Por Danielle Brant, Isabella Macedo e Iara Lemos, da Folhapress
A decisão do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de enterrar o Renda Brasil levou o Congresso a acelerar a discussão de projetos que possam criar um programa de renda mínima mais abrangente que o Bolsa Família.
O Renda Brasil era a reformulação do Bolsa Família com a qual o governo Bolsonaro buscava deixar sua marca na área social e acabar com um dos nomes mais fortes das gestões petistas.
O presidente, no entanto, desistiu do novo programa quando se deparou com discussões que envolviam o corte de benefícios de aposentados e deficientes, o que poderia desgastá-lo junto a esses públicos.
No Congresso, o fim dos estudos para lançar o Renda Brasil provocou a retomada de discussões que estavam paralisadas, à espera do texto do novo programa social.
Deputados articulam a votação de projetos para criar uma renda mínima que, ainda que não seja universal, inclua mais brasileiros de baixa renda que o Bolsa Família, que hoje atende 14,3 milhões de famílias, conforme dados de agosto.
Líder do PSB na Câmara, o deputado Alessandro Molon (RJ) afirma que o partido deve apresentar um novo projeto para criar essa renda. “Renda mínima ou básica, o que não quer dizer universal”, afirmou. “Ou seja, nem todo mundo receberá, apenas uma parte da população, que necessite. Que parte é essa, a gente vai decidir.”
Do mesmo partido de Molon, o deputado Felipe Rigoni (ES), que faz parte da frente parlamentar mista em defesa da renda básica, afirmou que o grupo ainda não se reuniu para definir uma estratégia em reação à desistência de Bolsonaro de lançar o Renda Brasil.
“Mas é um pouco incoerente o presidente falar que não tem mais conversa sobre Renda Brasil e que vai continuar o Bolsa Família. Então não vai melhorar nada”, diz.
“A conversa do Renda Brasil que desagradou ele foram as reformas que têm que ser feitas ao mesmo tempo para conseguir fazer o Renda. Só que sem as reformas, nem o Bolsa Família você consegue aumentar”.
Rigoni defende que, para viabilizar a ampliação do Bolsa Família ou a criação de um projeto de renda mínima mais amplo, seria necessário debater a desindexação -que retira a obrigatoriedade de aplicar a correção pela inflação.
“O que dá mesmo espaço é desindexar, converter o abono [salarial], e são temas difíceis de serem feitos. Eu acho que a resistência do presidente é justamente nesses pontos, que é o que daria a robustez necessária de fazer uma renda mínima de R$ 80 bilhões ou mais.”
Se as discussões em torno de uma renda mínima universal não alcançarem o apoio do governo, Rigoni afirmou ser favorável a retomar a agenda de desenvolvimento social, uma série de propostas lançadas no ano passado e que conta com o apoio do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Entre elas, há uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para incluir o Bolsa Família na Constituição e um projeto que reformula o programa social e propõe reajuste dos valores do benefício.
“Para fazer a renda mínima, precisa de coordenação política, e o governo não pode estar de fora disso. Os debates, para serem enfrentados, precisam do governo também”, diz Rigoni.
Inserir o Bolsa Família na Constituição e ampliar o programa também é a estratégia do PT. “Já que o governo disse que agora não tem mais Renda Brasil, nós vamos trabalhar para constitucionalizar o Bolsa Família. Para evitar isso, que foi uma malandragem política, de o governo ter dito que ia criar o Renda Brasil e, de uma hora para a outra, dizer que não tem mais condição”, afirmou o deputado José Guimarães (CE), líder da minoria na Câmara.
Líder da Rede no Senado, Randolfe Rodrigues (AP) defende que o Congresso paute propostas que criam uma renda mínima.
“Virar de costas para qualquer programa de renda básica é um ato de crueldade no momento que mais o brasileiro precisa, que o alimento está mais caro. O que ocorre é o reflexo da incapacidade do governo e o Congresso precisa agir”, diz Randolfe.
Vice-líder do governo no Senado, Izalci Lucas (PSDB-DF), avalia que o governo deve enviar nova proposta de renda mínima para não deixar a decisão das mãos do Congresso. Para ele, a melhor alternativa é deixar o tema para depois do período eleitoral.
Até lá, ele acredita que os ânimos já estejam mais arrefecidos. “O que fica ruim é falar disso em véspera de eleição, que ninguém sabe de onde vem e fica todo mundo perdido. Cada um fala uma coisa, as ideias saem soltas e geram confusão. Isso pode gerar prejuízo”.
O bate-cabeça entre a equipe econômica e o Planalto foi alvo de críticas de parlamentares. O líder do Cidadania na Câmara, deputado Arnaldo Jardim (SP), afirma que o governo Bolsonaro “está se especializando em criar cenários de instabilidade no país”.
“Uma equipe que deveria ter estabilidade e equilíbrio, produz o contrário. Antes, o ministro dizia que o Renda Brasil precisava da CPMF. Depois, afirmou que o programa seria irrealizável. E agora falar em sacar das aposentadorias o recurso para este fim. Soltar balões de ensaios cria instabilidade”, critica.
“É uma equipe que não entrega resultados. O ministério da Economia alega que está cuidando de tudo, mas não entrega nada”, criticou Jardim.
Para o líder do PT na Câmara, Ênio Verri (PR), ao desistir do Renda Brasil, Bolsonaro se contradiz.
“Bolsonaro, ao contrário do que ele diz, não está preocupado com o equilíbrio fiscal, ele está preocupado com a sua reeleição”, afirma. “E, à medida que o Renda Brasil distribuía miséria, já que tirava alguns outros benefícios sociais de trabalhadores e trabalhadoras para dar um nome diferente e construir um outro benefício que nem seria melhor do que o que existe, ele optou por não mexer com isso nesse momento.”
O líder petista também apontou que o ‘cartão vermelho’ presidencial ao projeto deve causar uma crise na equipe do ministério da Economia. “Claro que isso gera uma crise interna no grupo ligado ao ministro Paulo Guedes