Por Feifiane Ramos, do ATUAL
MANAUS — A violência policial contra jovens negros não se limita às consequências imediatas, mas perpetua a marginalização e compromete o futuro da juventude negra, afirma o professor e pesquisador Claudenor de Souza Piedade, da Ufam (Universidade Federal do Amazonas).
Integrante do “Banzeiro: Grupo de Pesquisas e Estudos em Gênero, Saúde Mental e Lutas Sociais na Amazônia” da Ufam, o professor se baseia na pesquisa da Rede Observatórios da Segurança que aponta que no ano passado 59 pessoas foram mortas por ações policiais no Amazonas. Destas, 25 (42,4%) eram negras.
O estudo detalha as faixas etárias das vítimas: 23 mortos tinham entre 18 e 24 anos (39% dos casos), 16 mortos tinham entre 25 e 29 anos (27,1%), e 7 mortos estavam na faixa de 30 a 34 anos (11,9%). A faixa etária de 35 a 64 anos registrou apenas uma morte (1,7%), enquanto em 10 casos (16,9%), a faixa etária não foi informada.
Para o professor, esse ciclo de violência não apenas destrói vidas, mas também limita as oportunidades de ascensão social dos jovens negros criando um impacto psicológico profundo que compromete suas perspectivas de futuro.
“A exposição à violência policial causa um impacto psicológico duradouro na juventude negra, contribuindo para um ciclo de marginalização que dificulta a construção de um futuro seguro e digno”, diz Piedade.
Ele ressalta que o trauma gerado pela violência policial estabelece barreiras para o acesso desses jovens a oportunidades de educação e emprego, perpetuando um ciclo de exclusão social que impede sua mobilidade social e reforça a desigualdade. O professor cita que o racismo estrutural presente nas práticas de segurança pública contribui diretamente para esse cenário.
“A juventude negra tem sido alvo de um processo contínuo de criminalização e violência, reforçada por estigmas sociais que associam sua imagem a uma suposta periculosidade”, explica Claudenor Piedade. Esse preconceito estrutural não apenas afeta as abordagens policiais, mas também amplia a marginalização dessa população na sociedade.
Conforme Claudenor, a criminalização precoce dos jovens negros os torna alvos preferenciais da repressão policial, agravando ainda mais o ciclo de violência e exclusão. “A violência policial, muitas vezes fundamentada em estereótipos raciais, não apenas ameaça a integridade física dos jovens negros, mas também limita suas perspectivas de futuro”, afirma Piedade. Ele observa que as práticas policiais violentas criam um ambiente de desconfiança e medo nas comunidades, afastando ainda mais os jovens das instituições de segurança pública.
“Esse modelo de repressão exacerba a marginalização e impede que esses jovens construam um futuro digno, com acesso igualitário a oportunidades”, complementa.
Ao analisar os dados do Observatório, Piedade reforça que os números não devem ser vistos apenas como estatísticas de violência, mas como reflexos de um sistema que, ao tratar a juventude negra como uma ameaça, condena esses jovens a uma vida de marginalização e futuro incerto.
Medidas
O boletim “Pele Alvo”, do Observatório, evidencia a norma da letalidade da ação policial. No Brasil, foram 4.025 vítimas de ação policiais. Destas, em 3.169 casos foram disponibilizados os dados de raça e cor, sendo que 2.782 (87,8%) dos mortos eram pessoas negras.
Diante desse cenário, o professor defende que a solução está em uma reformulação profunda das práticas de segurança pública por meio de políticas públicas que combatam o racismo estrutural e promovam o respeito aos direitos humanos.
“É essencial uma formação policial que inclua a educação em antirracismo e direitos humanos, para garantir que as abordagens policiais respeitem a dignidade dos cidadãos, independentemente de sua raça”, afirma o professor.
Outro ponto destacado por Piedade é a importância do policiamento comunitário – uma estratégia que visa aproximar as forças de segurança das comunidades e reduzir o uso excessivo da força. “O policiamento comunitário pode ajudar a minimizar a violência policial, criando uma relação de confiança mútua entre a polícia e a comunidade”, destaca.
Piedade conclui que para quebrar o ciclo de violência e marginalização que afeta a juventude negra no Amazonas é urgente a implementação de reformas que não apenas lidem com as consequências da violência policial, mas busquem garantir um futuro melhor para esses jovens, oferecendo mais acesso a oportunidades e construindo uma sociedade mais inclusiva e justa.