Por Iolanda Ventura, da Redação
MANAUS – Empresas que participaram da coleta de preços da Susam (Secretaria de Saúde do Amazonas) para a compra de respiradores serviram de cobertura para que a FJAP, loja de vinhos, fosse a selecionada para a aquisição dos equipamentos, afirmou o deputado Delegado Péricles (PSL), presidente da CPI da Saúde.
Em entrevista na tarde desta terça-feira, 30, o deputado declarou que a TL Garcia, a Ducgás, e a Flex Solutions apresentaram propostas à Susam de respiradores junto com a FJAP e CIA. Porém, todas com valores superiores para que a loja de vinhos fosse a selecionada.
“Nós temos quatro empresas, três delas apresentaram preço maior que a FJAP. E o que eu não relatei é que essas três empresas serviram de cobertura para a aquisição e para a venda pela FJAP (dos respiradores) para a Susam. Então, nenhuma delas tinham como atividade principal atividades hospitalares. Elas foram ali para cobrir o preço da FJAP, para que ela apresentasse um preço menor”, disse Péricles.
Segundo o deputado, desde o início a Sonoar tinha interesse em vender os respiradores ao Estado. “A Sonoar, desde o primeiro momento, ela tinha interesse em não só participar, mas vender esses equipamentos para a Susam. Desde o dia 27 de março a proprietária da Sonoar entrava em contato com a Susam, já no intuito de oferecer o produto e na certeza de que iria vender e ter aquele lucro de quase R$ 1,5 milhão como ela teve”, afirmou Péricles.
Entretanto, a Sonoar não dispunha de capital suficiente para comprar os ventiladores de fornecedores nacionais para revendê-los à Susam, disse Péricles. “A Sonoar só não vendeu para o Estado porque ela tinha o contato das empresas fornecedoras dela, mas não tinha capital, não tinha dinheiro para comprar. E essas empresas, em sua maioria, elas só aceitavam à vista. Então, ela ficou impossibilitada, tanto que ela apresenta a proposta querendo valor à vista”, disse o presidente da CPI.
Com isso, segundo Péricles, entra a FJAP, que comprou os respiradores da Sonoar por um preço já superfaturado e os revende à Susam também acima do valor de mercado. “Como ela não teve, buscou-se em uma outra empresa. Aí que entra a empresa de vinhos. Essa possibilidade de ter o dinheiro para comprar com os fornecedores de outros estados”, disse.
No início de junho, a CPI apurou que a Sonoar adquiriu os ventiladores pulmonares entre 3 e 18 de abril de diferentes fornecedores nacionais, com preços que variavam de R$ 32 mil a R$ 55 mil. No total, a empresa pagou pelos 28 respiradores R$ 1,1 milhão. A mesma os revendeu por R$ 2,48 milhões à FJAP e lucrou R$ 1,41 milhão.
A FJAP comprou os respiradores da Sonoar às 15h01 do dia 8 de abril. No mesmo dia, às 17h39, a loja de vinho os revendeu para o governo por R$ 2,97 milhões. Num espaço de 2h30 o valor subiu R$ 496 mil.
O deputado afirma ainda que a quantidade não foi coincidência também. “E assim foi feito, não é coincidência. Ela só conseguiu, a Sonoar, 28 respiradores. Naquele momento o Estado precisava de mais de 300 respiradores, mas a Sonoar, com o contato que ela tinha, porque ela é realmente do ramo, conseguiu com cinco fornecedores o total de 28 respiradores. E não eram os adequados para UTI”, explicou.
Segundo Péricles, desde o começo o objetivo era favorecer a Sonoar. “Desde o início o processo todo foi para favorecer a Sonoar, só que no meio desse processo houve o ruído pela falta de capital, para que ela pudesse pagar à vista os respiradores que foram adquiridos pela Susam”, afirmou.
Para o parlamentar, considerando todo o superfaturamento ocorrido no processo, a maior causadora do dano aos cofres públicos foi a Sonoar. “A maior beneficiada, a que causou a maior lesão ao erário público foi esse valor da Sonoar. Juntando, dá quase R$ 2 milhões”, disse.
No balanço apresentado, Péricles destacou o intervalo entre a data do pagamento, dia 8 de abril, e a entrega dos respiradores. “Alguns materiais, apesar do pagamento, eles foram entregues depois, bem depois. E na nota, onde consta o material total, a entrega do material está no dia 30 de abril”, pontuou o deputado.
Segundo o parlamentar, uma parte dos equipamentos foi entregue antes, mas não foram usados pois não serviam para a UTI. “No dia 17 de abril já tinha material sendo entregue lá na Nilton Lins na ala de UTI, onde eles não foram usados, e é bom ressaltar isso, os respiradores que não eram para UTI. Então uma parte foi entregue dia 17 ou até antes pela Sonoar, não pela loja de vinhos, e uma parte só foi entregue posteriormente ao pagamento”, afirmou.
Avaliação
Algumas dos pedidos da CPI à Justiça perderam objeto após a ação do MPF (Ministério Público Federal) e PF (Polícia Federal) que resultou mandados de prisão temporária contra oito pessoas, incluindo a secretária Simone Papaiz, além de buscas e apreensões em 14 endereços de pessoas ligadas ao governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), disse Péricles. Apesar disso, o deputado avaliou a situação como positiva, pois comprova que a Comissão estava no caminho certo, disse.
“Durante essas duas semanas, a CPI apresentou uma medida cautelar à justiça de indisponibilidade de bens do proprietário da FJAP, no valor dessa diferença de R$ 496 mil. E eu entendo que essa questão perde objeto, uma vez que a Polícia Federal, conduzindo muito bem a operação, ressalto que a linha de investigação é idêntica à nossa e mostra que a CPI estava no caminho certo. E teria concluído essa semana se não fosse aquela suspensão. Mas mostramos que realmente houve fraude, houve superfaturamento na aquisição dos respiradores”, avaliou o parlamentar.
Também foi pedido a quebra de sigilo bancário da FJAP e Sonoar, e uma cautelar de afastamento do ex-secretário executivo da Susam, João Paulo, como procurador-chefe da Suhab (Superintendência Estadual de Habitação). Os três, dois empresários e servidor, foram presos temporariamente nesta terça-feira, 30, na Operação Sangria.
Segundo o presidente da CPI, o próximo passo é concluir a investigação dos respiradores e focar em outros casos. “Qual é a ideia agora? É encerrar esse caso dos respiradores, tendo em vista que está numa condução com a Polícia Federal. Até porque nós temos casos muito mais graves que estamos investigando e que serão apresentados em tempos oportunos. Alguns já até indicamos, como é o caso dos processos indenizatórios realizados no Hospital Nilton Lins que são 16 empresas que foram contratadas, eu digo contratadas entre aspas porque não há contrato formal para realizar um serviço. E nós já até mostramos aqui a lavanderia, a quantidade absurda que ela demonstrou no seu relatório para pagamento”, disse Péricles.
Esqueceu de comentar que o representante da DUCGAS, empresa que supostamente deveria funcionar no Rio de Janeiro, mas não tem nem CNPJ, foi representada comercialmente pelo presidente do Partido das Mulheres aqui de Manaus, Charles Sampaio.