Por Feifiane Ramos, do ATUAL
MANAUS — O lixo urbano despejado nos igarapés de Manaus persiste há anos. Historicamente, esses locais nunca foram preservados e respeitados, firma Sandoval Alves Rocha, doutor em ciências sociais e pesquisador da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica). Ele atribui a poluição dos igarapés em Manaus à falta de políticas públicas eficazes.
“Os igarapés, historicamente falando, nunca foram respeitados, nunca foram preservados. Ao contrário, os igarapés, na história da cidade, sempre foram tidos como algo que atrapalhava o crescimento, que atrapalhava o desenvolvimento. Então, sempre foram tidos como algo a ser eliminado, a ser exterminado”, afirma Sandoval.
A limpeza e manejo dos igarapés estão incluídas no novo Plano Municipal de Saneamento Básico, que tem quatro diretrizes: abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, e drenagem e manejo das águas pluviais urbanas.
Segundo o especialista, a falta de cuidado com os igarapés começa com a administração pública, que não se preocupa em preservar os córregos, atualmente poluídos e ocupados por construções irregulares.
Sandoval diz que muitos condomínios canalizam os esgotos para os igarapés, sem que o estado imponha regras e limites ao mercado imobiliário e à gestão do território urbano, dificultando a responsabilização.
“E aí permite essa série de crimes ambientais, né? Se o estado e os administradores não cuidam, não têm a menor sensibilidade para com os igarapés, é difícil a gente simplesmente responsabilizar minimamente no sentido de que o governo é que tem recursos, o governo é que tem os poderes de organizar as residências, organizar o território bom e não o faz, de fato, criando ou implantado uma política pública adequada, inclusive uma política ambiental, de educação ambiental”, disse.
Sandoval diz que há uma ausência de medidas que incentivem a população a criar hábitos mais positivos em relação à conscientização sobre a problemática. Ele ressalta que a falta de coletores de resíduos de lixo nas ruas impossibilita o descarte adequado dos resíduos.
Gestão
Sandoval Alves acrescenta que o problema da poluição nos igarapés está relacionado à forma como a cidade foi gerida e ao crescimento desordenado. “Se essa forma é inadequada, isso vai ocasionando consequências negativas, desastrosas para os corpos hídricos, para a população, para as florestas”.
“A questão dos igarapés, da preservação do igarapé, não pode estar desconectada, por exemplo, da questão do deslocamento urbano, dos transportes urbanos, da moradia urbana e da arborização, assim como do saneamento ambiental”, diz. O especialista defende uma gestão participativa, em que a população seja chamada para opinar e trazer soluções concretas, compreendendo os principais desafios enfrentados no cotidiano.
“Não podemos tomar os igarapés como um aspecto isolado da cidade, e aí então mais uma vez precisamos de democracia, mais uma vez precisamos de que o governo ouça, escute a população. Então, precisamos de melhores gestores, de políticas públicas participativas”, opina.
Métodos
Sandoval destaca que é possível combinar tecnologias com método e técnica para a limpeza pública dos igarapés sem causar danos. “A primeira é a própria questão do sistema de esgotamento sanitário. A gente pensa que não é inovador, mas para a nossa cidade o esgotamento sanitário ainda é algo extremamente inovador. A gente sabe que só 25% da cidade tem o esgotamento sanitário, então a empresa que foi contratada para isso não faz o trabalho para o qual foi contratada, não atinge as metas estabelecidas no plano de metas, não há uma fiscalização adequada, não há uma pressão adequada da prefeitura”, disse.
Outro ponto levantado por Sandoval é o modo de tratar os lixões e aterros sanitários em Manaus. Ele afirma haver um “sentido civilizatório” na existência dos lixões como são atualmente, que estão matando os igarapés.
“Como já foi dito, outro elemento também é incentivar as associações, a questão da reciclagem. Dos resíduos, né? Isso aí é necessário fazer como política pública, mas o governo e a prefeitura têm dado passos muito tímidos em relação a isso. Então, de fato, existem técnicas, existem métodos, o que falta é interesse político, interesse em fazer os investimentos necessários”, conclui.