
Por Iolanda Ventura, da Redação
MANAUS – A preferência de venezuelanos por Manaus está ligada à posição estratégica da capital e ao grande potencial para a integração socioeconômica de refugiados e migrantes. É o que afirma Jaqueline Almeida, coordenadora do escritório da OIM (Organização Internacional para as Migrações) em Manaus, agência da ONU (Organização das Nações Unidas).
Monitoramento do fluxo da população venezuelana feito pela OIM mostrou que a capital amazonense é uma das cidades mais procuradas pelos migrantes. O país faz fronteira com o Brasil nos estados do Amazonas e Roraima.
A pesquisa mostra que quase a totalidade dos entrevistados (94%) expressou intenção de permanecer no Brasil e menos de 6% informaram o desejo de retornar à Venezuela ou ir para outros países.
Dos entrevistados que expressaram intenção de permanecer no Brasil, 73% declararam ter Manaus como destino final. No que se refere aos destinos dentro do Brasil, foram citados mais de 20, sendo os principais Curitiba (PR) e Boa Vista (RR).
A OIM consultou 614 venezuelanos, que representam com seus familiares uma amostra de 1.109 pessoas, distribuídas entre Manaus, Presidente Figueiredo e Iranduba. Os dados foram reunidos em outubro e novembro de 2021.
“Manaus, capital do Amazonas, é um local estratégico e com grande potencial para a integração socioeconômica de refugiados e migrantes. O município de Presidente Figueiredo faz parte da rota para acessar a capital, e Iranduba é uma área em crescente desenvolvimento, ambos pertencentes a região metropolitana de Manaus”, disse Jaqueline Almeida.
Perfil
As entrevistas também incluíram informações sobre escolaridade, trabalho e renda, moradia, aspectos sobre proteção, saúde e questões específicas sobre a Covid-19 e seus impactos.
A maioria é parda, solteira, com idade entre 18 e 30 anos. Entre os entrevistados também há 26 pessoas que se identificam como LGBTQI+ e 47 pessoas que se reconhecem como indígenas.
A maioria dos entrevistados tem nível de escolaridade secundário [equivalente o nível médio no Brasil] e possuem autorização de residência no Brasil.

Trabalho
Quanto à situação laboral e econômica, a maioria se encontrava empregada na Venezuela (33%), enquanto no Brasil a maior parte está desempregada (39%) ou trabalhando de forma independente (seja como autônomos ou informais) (34%).
O monitoramento registrou maior incidência de desemprego entre as mulheres (56%) e maior participação de homens entre os empregados (38%) e independentes (37%). Essa situação desvantajosa para as mulheres no mercado de trabalho foi igualmente observada quando essa parcela da população ainda estava na Venezuela.
De acordo com a OIM, 80% das vagas ocupadas pelos entrevistados estiveram concentradas em apenas cinco setores de atividade econômica: comércio (48%), serviço público (11%), atividade de beleza (11%), construção civil (6%) e transporte (4%).
A presença dos homens foi majoritária nos cinco setores principais. Os setores de atividade que apresentaram participação majoritária das mulheres foram: serviços domésticos (86%) e saúde (75%). Estes dois setores estão incorporados na categoria “Outros”.

Entre os que informaram estar trabalhando no momento da entrevista, 58% recebiam menos de um salário-mínimo por mês. E 97% informaram receber até dois salários-mínimos por mês.
Questionada se há dados sobre exploração no trabalho, Jaqueline Almeida informou que não há informação sobre isso.
Alerta feito pelo pelas Defensorias Públicas do Estado e da União, MPF (Ministério Público Federal), Acnur (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados), OIM e Pastoral do Migrante em dezembro de 2021, sobre aumento nas solicitações de regularização migratória para residência no Brasil em São Gabriel da Cachoeira (a 852 quilômetros de Manaus) chegou a citar o problema da exploração laboral.
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Impactos da pandemia
Em relação aos impactos da pandemia, 57% relataram piora nas condições de trabalho, 48% nos recursos econômicos e 44% na comida.
Quanto à renda, 79% responderam que houve agravamento com o início da pandemia da Covid-19. Destes, 48% informaram que as vendas, pedidos ou clientes diminuíram, seguido por perda de trabalho (17%) e redução de salário (14%).
Discriminação
“Sobre a questão de discriminação, 22% dos entrevistados informaram já ter sofrido discriminação”, afirmou Jaqueline Almeida.
O valor percentual é ligeiramente superior entre as mulheres (24%) em relação aos homens (21%). O principal motivo da discriminação é a nacionalidade, sendo registrado em 97% das mulheres e em 95% dos homens.
Saúde

Além do apoio financeiro do Escritório de População, Refugiados e Migração do Departamento de Estado dos Estados Unidos, a coordenadora do escritório da OIM em Manaus explica que a atuação da organização tem parceria de com o Poder Público local e outros organismos internacionais e da sociedade civil.
“Podemos citar, em parceria com a Semsa (Secretaria Municipal de Saúde), atividades de esclarecimento e acesso à vacinação entre refugiados e migrantes. Com a Semsa também são ofertadas consultas médicas e de enfermagem em locais com grande presença de venezuelanos, como a rodoviária, abrigos, projetos sociais, etc”, disse.
O levantamento mostra que do total de entrevistados, 90% afirmaram procurar postos de saúde ou hospitais quando têm algum problema de saúde. Houve outros serviços de saúde, mas com baixa procura: farmácias (5%), postos de atendimentos da rodoviária (2%) e medicina particular (1%).
Observou-se que 34% dos entrevistados precisaram de algum tipo de tratamento médico ou serviço de saúde nos últimos três meses. Destes, 15% tiveram alguma dificuldade de acesso aos cuidados médicos.
Dentre os que relatam ter tido alguma dificuldade com acesso aos cuidados médicos, destacam-se: elevado custo dos serviços ou medicamentos (29%), os centros de tratamentos são muitos longes (24%), restrições de movimentação e políticas de distanciamento social devido à Covid-19 (17%), por medo da Covid-19 (17%) e falta de documentação (12%).