Por Lucas Borges Teixeira e Gabriela Vinhal, da Folhapress
BRASÍLIA – As bases do futuro governo Lula e do atual governo Bolsonaro vão declarar apoio à reeleição de Arthur Lira (PP-AL) à presidência da Câmara dos Deputados. O PT de Luiz Inácio Lula da Silva e o PSB, de seu vice Geraldo Akckmin, deverão chancelar o voto na tarde desta terça-feira (29), enquanto o PL do presidente Jair Bolsonaro deverá tratar do assunto em um jantar nesta noite, em Brasília.
O apoio petista a Lira, confirmado ao UOL por parlamentares da sigla, indica uma mudança de rumo da bancada do partido em relação ao presidente da Câmara, grande aliado de Bolsonaro, e tem influência direta de Lula.
De olho no comando de comissões importantes da Casa, incluindo a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), na aprovação da PEC da Transição (Proposta de Emenda à Constituição) e um início de mandato mais tranquilo, o partido não só abdicará de lançar nome próprio à Presidência da Câmara como vai aderir ao até então desafeto.
Adaptar é preciso
O PT fez oposição a Lira durante todo o seu mandato, após ter apoiado a candidatura de Baleia Rossi (MDB-SP), em 2021. Eleito com apoio de Bolsonaro, Lira se tornou o principal aliado do governo na Casa e foi o grande articulador do chamado orçamento secreto, que fiou apoio do centrão à atual gestão – algo combatido não só pelo partido mas também criticado abertamente por Lula durante a campanha.
O PT decidiu não lançar nome próprio, mas havia uma expectativa de endosso a nomes do MDB ou do PSD. Apesar de divergências, a sigla decidiu ser melhor reorganizar a estratégia em torno dos objetivos próprios:
– Facilitar o início do novo governo Lula
– Aprovar a PEC da Transição
– Conseguir comissões importantes da Casa
Negociação pela CCJ
Para apoiar formalmente a reeleição de Lira e integrar o bloco, o PT negocia para assumir a presidência da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara, colegiado onde devem passar os projetos mais relevantes. No entanto, a ofensiva petista causou um problema para Lira, uma vez que oposicionistas do governo eleito, como parlamentares do PL, também querem o cargo.
Isso porque integrantes do Centrão querem emplacar o partido do presidente Bolsonaro na CCJ, com o argumento de que a sigla elegeu a maior bancada da Casa (99 deputados). Em troca, o União Brasil, que já anunciou apoio ao Lira na semana passada, manteria a presidência de outra comissão importante, a CMO (Comissão Mista do Orçamento).
Na avaliação de deputados do Centrão ouvidos pelo UOL, a demora do PT em se aliar publicamente a Lira poderia deixá-lo sem chance para barganhar a chefia da Câmara. E a opinião seria matemática: além do PP, com 47 deputados, já indicaram apoio ao alagoano o União Brasil (59 parlamentares), o Republicanos (41), o PDT (17), o Podemos (12), o PSC (6), o Patriota (4) e o PTB (1).
Correm por fora até o momento o PL (99) e o PSD (42), que ainda não sinalizaram abertamente o apoio, mas dirigentes das legendas endossam o nome de Lira. Se isso se concretizar, sem a federação do PT (que reúne 80 de mais dois partidos: PV e PCdoB), Lira já reuniria o apoiamento de 328 deputados dos 513. São necessários 257 votos para vencer a disputa.
Inimigos mais perto ainda. Durante toda a campanha, Lula criticou insistentemente a relação entre o governo Bolsonaro e Congresso. Em maio, chegou a chamar Lira de “imperador do Japão” ao falar que era o parlamentar, não o presidente, quem controlava o orçamento.
O presidente eleito chegou em Brasília ontem (28) depois de se recuperar de uma cirurgia na garganta. Ele tem participado de reuniões particulares, além de ver o jogo da seleção brasileira na Copa do Mundo, acompanhado da cúpula do governo eleito. Ele se encontrou com Lira no início de novembro, após a eleição. Não está prevista uma nova reunião, mas o apoio à reeleição passa muito pelos planos do governo.
Fantasma do passado
Um dos objetivos dos petistas é garantir um início de mandato mais tranquilo para Lula, com a lembrança do governo Dilma Rousseff (PT), quando o partido apoiou eleição do deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) contra Eduardo Cunha (então MDB-RJ), que, vitorioso, abriu o processo de impeachment contra a presidente.
Com um Congresso mais conservador e de maioria de oposição, parlamentares petistas dizem entender que não é o momento de entrar na disputa contra alguém com amplo apoio na Casa e focar em garantir um início de mandato mais tranquilo para que Lula possa fazer o que pretende e prometeu.
De olho na PEC
A proposta que prevê um adicional ao orçamento sem furar o teto tem sido o principal foco do novo governo desde a eleição. O projeto é indispensável para que o partido consiga garantir as principais promessas de Lula na área social, em especial o Bolsa Família, então Auxílio Brasil, no valor de R$ 600 com adicional de R$ 150 por criança com menos de seis anos.
A proposta, protocolada ontem no Senado pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI), relator-geral do Orçamento 2023, o valor referente ao programa fica fora do cálculo do teto de gastos entre 2023 e 2026. O texto traz ainda um aval extra de R$ 175 bilhões e já foi alvo de críticas entre lideranças do meio político e empresarial que apoiaram o petista no segundo turno contra Bolsonaro.
Desafio entre bancadas
No início da discussão do texto, petistas avaliaram que se o texto começasse no Senado seria mais rapidamente aprovado do que se começasse pela Câmara. Mas o que se tem desenhado é um desentendimento dos senadores em relação à proposta. O PT terá que reverter a resistência de bancadas relevantes da Casa, como a do Podemos, que contém oito senadores.
Ao UOL, o líder da sigla, Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), afirmou que indicará voto contrário à PEC tanto na CCJ do Senado quanto no plenário. “Sou contrário à proposta. Eu e meu partido votaremos contra”, disse. Questionado sobre as negociações, o parlamentar afirmou que é contra o valor extra teto e o prazo de quatro anos.
“Temos duas discordâncias. Valor máximo seria de R$ 80 bilhões e prazo máximo de um ano. Com esse valor é possível bancar o Bolsa Família, o auxílio de R$ 150 para crianças, a Farmácia Popular e o aumento do salário mínimo”, completou. Guimarães disse que deverá ocorrer uma reunião de líderes nesta semana para tratar do assunto.
Aliados do PT
Lula conta, inicialmente, com o apoio de legendas da base de esquerda, e de caciques do MDB e do PSD – ambas as bancadas reúnem 12 senadores e somam 24 parlamentares.
No entanto, o texto não é unanimidade entre os integrantes, assim como ocorre no PSDB, com os seis tucanos. O senador Tasso Jeiressati (RN), inclusive, defende outros valores para a PEC. Há, ainda, quem trabalhe contra a proposta, como os parlamentares aliados de Jair Bolsonaro, do PL e do PP – com, respectivamente, oito e sete senadores, chegando a 15 parlamentares.
São necessários 49 votos favoráveis dos 81 senadores. A base petista conta com o apoio de apenas 12 senadores de quatro siglas: PT (7), Pros (2), PSB (1), Rede (1) e Cidadania (1). Faltariam 37 votos para levar o texto à Câmara dos Deputados.