O aborto é apenas a espuma de uma onda que ganha altura, envolve você em um tubo de normas e o afoga em um turbilhão de insensatez. Do Congresso Nacional às câmaras de vereadores, derramam-se projetos de lei para que o Estado tenha total domínio sobre você. Seu corpo e suas emoções, em breve, não lhe pertencerão. Nem seus direitos. Serão propriedades do governo. Ou, pior. De grupos que, ao se apresentarem como entidades que lutam por você, o adotam como peça de manobra para abocanhar um naco do poder. Agem disfarçados de ‘movimentos sociais’.
Há décadas dividindo a sociedade brasileira, o aborto é exemplar. Não se leva em conta, nunca, o direito da mulher sobre sua própria condição humana, ou seja, dona de seu corpo, suas emoções, seus desejos e senhora de seu destino. Não se considera a pessoa, o indivíduo humano, mas sua ‘função’: procriar em qualquer condição, no caso do dogma religioso, e cuidar dos filhos e da casa, papel social difundido pelo modelo de família tradicionalista. À mulher, não lhe cabe o princípio racional da escolha. Não lhe é, portanto, permitido ser livre. As que desafiam o sistema são logo inseridas no caldeirão da intolerância. Simples assim.
A ‘Escola sem Partido’ é a mais recente bobagem que germina na mesma ideia de sociedade sob um controle central. Há sempre um ‘Grande Irmão’ que sabe o que é melhor para você, desde que você o obedeça e o ame. Esse movimento é mais uma dessas ondas políticas totalitárias que, de tempos em tempos, aparece no horizonte para varrer a praia de qualquer vestígio de humanismo.
Nessa onda, a ideia de ser social só é aceita se o indivíduo se submeter às regras, não às que permitem a socialização pacífica e harmoniosa, mas às que o controlam, o adestram. Domar mentes é a chave para a domesticação e a escola é o ambiente perfeito. Nela não estará mais em discussão as ferramentas intelectuais para se compreender, e superar, os grandes dilemas humanos, mas doutrinas de ensino a partir de uma visão de mundo pronto e restrito. O professor não será mais o mediador entre a curiosidade do aluno e o conhecimento, mas um repetidor de dados.
Caso a sociedade brasileira aceite essa imbecilidade educacional, estará lançada a ‘pedra fundamental’ da policialitização da vida. O termo une as expressões polícia e política para alertar sobre a vigilância total que o Estado exercerá sobre suas gerações. Não se trata de uma ‘escola sem partido’, mas da escola com uma nova política de ideia única, voltada tão somente para o status quo. ‘O Grande Irmão estará de olho em você e seus filhos, sempre’.
A profetização aterrorizante de George Orwell em sua obra icônica – 1984 – ganha, cada vez mais, sinais de se tornar real. Em sua versão moderna, é como o reality show em que, sob o olhar vigilante do big brother, que já tem um julgamento pronto, você adote um determinado tipo de comportamento. Não é mais você, mas você tentando ser o que os outros querem que você seja.
Em seu princípio, a ‘escola sem partido’ é mais uma forma de opressão, física e mental, da polícia das ideias tentando moldar o pensamento para uma única direção. E a investida vem justamente do lado que deveria prezar pela liberdade de pensamento: as câmaras legislativas. Como na obra de Orwell, trata-se de um tirano que é amedrontador porque é abstrato. “Viveremos uma era em que a liberdade de pensamento será de início um pecado mortal e mais tarde uma abstração sem sentido”, disse Orwell.
Os militantes da ‘Escola sem Partido’ rezam nessa cartilha da ignorância e adotam a idiotice política como bandeira social. São justamente dessas ‘boas intenções’ que nascem as tiranias. O contraditório deixará de existir e prevalecerá apenas a ideia de partido único: aquele que estiver no poder. Ao tentar se apropriar do conhecimento, a ‘Escola sem Partido’ pretende moldar a própria noção de linguagem como bem expôs Orwell. ‘Guerra é paz, liberdade é escravidão e ignorância é força.
Fique longe dessa onda. Coisas assim nunca acabam bem, para você.
Cleber Oliveira é jornalista, graduado pela Faculdade de Comunicação e Turismo Hélio Alonso (RJ). Foi repórter e editor na Rádio Federal (RJ), jornal A Notícia (Manaus), Folha Popular (Manaus), e repórter, editor e editor-executivo da TV Cultura Amazonas (Funtec) e dos jornais Amazonas em Tempo e Diário do Amazonas, ambos em Manaus. Também foi articulista no Diário do Amazonas e atualmente é editor no site AMAZONAS ATUAL.
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