
Por Jullie Pereira, da Redação
MANAUS – O MPC (Ministério Público de Contas) representou contra o secretário de Saúde do Amazonas, Marcellus Campêlo, preso na quarta fase da Operação Sangria, por ocupar dois cargos no Governo do Amazonas: um na Secretaria de Saúde e outro como Coordenador Executivo da UGPE (Unidade Gestora de Projetos Especiais).
A representação é assinada pelo procurador Ruy Marcelo de Mendonça Alencar e foi apresentado ao TCE (Tribunal de Contas do Estado) no dia 24 de maio. Alencar pede que ele seja exonerado de um dos cargos.
Segundo o documento, o MPC ficou ciente da ocupação dupla dos cargos e solicitou esclarecimentos do secretário, que confirmou estar nos dois postos, mas alegou ser remunerado apenas pela função na secretaria
O artigo 37 da Constituição de 1988 proíbe o acúmulo de cargos públicos, exceto em casos de: dois cargos de professores; um cargo de professor e outro técnico; empregos privativos de profissionais da saúde.
“A opção remuneratória não altera a exegese porque o fim da norma é claramente de impor regime de dedicação em tempo integral ou mesmo exclusiva, ante a elevada responsabilidade inerente ao cargo como se vê na espécie”, diz o procurador.
Na estrutura organizacional da UGPE o coordenador executivo é o mais alto cargo da unidade e auxilia o secretário de Infraestrutura.
Campêlo é responsável por comandar seis setores que envolvem o financeiro, engenharia, planejamento, projetos ambientais, projetos sociais e setor jurídico. Ele está na UGPE desde o início do governo de Wilson Lima, em 2019, e foi indicado por este.
O procurador considera perigoso prestar os dois serviços no momento em que o Amazonas é atingido pela pandemia e solicita que o secretário seja afastado da unidade. Apesar de preso, Campêlo continua oficialmente em ambas as secretarias.
“Há de se considerar o interesse público em afastar o elevado grau de nocividade no acúmulo de cargos em vista do risco iminente da terceira onda pandêmica no Estado, pois se reclama a alta performance da gestão da SES”, diz o procurador.
O acúmulo de cargos no serviço público por ser punido com multa de até R$ 14 mil. O TCE ainda não se manifestou sobre a representação do MPC.
Em nota, a Secretaria de Sáude sustentou que não há ilegalidades. “O secretário de Estado de Saúde, Marcellus Campêlo, já se posicionou sobre o assunto em resposta ao Ministério Público de Contas (MPC), alegando que acumula a função, mas não acumula remuneração, já que optou por apenas uma delas. Portanto, não há ilegalidade no ato. O próprio texto constitucional diz que é vedada apenas a acumulação ‘remunerada’ de cargos públicos”, afirmou a pasta.
Leia o documento do MPC completo:
Interessante…
O dispositivo constitucional a que o procurador de contas faz referência veda o acúmulo *remunerado* de cargos. Portanto, apenas haveria irregularidades se houvesse o acúmulo de salários, o que não é o caso.
Na verdade, para o Estado, é uma economia. Pagam apenas um salário para um gestor acumular duas funções.
A leitura do “pedido de representação do MPC” chama a atenção para outros detalhes. Primeiro, ao que consta, o pedido deverá ser deliberado pelo TCE, portanto, há equívoco por parte da reportagem ao tratar a representação como aceita.
Segundo, a Jurisprudência colacionada para corroborar o “ilícito” visto pelo procurador faz referência ao acúmulo de um cargo público (cargo de confiança) e um cargo efetivo (que podemos chamar vulgarmente de concursado, para exemplificar). É um caso em que o cidadão recebia, de fato, indevidamente, as duas remunerações, e deveria ter se licenciado se sua função efetiva ao assumir o cargo público, optando pela remuneração que melhor lhe conviesse.
A jurisprudência em nada tem a ver com o caso em tela, visto que ambos os cargos no caso em análise, Secretário de Saúde e Coordenador Executivo da UGPE, são cargos de confiança de livre nomeação e exoneração à qualquer tempo, à critério do Governador do Estado. Nenhum dos dois é efetivo. Não há, portanto, obrigação de se desvincular (licenciar-se) de um para exercer o outro, desde que o gestor tenha capacidade para exercer os dois cargos. Compete ao governador avaliar esta capacidade no ato da nomeação, assim como avaliar os resultados, e ao nomeado aceitar trabalhar o dobro por apenas um salário.
A “sugestão” do MPC (que um dos cargos seja ocupado por outra pessoa) é deveras peculiar, posto que na prática, teria o efeito de aumentar o gasto público com salários.
Lamento, como cidadão, um órgão de controle sugerindo aumento de gastos.
Lamento igualmente o nível ridículo da peça técnica, que fundamenta o pedido com base em jurisprudência que em nada se amolda ao caso concreto.
Um erro desta natureza, vindo de um conceituado membro do Ministério Público de Contas, leva a uma inevitável e triste reflexão…
Estaria o nobre procurador de contas por deveras sobrecarregado em suas funções, talvez por estar acumulando seus ofícios com outro ofício não remunerado (espero) de perseguição casuística de pessoas para gerar factóides?
Como cidadão, mantenho a esperança na seriedade das instituições e espero se tratar apenas de um mero equívoco, que logo será retratado, seja pelo próprio procurador, de quem seria muito digno reconhecer o erro, seja pela corte de contas, ao analisar o pedido de representação, o que seria constrangedor para o signatário do pedido.