Por Felipe Campinas, do ATUAL
MANAUS – A falta de servidores de áreas técnicas, como engenharia civil e contabilidade, tem travado as investigações do MP-AM (Ministério Público do Estado do Amazonas). Documentos de inquéritos civis acessados pelo ATUAL mostram que um único engenheiro civil tem até 200 demandas na fila de espera. Enquanto isso, o órgão está há dez anos sem promover concurso público.
Em casos complexos, que envolvam questões relacionadas à contabilidade, economia e engenharia, por exemplo, os promotores de Justiça dependem de laudos técnicos para prosseguir com as investigações.
No Ministério Público do Amazonas, o NAT (Núcleo de Apoio Técnico) é o órgão “especializado em áreas de conhecimento não jurídico, criado para prestar informações técnicas (laudos, estudos, pareceres, análises e outras manifestações técnicas especializadas)” aos promotores de Justiça.
O Ministério Público informa, em seu site institucional, que o núcleo tem apenas oito servidores, sendo dois engenheiros civis, uma assistente social, um contador, um engenheiro florestal, uma médica, uma pedagoga e uma psicóloga.
O pequeno grupo tem acumulado diversas demandas enviadas por promotores de Justiça. É o que apontam diversos documentos de investigações.
A falta de profissionais e, consequentemente, a demora na elaboração de estudos técnicos, tem atrasado em até 21 meses as investigações.
Para prosseguir com os inquéritos, promotores chegam a recorrer a outros órgãos, como o TCE-AM (Tribunal de Contas do Amazonas), que também tem setor técnico.
Concurso público
O MP está há dez anos sem promover concurso público, segundo o Sindsemp-AM (Sindicato de Servidores do Ministério Público do Estado do Amazonas).
O órgão abriu, em agosto de 2022, uma comissão especial para organizar o certame para servidores administrativos, mas até o momento nenhum edital foi publicado.
No dia 9 deste mês, o promotor de Justiça Antônio José Mancilha ajuizou uma ação civil pública para obrigar a Procuradoria-Geral de Justiça do Amazonas a promover concurso público para preenchimento de 16 cargos de assistente social, psicólogo, pedagogo e editor de imagem.
Mancilha afirmou que, atualmente, os cargos são ocupados por servidores comissionados do Governo do Amazonas.
Leia mais: Promotor vai à Justiça para obrigar MP-AM a fazer concurso público
Demandas
Com poucos servidores, os trabalhos técnicos ficam acumulados.
Em março de 2022, o promotor de Justiça Hilton Serra Viana pediu ao NAT um estudo técnico para verificar se havia sobrepreço em um contrato do Idam (Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado do Amazonas).
Dezoito meses depois, o setor técnico comunicou que o NAT tinha apenas um engenheiro civil e que ele tinha 200 demandas na fila de espera.
“Considerando que a equipe deste Núcleo de Apoio Técnico dispõe somente de um Engenheiro Civil, a fila de atendimento dessa área do conhecimento apresenta mais de 200 solicitações em espera. Contudo, conforme entendimentos verbais mantidos na reunião do dia 19/09, envidaremos esforços no sentido de atender à solicitação em comento ainda no decorrer do segundo semestre do corrente ano”, diz trecho de ofício assinado pela chefe do NAT, Marlu Honda Neves Martins, em setembro deste ano.
Para continuar com a apuração, o promotor de Justiça pediu ao TCE-AM (Tribunal de Contas do Amazonas) informações a respeito de eventual laudo técnico sobre o contrato.
No ofício enviado ao tribunal, Hilton Serra Viana sugere a abertura de uma tomada de contas especial para verificar se há irregularidades no contrato, caso o TCE ainda não tenha analisado o contrato.
Em outro caso, a 46ª Promotoria de Justiça de Manaus aguarda há 21 meses estudos técnicos do NAT em investigação sobre o “endividamento do Município de Manaus no período de 2013/2020”. A denúncia foi ajuizada pelo Comitê do Amazonas de Combate à Corrupção e ao Caixa Dois.
Em fevereiro de 2022, a promotora de Justiça Sheyla Dantas Frota pediu ao NAT um parecer sobre o caso. Em diversos ofícios enviados ao setor posteriormente, a promotora afirmou que o laudo é “essencial” para a continuação da apuração.
Em abril deste ano, a chefe do NAT comunicou que o setor estava sem contador, mas que a demanda estava “entre as prioridades da fila de atendimento da Contabilidade”.
“Atualmente a equipe técnica deste Núcleo não dispõe de AT Contador, no entanto, juntamente com a Administração, estamos tomando providências no sentido de restabelecer o fluxo de atendimento”, diz trecho do documento assinado por Marlu Honda Neves Martins.
No último dia 27 de outubro, outra promotora que pegou o caso, Cley Barbosa Martins, considerou a “sobrecarga” ao setor e estendeu o prazo ao NAT.
“Quanto à solicitação ao NAT, tendo em vista a conhecida sobrecarga do setor, entendo razoável estender o prazo de resposta quanto à previsão de perícia”, diz trecho do despacho da promotora.
O MPAM não tem nenhum engenheiro ambiental. Como pode em um Estado do tamanho e com as características do Amazonas?