Por Iolanda Ventura, da Redação
MANAUS – Mesmo com as duas doses da vacina contra a Covid-19, os cuidados preventivos devem ser mantidos, afirma Heliana Feijó, médica e professora de Saúde Pública no curso de Medicina da Ufam (Universidade Federal do Amazonas). Dois casos são relatados nesta reportagem.
A médica afirma que boa parte da população de Manaus ainda não tomou a segunda dose e nem a primeira. Segundo ela, o imunizante evita o avanço da doença para o estado mais grave, mas não impede que a contaminação e transmissão ocorram.
“Todo mundo pensa que depois que toma a vacina, as duas doses, pode sair sem máscara, pode jogar a máscara fora, pode não lavar as mãos. Isso não é verdade. Você toma a vacina e continua a fazer a prevenção”, diz.
Solange Dourado, infectologista da FMT (Fundação de Medicina Tropical de Manaus), reforça a orientação. “O vírus ainda circula em nosso meio. Até que tenhamos alcançado altos níveis de cobertura vacinal, devemos nos manter alertas e atentos às demais medidas protetivas para evitar contaminação pelo vírus”, diz.
De acordo com Heliana, a vacina só é completa com as duas doses, e a proteção completa só ocorre 15 dias depois de a pessoa ser vacinada. E mesmo assim, há a possibilidade de contrair a doença. É o caso do médico Adalberto Bonfim, ginecologista obstetra e e amigo da professora.
Bonfim, de 63 anos, estava em atividade e já tomou as duas doses da vacina. Segundo a médica, além do fator de risco da idade, o colega tem o agravante da obesidade. No entanto, Heliana afirma que até a noite de domingo (20), quando recebeu a última notícia do estado de saúde do médico, ele estava reagindo bem. “Ele teve um caso leve, não é grave, não estava intubado”.
Em nota, a SES-AM (Secretaria de Estado de Saúde) informa que o médico está sendo monitorado pela FVS-AM (Fundação de Vigilância em Saúde).
A farmacêutica e professora na Ufam, Lenise Benarrós de Mesquita, de 53 anos, também contraiu a doença após completar a imunização. Nesta terça-feira (22), fez 14 dias que está com Covid-19. Ela tem diabetes, hipertensão e obesidade.
Lenise conta que recebeu a segunda dose em 3 de março deste ano. Os primeiros sintomas da doença vieram em 8 de junho. “Sintomas de febre e moleza do corpo, pensei que era gripe, dia 11 perdi paladar e olfato”. No dia 14 deste mês obteve o diagnóstico positivo para Covid.
Lenise afirma que mesmo após as duas doses, manteve o distanciamento social, uso de álcool em gel e máscara. Mas acredita que ao sair para realizar atividades essenciais acabou sendo infectada.
“Na semana anterior aos sintomas de Covid fui ao veterinário, supermercado e lavar o carro em lava a jato”. A farmacêutica também havia voltado às sessões de fisioterapia três vezes por semana, que estavam suspensas desde junho de 2020.
Lenise diz que nas duas primeiras consultas em um hospital particular de Manaus, apenas remédios como nimesulide e xarope foram receitados para o tratamento. Ela conta que procurou o hospital novamente, quando exames mais complexos mostraram que estava com 30% dos pulmões comprometidos no sétimo dia.
“A terceira médica foi muito atenciosa e passou tomografia e esquema de corticoides”, relata. “Passou também exames de laboratório, PCR, funções hepáticas, renais e hemograma. Para acompanhar melhor o quadro, pelas comorbidades que tenho”.
A professora conta que no momento está melhor. “O fisioterapeuta e o médico dizem que já estou bem, que já estou fora da fase de transmissão e agora é só aguardar terminar o fim do ciclo viral e começar a recuperação pós-Covid”.
No entanto, relata que passou por momentos difíceis no início da infecção. “Dá uma angústia muito grande. Tive falta de ar no 10º dia, 9º dia eu acho. Muita falta de ar, pensei que ia morrer”. “Hoje eu estou evoluindo bem, mas as noites são difíceis, como eu moro só. De dia, enquanto tem luz, a gente se ocupa, faz exercício respiratório, a gente tenta se concentrar em alguma coisa”, afirma.
O tratamento pós Covid vai além dos exercícios respiratórios. “Uma série de comprometimentos e nervosismo, muito nervosismo que a gente percebe que vai precisar de um auxílio psicológico depois”, diz.
Lenise afirma que não teve a doença antes da vacina, mas teve a impressão de como é pelo relato dos colegas. “Durante o período de Covid eles quase nem se pronunciavam, só diziam que era horrível, isso antes de serem vacinados”.
A farmacêutica diz que não são só atividades físicas que se tornam difíceis após a contaminação. “Hoje eu já dei aula, mesmo com Covid, remotamente. E qualquer atividade que a gente tenha, intelectual ou física, você se sente muito fraco. Apesar de eu ter tido Covid que eu acho até certo ponto controlado talvez pelo uso da vacina”, conta.
Importância da segunda dose
O relato pessoal da médica Heliana Feijó atesta a importância da vacina e de completar a imunização com as duas doses. “As pessoas não acreditam no vírus. Eu acredito porque eu tive, eu perdi o meu marido e está com um mês e meio que perdi o meu pai, que tomou uma dose de AstraZeneca. Meu marido queria tomar, mas ele morreu antes, dia 12 de janeiro”, afirma.
Solange Dourado explica que algumas pessoas receberam a vacina já estando doentes com Covid-19 e outras adoeceram logo após receber a vacina pois ainda não estavam no período de proteção. Mas mesmo após isso, ela não descarta as chances de contaminação. “Deixar de se proteger após ter sido vacinado, é um erro. Incorre em risco de adoecimento”.
Heliana diz que conviveu com as sequelas da doença por meses. “Em janeiro, meu cabelo começou a cair. Eu estou com quase dois meses tomando remédio porque 65% do meu cabelo caiu, diz. “Perdi oito quilos de massa muscular”.
Variantes
Feijó critica a campanha publicitária em cima da marca de 1 milhão de doses aplicadas em Manaus no último sábado (19). “Aí solta fogos lá na Bola da Suframa porque deram 1 milhão de doses. Mas foram 700 mil da primeira e 300 mil da segunda”, diz. “O prefeito, o governador, eles acham que é número. Porque é politiqueiro. Isso é campanha política”, critica.
Até a manhã desta terça-feira (22), o vacinômetro da Prefeitura de Manaus registrou a aplicação de 1.017.829 doses, sendo 707.926 da primeira e 309.903 da segunda.
De acordo com Feijó, apenas quando mais da metade da população estiver vacinada o risco do vírus circular e fazer as variantes vai diminuir. “Então quem não tomou a vacina, continua se arriscando. E os que tomaram, acham que não vão pegar, eles vão pegar e vão transformar o vírus em mutante. Outra variante vai surgir, várias vão surgir, porque as pessoas não estão levando a sério”, alerta.
A médica diz que geralmente a mutação é mais perigosa. “Porque o vírus, o objetivo dele é sobreviver. Ele entra numa célula de uma pessoa e quando sai, sai melhor”, explica. Segundo a FVS, 90% dos casos de Covid-19 no Amazonas são da variante P1.