EDITORIAL
MANAUS – Em 2021, uma Emenda à Constituição Federal (Emenda 109/2021) aprovada e promulgada pelo Congresso Nacional tentava por fim a uma prática abusiva e absurda de gasto do dinheiro público pelos poderes da República Federativa Brasileira. Tentava, porque o que o brasileiro assiste, desde então, são arranjos para burlar a lei máxima do país.
A Emenda 109 trata de diversos temas, mas o que interessa aqui é a mudança no Artigo 168 da Constituição, acrescentando dois parágrafos sobre a administração do duodécimo (transferência em 12 parcelas aos poderes Judiciário, Legislativo, Ministério Público e Defensoria Pública).
Eis os parágrafos acrescentados:
“§ 1º É vedada a transferência a fundos de recursos financeiros oriundos de repasses duodecimais.
§ 2º O saldo financeiro decorrente dos recursos entregues na forma do caput deste artigo deve ser restituído ao caixa único do Tesouro do ente federativo, ou terá seu valor deduzido das primeiras parcelas duodecimais do exercício seguinte.”
A intenção do legislador, com esta emenda, era garantir que o dinheiro excedente transferido a esses poderes e não gasto dentro da previsão orçamentária anual voltasse para os cofres do Tesouro municipal, estadual ou da União, conforme o caso.
Antes dessa emenda, esses poderes esbanjavam dinheiro quando ocorria aumento de arrecadação, porque o valor do duodécimo é calculado de acordo com a arrecadação de cada ente federativo.
No Amazonas, houve diversos casos de gastos desnecessários, como construção de prédios, ou concessão de benefícios não previstos no orçamento.
Em tempos passados recentes, no entanto, alguns desses poderes choravam de pires na mão alegando insuficiência de recursos públicos para o exercício fiscal. Não foram poucas as vezes que o Poder Legislativo mudou os percentuais de duodécimos para atender às reivindicações de dirigentes que relatavam aperto financeiro.
Nos tempos de pandemia, no entanto, a arrecadação de alguns entes federativos surpreendeu, apesar da crise financeira provocada pela doença. Com o excesso de arrecadação, começou a sobrar dinheiro em caixa dos poderes.
O legislador, percebendo que o dinheiro estava sendo usado para fins não previstos no orçamento ou para fazer caixa de um ano para o outro, estabeleceu critérios para que o dinheiro do contribuinte voltasse aos cofres do Tesouro e fosse aplicado em políticas públicas mais urgentes e essenciais.
Na prática, a emenda constitucional se tornou letra morta. Já vimos nos parlamentos presidentes querendo “desovar” os recursos públicos, e para isso inventam despesas como construção de prédios, aluguel de carros, aumento de benefícios aos parlamentares entre outros.
No ano passado, o Tribunal de Justiça do Amazonas presenteou seus magistrados com o pagamento de R$ 300 mil para cada um no final do ano para abater uma dívida que se tornou impagável, apesar das centenas de milhões de reais já destinados a ela, a famigerada PAE.
Neste ano, o mesmo tribunal anunciou o pagamento de abono de R$ 20 mil aos servidores, certamente incluídos os magistrados, também para evitar que o dinheiro repassado ao tribunal pelo Tesouro estadual volte para o Estado.
A justificativa do TJAM é de que o abono é uma espécie de premiação pelo desempenho do tribunal nas suas tarefas diárias. No entanto, para que haja esse desempenho, o contribuinte já paga e paga um valor muito alto.
Desempenhar bem o trabalho, antes de ser um mérito digno de prêmio, é uma obrigação de todo o serviço público. É o mínimo que o Tribunal de Justiça deveria entregar à sociedade.