BRASÍLIA – O procurador da República Deltan Martinazzo Dallagnol, coordenador da força-tarefa do Ministério Público na Operação Lava Jato, disse na manhã desta sexta-feira, 20, que a punição da corrupção no País é “em regra, uma piada de mau gosto”. O procurador defende o aumento da pena para o crime de mínimo de quatro anos e máximo de 25. Hoje, a punição varia de dois a 12 anos de prisão. Pela proposta, também passa a ser hediondo o crime de corrupção quando valor for superior a 100 salários mínimos – aproximadamente R$ 80 mil.
Nesta sexta-feira, o Ministério Público Federal apresentou dez medidas para enfrentamento da corrupção no País. A ideia é apresentar anteprojetos de lei ao Congresso Nacional sobre os temas propostos. Uma das sugestões é aumentar penas também de tipos penais relacionados à corrupção, como estelionato.
Para Dallagnol, o número de delações premiadas deve aumentar com o aumento da pena de corrupção. “À medida que você aumenta as penas, aumenta as buscas da defesa por soluções alternativas”, disse o procurador, que conduz as investigações no Paraná, que já contaram com delação premiada do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, do doleiro Alberto Youssef, do ex-gerente da estatal Pedro Barusco e de executivos de empresas como a Camargo Corrêa e Toyo Setal, além do operador Shinko Nakandakari.
O anteprojeto de lei que o Ministério Público Federal vai enviar ao Congresso prevê penas maiores para a corrupção e gradação de acordo com o valor desviado. A proposta é que para prejuízos de até R$ 78 mil, a pena de corrupção ativa e passiva varie de 4 a 12 anos. Nos casos de desvio entre R$ 78,8 mil e R$ 788 mil, a pena seria de 7 a 15 anos. Quando o prejuízo for superior a R$ 788 mil e inferior a R$ 7,8 milhões, a pena seria de 10 a 18 anos. Já para casos de mais de R$ 7,8 milhões, a punição seria máxima: entre 12 e 25 anos de prisão.
Também são previstos aumentos e gradações nos casos de peculato, inserção de dados falsos em sistema de informações, concussão, estelionato e excesso de exação qualificada.
“A pena começa com dois anos, depois é substituída por restritiva de direitos, depois extinta com decreto de indulto natalino”, criticou Dallagnol, sobre o sistema atual, ao defender proposta da procuradoria para aumentar as penas de corrupção. No início de março, o ex-presidente do PT José Genoino, condenado no processo do mensalão, foi beneficiado pelo indulto natalino e teve extinta a pena imposta pelo Supremo Tribunal Federal por corrupção ativa. Todo o núcleo político do mensalão cumpre atualmente pena em regime aberto, no qual podem permanecer em casa.
Uma das intenções com o aumento da pena é evitar que a prisão seja substituída por outras punições, restritivas de direitos. Isso porque réus de crimes de colarinho branco normalmente são primários e por isso as penas ficam próximas ao mínimo legal. Os procuradores também desejam evitar a prescrição dos crimes.
Dallagnol menciona que a corrupção é “semelhante” ao latrocínio – roubo seguido de morte -, pois há desvio de altos valores e “pessoas sofrendo consequências como morte inclusive, por falta de hospitais, segurança e saneamento básico”.
Complementares
Os procuradores da República que anunciaram as medidas do MPF para combate à corrupção avaliam que não há divergências com as propostas do governo, apresentadas há dois dias, mas apenas “complementos”. “Os trabalhos foram realizados pelas instituições em caráter separado”, disse o subprocurador-geral da República Nicolao Dino. “O fato de haver coincidências pelo Executivo revela um dado positivo: as instituições estão pensando em um mesmo sentido e buscando mecanismos para aprimorar o funcionamento do Estado”,
Segundo ele, as propostas “não atuam numa perspectiva de exclusão, mas de complementariedade”. O procurador preferiu não fazer avaliações sobre o projeto apresentado pelo Poder Executivo na última quarta-feira.
Leniência
Entre as propostas do Ministério Público está a leniência como forma de investigação nos casos de improbidade administrativa. Entre as propostas do governo, a presidente Dilma Rousseff editou decreto que regulamenta a Lei Anticorrupção, com leniência prevista no âmbito administrativo, a ser feita pela Controladoria-Geral da União (CGU).
Os procuradores esclarecem que as duas leniências são em âmbitos diferentes. A feita pelo CGU, é administrativa, enquanto a prevista pelo MP é instrumento de investigação – uma colaboração premiada nos casos de improbidade administrativa.
“Confisco alargado”
Entre as propostas está o “confisco alargado”, pelo qual é possível confiscar o patrimônio total que uma pessoa não consegue comprovar como lícito, nos casos de crimes considerados graves, como tráfico de drogas e corrupção. A intenção é por em prática a máxima de que “o crime não compensa”.
O procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, comentou que, sem o confisco alargado, se o ex-diretor Paulo Roberto Costa não tivesse concordado em colaborar com as investigações, seria “muito difícil” promover a recuperação dos valores desviados no esquema de corrupção na Petrobras.
Os procuradores defendem ainda mudança no sistema de recursos na esfera penal – com fim da prescrição retroativa e restrição do uso de habeas corpus apenas para situações em que há discussões sobre liberdade de locomoção do indivíduo. “Se não mudarmos o sistema recursal e prescricional, não vamos conseguir resultados”, disse o procurador. “No caso Lava Jato, temos mais de 165 habeas corpus, em que, em cada um deles, a parte tem seis chances no Judiciário”, disse Dallagnol.
Preventiva
Há uma proposta ainda para permitir a prisão preventiva que permita a recuperação de dinheiro desviado, para “evitar a dissipação do dinheiro”. O procurador cita o caso do ex-diretor Renato Duque, preso novamente de forma preventiva no âmbito da Lava Jato após os investigadores constatarem movimentações em contas no exterior.
(Estadão Conteúdo/ATUAL)