se for depender daqueles que deveriam representá-la nem sempre alçarão o resultado almejado.
Nesse sentido, é essencial que se efetivem reformas essenciais, mesmo que independentemente de nomes e dos grandes egos que integram o parlamento. O interesse do país e de seus cidadãos deve vir antes do mero interesse daqueles que dizem ser seus representantes. O papel do direito que visa justiça é criar barreiras e dificuldades às corrupções e esquemas perversos, com vista a promover a liberdade com desenvolvimento humano e social.
O direito não deve ser tecnocrático ao ponto de se alienar da realidade social e institucional na qual estão os cidadãos inseridos. Só faz sentido o direito, inclusive o eleitoral, quando o bom direito, o direito na perspectiva da justiça e da liberdade, rege a sociedade. No mais, o ordenamento de leis não passa de mero formalismo jurídico e de legalismo estéril. O direito só faz sentido na perspectiva da justiça, inclusive para assegurar a igualdade de condições para a disputa eleitoral. Ainda mais considerando que os recursos para o fundo partidário foram ampliados. Por isso, dificultar as coisas pra quem vive de esquemas escusos com a máquina pública é legítimo e constitui tarefa do ordenamento jurídico que almeja a cidadania e o desenvolvimento.
O problema não são apenas os atuais atores ou figuras da cena política, mas principalmente são as regras do jogo que condicionam o comportamento político. Se não mudar as regras efetivamente, desde o financiamento de campanhas eleitorais à democracia nos partidos, não haverá solução efetiva, pouco importando a figura política ou qualquer candidato que se apresente como “salvador da pátria”. Por exemplo, não é defensável, pós a operação “lava jato”, o direito de empresas e empreiteiras patrocinarem candidaturas eletivas para cargos públicos de representação ou mediação política. Isso tem instituído uma forma de suborno “lícito”, historicamente operacionalizado por meio da transferência de recursos públicos a empreiteiras e empresas privadas via contratos administrativos superfaturados ou não com a administração pública. Tal procedimento tem alimentado uma rede de corrupção e de fraudes que está levando o país a se perder cívica e economicamente. Não basta mudar apenas “nomes”. É preciso revisar as regras do jogo. Do contrário, por mais que se troque o nome, prosseguir-se-á muito frequentemente com práticas viciadas e de corrupção eleitoral-política-administrativa sistêmica.
Mesmo que práticas viciadas e corrompidas possam vir acorrer, é preciso revisar as regras estruturais da disputa da mediação política, a fim de que tais práticas dificultem as ações de quem vive de esquemas que começam com a patrimonialização dos mandatos e se estendem aos contratos administrativos com as fraudes e a corrupção de agentes públicos.
É preciso ter a ousadia de aprimorar a experiência democrática e ir além desse velho joguete que está em vigor na sociedade, ainda que para tanto tenha a reforma política de proceder a um verdadeiro “exorcismo no meio político” do país.
Afinal, não é possível continuar convivendo, por exemplo, com o atual modelo de financiamento de campanhas eleitorais, que converte as supostas “doações” em maneiras lícitas de aliciamento, objetivando futura predominância de interesses lobistas sobre os da sociedade brasileira e seu povo.
A reforma política deve ser efetivada o quanto antes, sobretudo como relação a como se “patrocina” as campanhas eleitorais. Eleição não é pra ser corredor de dinheiro, é pra ser um momento de exercício de cidadania das pessoas. Não mera jogatina. É preciso desidentificar dinheiro de eleições e, com isso, acabar com o interesse pela política por parte de elementos mal intencionados em participar do processo, desde o nascedouro. O aumento das verbas para o fundo partidário, inclusive já efetuado, autoriza esse apartamento do poder econômico empresarial e particular.
Todos esses aspectos evidenciam a necessidade de realizar uma efetiva reforma política, inclusive o quanto antes, vez que as leis que regem a disputa por cargos públicos eletivos para o exercício da representação popular (câmara) ou do ente estatal (senado) condicionam o comportamento político. É uma necessidade mudar as regras do processo político-eleitoral e de suas instituições de mediação política na oportunidade demandada pela sociedade, podendo-se contar ou não com a atual legislatura. É o interesse público e coletivo que tem de prevalecer sobre os interesses de parcela de beneficiados particulares, representantes ou não da sociedade.
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