É um comportamento estranho, para dizer o mínimo, como o senador Eduardo Braga (PMDB) e o governador José Melo (Pros) atuam em Brasília no caso da PEC da prorrogação da Zona Franca de Manaus. Vou me atar ao comportamento de Braga neste início, por ele estar mais presente em Brasília. Primeiro, o senador apareceu em uma foto com o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, do mesmo PMDB, entregando um papel que dizia ser um documento com um acordo para votação da PEC em segundo turno. A foto surpreendeu a todos os parlamentares amazonenses, da Câmara dos Deputados e do Senado, porque ninguém conhecia o tal documento.
Na semana seguinte, a bancada de deputados do Estado e de representantes dos Estados do Norte que pleiteiam a extensão do prazo das áreas de livre comércio, procuraram o ministro da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, Ricardo Berzoini, para tratar do assunto, e o ministro também não conhecia nenhum documento saído do Palácio do Planalto sobre Zona Franca ou acordo para a votação da PEC.
Braga foi desmoralizado, mas para não deixar o líder do governo Dilma Rousseff com a pecha de mentiroso, o próprio ministro Berzoini emitiu uma nota, no final do dia em que desmentiu Braga, desmentindo a si mesmo, e dizendo que o documento que Braga entregara a Henrique Alves fora elaborado no Ministério da Fazenda. O teor do documento, até hoje, não foi revelado. Um parlamentar que disse ter visto os papéis, afirmou não se tratar de nenhum acordo, mas de pontos que poderiam ser discutidos com os parlamentares que condicionam a votação da PEC da Zona Franca a mudanças na Lei de Informática. Nada de concreto.
Esclarecidos os fatos, ficou evidente que Eduardo Braga apenas posava para foto com seu companheiro de partido Henrique Alves para postar no Facebook, plataforma que o senador elegeu para divulgar sua candidatura ao governo do Estado. Vale tudo para aparecer bem ao eleitorado que tem acesso às redes sociais, inclusive uma foto ao lado do presidente do STF, Joaquim Barbosa, no dia em que o ministro anunciou sua aposentadoria.
Pois bem, voltemos ao caso da Zona Franca. Na terça-feira (27/05), Braga postou nova foto no Facebook ao lado de Henrique Alves, acompanhado de texto com o seguinte teor: “Meus amigos, estamos neste momento concluindo um processo de articulação e diálogo que construiu o acordo que garante para o mais rápido possível, na Câmara dos Deputados, a votação em segundo turno da PEC que Prorroga nossa ZFM por mais 50 anos”. Mais uma vez, Braga agia à revelia da bancada do Amazonas, driblando os parlamentares e autoridades como o governador José Melo e o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB), que estavam em Brasília.
Imagino que Braga tenha imaginado que seria simples a votação da PEC em segundo turno; que combinou com o presidente da Câmara para posarem como os heróis da prorrogação dos incentivos fiscais da Zona Franca de Manaus e que ele ficaria com os louros para explorar como bem entendesse na campanha eleitoral que se avizinha.
As projeções de Braga e de seu companheiro de partido não se confirmaram. Como não ocorreu como estava no script, Braga voltou ao Facebook – que ele julga ser o espaço por excelência de diálogo com o seu público-eleitor – para acusar os parlamentares do sudeste. Leia o que postou o senador (reproduzo apenas o primeiro parágrafo de quatro): “Mais uma vez os inimigos do Amazonas e da ZFM demonstram não ter compromisso com o mais importante modelo de Desenvolvimento Sustentável do Brasil. Hoje, pouco antes da votação da PEC que Prorroga a ZFM por mais 50 anos, as bancadas do PSDB de São Paulo e Paraná fizeram alterações no texto acordado e a votação acabou sendo adiada”. Foi no dia 28.
A autoconfiança de Braga foi abatida pelas bancadas do PSDB de São Paulo e Paraná. Braga não nominou os parlamentares, falou em bancadas do PSDB, com o claro propósito de tirar proveito eleitoral, pelo fato de o PSDB ter o principal adversário de Dilma Rousseff na disputa eleitoral deste ano. O relator do projeto que altera a Lei de Informática é o deputado João Maia (PR-RN). Vejam, senhores, o parlamentar é do PR, um partido aliado da presidente Dilma Rousseff. Era ele quem estava à frente das negociações; foi ele quem pediu adiamento da votação da PEC da Zona Franca de terça para quarta-feira.
Na postagem em que culpa terceiros, Braga afirma que tão logo a votação do 1º turno foi encerrada, “começamos as conversas em busca de um acordo que contemplasse as bancadas de outros estados e conseguíssemos a votação em segundo turno, na Câmara dos Deputados”. Com quem foram feitas as negociações? A bancada do Amazonas, principal interessada, ficou de fora.
Braga alega que está negociando há mais de dois meses porque, segundo ele, “não se faz acordo em véspera de votação, apenas com apertos de mão e falando com parlamentares pelos corredores”. A frase é uma resposta à acusação de José Melo de que Braga mentiu ao dizer que havia acordo. A frase de Melo: “Não é assim que se trata o povo do Amazonas e não permitirei que essa história se repita. Não é verdade que havia acordo para votação da PEC da ZFM conforme foi divulgado pelo líder do governo, senador Eduardo Braga”.
Não se deve bater palmas a José Melo. A frase dele, também postada no Facebook, é simples bravata, para jogar lama no adversário, com vistas à disputa eleitoral para o Governo do Amazonas. Nenhum nem outro agiram de boa-fé. Melo fez publicar manchetes nos sites de notícias do Amazonas (o ATUAL não embarcou) com a garantia de que a PEC seria votada na terça-feira, dando a entender que o feito seria realizado graças à presença dele em Brasília.
Nem ele nem Arthur Neto interferem na votação da PEC. Estão em Brasília apenas para aparecer na foto como salvadores da pátria, pais da criança. As próprias imagens mostram que negociam com eles mesmos. As imagens de Melo e Arthur com os deputados federais, o superintendente da Suframa, o secretário de Fazenda e alguns empresários do Estado é patética.
Braga, no entanto, não desistiu da saga de levar, sozinho, a taça da prorrogação da Zona Franca, não quer jogar com a equipe. Disse que na próxima semana estará com o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e com outros líderes de partidos “para tentar encontrar a melhor solução”.
Não havia pior momento para a votação dessa matéria no Congresso Nacional. Tempo houve para a discussão e votação da PEC da Zona Franca, mas, longe do processo eleitoral, a história não teria a mesma graça. Bom é quando a politicada pode aproveitar um tema tão delicado para a sociedade para fazer joguete político. Assim é a política baré.
Valmir Lima é jornalista, graduado pela Ufam (Universidade Federal do Amazonas); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia (Ufam), com pesquisa sobre rádios comunitárias no Amazonas. Atuou como professor em cursos de Jornalismo na Ufam e em instituições de ensino superior em Manaus. Trabalhou como repórter nos jornais A Crítica e Diário do Amazonas e como editor de opinião e política no Diário do Amazonas. Fundador do site AMAZONAS ATUAL.
Os artigos publicados neste espaço são de responsabilidade do autor e nem sempre refletem a linha editorial do AMAZONAS ATUAL.