Por Milton Almeida, do ATUAL
MANAUS – O Espaço Acessível possibilita ampla visão da arena do Bumbódromo de Parintins (a 369 quilômetros de Manaus) por pessoas com deficiência física, como cadeirantes, e mental. No Sambódromo de Manaus, uma plataforma de madeira é construída para permitir também a boa visão dos brincantes de escolas de samba no carnaval.
São exceções. No geral, até há a acessibilidade a eventos artísticos ou culturais em Manaus, mas não há inclusão. Isto é, uma fila e espaços específicos para pessoas com deficiência.
A representante comercial Ruth Carvalhedo, que é autista e tem mobilidade reduzida, enfrenta essa barreira. Ao prestigiar um show musical na Casa de Praia, na Ponta Negra, encarou fila comum para entrar no local. Reivindicou o acesso prioritário e conseguiu. Uma vez lá dentro, ficou entre os demais frequentadores.
“Nos eventos deve ter uma fila de prioridade e não simplesmente de preferência para qualquer pessoa portadora de deficiência. E uma vez que nós adentremos, deve haver um lugar específico e adequado onde possamos visualizar e disfrutar do evento. E não temos”, disse Ruth. A opção era “esticar” o pescoço para ver o cantor ou ficar na ponta dos pés, uma dificuldade a mais.
Essas barreiras geram experiência da desigualdade de condições. “Manaus ainda não está adaptada para atender os cadeirantes, pessoas com paralisia cerebral e pessoas com deficiência física. O que vemos é muita publicidade na televisão, mas a realidade é diferente”, diz Cristiane da Silva Melo, presidente do Instituto Amor Especial, que que auxilia mães de crianças com necessidades especiais [paralisia cerebral].
A inclusão social em eventos é apenas uma das barreiras enfrentadas pelas pessoas com deficiência. “Há ônibus que circulam com o elevador quebrado, não há adaptação em veículos de aplicativos, em locais de eventos, em lugares turísticos. O que deveria ser prioritário não existe, você tem acesso, mas se sente excluído”, diz Cristiane.
A LBI (Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência 13.146/2015), também conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, define barreira como “qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que limite ou impeça a participação social da pessoa, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à acessibilidade, à liberdade de movimento e de expressão…”.
“Ainda sofremos discriminação por parte da sociedade. Dificultam o acesso aos medicamentos e às consultas, sofrem as crianças e também as mães, e os responsáveis pelas crianças. Então, é muito difícil que haja uma inclusão de uma pessoa nesses locais turísticos e de eventos. Não são pensados para essas pessoas (PCDs), não há suporte para elas”, afirma Cristiane.
Ainda conforme a LBI, há seis tipos de barreiras relacionadas à vida das pessoas com deficiência: as barreiras urbanísticas, existentes em vias e espaços de uso coletivo; as arquitetônicas, encontradas em edifícios; aquelas presentes nos meios de transportes; as de comunicação e informação; as atitudinais, que dizem respeito a atitudes e comportamentos; e as barreiras que dificultam ou impedem o acesso da pessoa com deficiência às tecnologias.
O censo de 2022 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) revela que no Amazonas há 4.023 pessoas com deficiência, de dois anos ou mais de idade. Mais da metade desse total está em Manaus, com 2.231 mil.
Para além da prioridade
“As crianças (com deficiência) fazem gestos, movimentos, olhar de que não estão à vontade, de que não se sentem acolhidos. Como mãe eu percebo que as pessoas discriminam com o olhar, com gestos. As pessoas acham que a criança com paralisia cerebral é doida e retardada. As crianças têm uma deficiência física e motora, eles não têm problemas intelectuais”, diz Cristiane.
A presidente da Casa Azul Amazônia, que cuida de pessoas com deficiência motora, Elaine Costa, defende que o acesso a eventos culturais e locais públicos vá além de uma fila exclusiva. “Os locais de eventos (físicos) devem passar por uma adequação, pensada para as pessoas com deficiência. Somente o acesso não é suficiente. A PCD deve se sentir acolhida, que ela possa visualizar o evento e possa se divertir”, diz.
A LBI diz no Artigo 44 que “nos teatros, cinemas, auditórios, estádios, ginásios de esporte, locais de espetáculos e de conferências e similares, serão reservados espaços livres e assentos para a pessoa com deficiência, de acordo com a capacidade de lotação da edificação, observado o disposto em regulamento.§ 1º Os espaços e assentos a que se refere este artigo devem ser distribuídos pelo recinto em locais diversos, de boa visibilidade, em todos os setores, próximos aos corredores, devidamente sinalizados, evitando-se áreas segregadas de público e obstrução das saídas, em conformidade com as normas de acessibilidade.
Acessibilidade gera empregos
O produtor cultural Leandro Tapajós opina que na hora de montar um evento, os organizadores devem pensar que o público é diversificado, com necessidades diferentes. “Primeiramente, temos de pensar na pessoa. A gente tem que se colocar no lugar do outro. Quando você escolhe o local para o evento, você tem que pensar na pessoa. E eu vejo que ainda há carências por espaços acessíveis em eventos de entretenimento. Temos que pensar na pessoa que caminha e na pessoa que não caminha”, diz.
O respeito à acessibilidade traz vantagens, lembra o produtor, porque é capaz de gerar outro mercado e dar emprego nos eventos. “Em eventos você precisa de monitores, de tradutores de libras, seguranças, etc. tudo isso para garantir a qualidade do evento. Isso tem que estar no orçamento”, diz Leandro.