A violência sempre foi uma ferida na democracia brasileira, ganhando contornos acentuados nos últimos anos. A sobreposição da violência é sinal manifesto de que a vida não é respeitada, portanto a democracia não está funcionando adequadamente. Se a vida é banalizada, o regime político perde a sua legitimidade, pois não viabiliza a expansão e plenificação da vida.
Vida plena é também a grande meta de todas as grandes cosmovisões que buscam a evolução cultural e espiritual do ser humano. “Eu vi para que todos tenham vida e a tenham plenamente”, disse Jesus de Nazaré aos seus seguidores.
Como ameaça a democracia brasileira, a violência produziu em 2021 um total de 41 mil assassinatos, projetando o Brasil como o segundo país que mais promoveu esse tipo de morte. Perdemos somente para a Nigéria, que provocou 64 mil assassinatos em 2021.
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) mostra em seu novo relatório sobre os conflitos no campo (36ª Edição) que a vida é cada vez mais atacada no Brasil. O documento registra em 2021 um total de 35 assassinatos no campo, sendo que 80% deles ocorreram na Amazônia Legal.
Os assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips também demonstram a fragilidade da nossa democracia, uma vez que essas mortes buscam intimidar as organizações que eles representavam: defensores dos direitos humanos e jornalistas.
O Brasil tem uma lastimável tradição de ataques aos defensores dos direitos humanos. A perseguição a essas pessoas é uma prova irrefutável de que o país não preza pelos direitos fundamentais dos cidadãos, portanto, a democracia está visivelmente comprometida.
A perseguição aos jornalistas não são somente ataques ao direito de eles se expressarem. A liberdade de expressão refere-se também ao direito de a sociedade saber o que está acontecendo. O acesso ao jornalismo de qualidade, baseado em fatos, é uma parte essencial do processo democrático. Quando jornalistas são atacados e mortos e quando há impunidade para o assassinato de jornalistas em países democráticos, significa que a democracia está sendo enfraquecida.
O atual presidente da república brasileira é conhecido por seus ataques aos jornalistas. No dia em que foi celebrada a liberdade de imprensa (03 de maio), o presidente Bolsonaro foi condenado pela justiça a pagar uma indenização de R$ 100.000 reais à categoria de jornalistas a título de danos morais. Esse tipo de atuação era bastante comum no período da Ditadura Militar, quando não havia liberdade de imprensa e muitos jornalistas foram presos, torturados e mortos.
Ao contrário, em uma democracia forte, os jornalistas são valorizados, pois eles mantêm a população informada sobre os fatos, sendo por isso, perseguidos pelos governos autoritários.
Há outras formas de violência infligidas à população, como a destruição ambiental e a corrupção. Neste último aspecto, o Brasil também não tem o que comemorar, em virtude das denúncias de corrupção do atual governo. A CPI da Pandemia indicou inúmeras ações fraudulentas na gestão da Covid-19, entre elas destacam-se: prevaricação, charlatanismo, infração a medidas sanitárias preventivas, emprego irregular de verba pública, falsificação de documentos, crimes de responsabilidade e crimes contra a humanidade.
A corrupção também foi detectada ultimamente no Ministério da Educação, provocando a prisão do ministro Milton Ribeiro, juntamente com alguns pastores evangélicos. A Operação Acesso Pago da Polícia Federal sugere que os pastores ganham propinas de prefeituras brasileiras indicadas por eles para receber verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
As investigações insinuam que o presidente da república mantém negociações inadequadas com os pastores beneficiados com a corrupção. O ministro da república é investigado por corrupção passiva, prevaricação, advocacia administrativa e tráfico de influência.
A corrupção na Educação condena a população ao atraso intelectual, social e cultural. Um país só consegue se desenvolver com elevados investimento na educação, na ciência e na pesquisa, por isso a corrupção nesta área constitui uma perversidade. Uma perversidade não somente por aprisionar o país no atraso, mas também porque na situação de pobreza em que vivemos muitas crianças frequentam a escola visando também fazer as refeições que não fazem em suas casas.
A corrupção, quando se instala na educação, prejudica milhares de famílias e toda a nação. Trata-se de um crime de elevada gravidade.
Nas eleições de outubro o povo brasileiro terá mais uma vez a chance de melhorar o Brasil, reparando os erros das eleições passadas. Humildade e coragem são necessárias para enfrentarmos a realidade que nos circunda e fazermos o que for preciso para tirar o Brasil do abismo em que se encontra.
Tudo indica que o Brasil está abrindo os olhos para enxergar essa realidade e se dispondo a realizar uma radical mudança na política brasileira.
Sandoval Alves Rocha Fez doutorado em ciências sociais pela PUC-RIO. Participa da coordenação do Fórum das Águas do Amazonas e associado ao Observatório Nacional dos Direitos a água e ao saneamento (ONDAS). É membro da Companhia de Jesus, trabalha no Intituto Amazonizar da PUC-Rio, sediado em Manaus.
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