Da Redação
MANAUS – O uso de equipamentos como balsas, dragas, tratores, e escavadeiras na lavra de ouro disfarçam a mineração como garimpo rudimentar na Amazônia, diz o MPF (Ministério Público Federal) no manual ‘Mineração Ilegal de Ouro na Amazônia: Marcos Jurídicos e Questões Controversas’. Conforme o MPF, trata-se de equipamentos cujo custo pode variar de R$ 60 mil a R$ 2 milhões de reais.
O órgão cita como exemplo a Operação Warari Koxi deflagrada em 2015 no estado de Roraima. A infraestrutura incluía balsas extrativas de ouro no Rio Uraricoera, mantidas na Terra Indígena Yanomami por ‘balseiros’ que, apenas para construção e preparo técnico das embarcações, gastavam entre R$ 60 e R$ 100 mil.
“Cada balseiro empregava, para a atividade extrativa, ali ilegal, um grupo de até doze pessoas, entre as quais constavam mergulhadores, cozinheiros, faxineiros. Cuidava-se, assim, claramente de atividade empresarial, tal como definida pelo Código Civil: atividade econômica organizada para a produção e circulação de bens (art. 966, CC), e não de atividade que, por suas características de tradicionalidade, mereceria, caso fosse possível sua regularização, tratamento legislativo especial, diferenciado da mineração industrial prevista no Código de Mineração de 1967”, diz o MPF.
Além de expor exemplos práticos, o manual pretende ser um guia para diagnosticar as falhas legislativas que fazem dessa atividade econômica um terreno fértil para a criminalidade. A publicação foi editada pela Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do Ministério Público Federal (4CCR/MPF).
O manual alerta que o garimpeiro do século 21 não é mais aquele profissional que percorre leitos de rio com picareta e bateia, em pepitas. Hoje a extração de ouro na Amazônia é feita com maquinário pesado, de alto custo e responsável por grande impacto ambiental e socioambiental. A situação é agravada pela legislação deficiente que prejudica o combate a esse tipo de crime ambiental, bem como fragiliza a proteção aos povos tradicionais impactados pela atividade irregular.
O manual de atuação é fruto de análises empreendidas por procuradores da República integrantes da Força-Tarefa Amazônia e por procuradores do Trabalho com atuação na temática e experiência em combate à mineração ilegal de ouro na Amazônia, em estados como Pará, Amazonas e Amapá. A elaboração do material levou em consideração experiências locais de profissionais distintos, como forma de facilitar a compreensão da intrincada legislação que versa sobre o tema e seus efeitos colaterais.
Falta de integração
O MPF atesta que, até de forma aparentemente proposital, os mecanismos de fiscalização e controle não conversam. “Não existem bases estruturadas e informati-zadas para o cruzamento dos dados colhidos pela Agência Nacional de Mineração, pelo Banco Central do Brasil, pela Receita Federal do Brasil, bem como pelos órgãos ambientais”, diz o documento.
A coordenadora da FT Amazônia, procuradora da República Ana Carolina Haliuc, disse que o estado não tem controle das reservas de ouro e nem da circulação desse minério, que vai se esvaindo do país, seja por meio da exportação para outros países seja na confecção de joias.
Ela reforça que o manual busca auxiliar os membros a entenderem todo esse contexto normativo e qualificar a atuação dos procuradores nas esferas cível e criminal, contribuindo para o aperfeiçoamento do quadro normativo acerca da circulação do ouro. “Nossa expectativa é que isso represente um salto de qualidade na nossa atuação nessa temática”, ponderou.