MANAUS – A pressão feita por pescadores do Estado do Amazonas pode impor ao Governo Federal um novo constrangimento no Congresso Nacional. Isso porque um requerimento que tem como objetivo suspender os efeitos da Portaria Interministerial nº 192, de 5 de outubro de 2015, deve ir à votação na próxima quarta-feira, 28, na Câmara dos Deputados. Nesta quarta-feira, 21, uma audiência para tratar o tema com representantes do Ministério de Meio Ambiente (MMA) e Ministério do Trabalho foi realizada na Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e da Amazônia (Cindra). No Amazonas, cerca de 110 mil famílias foram atingidas pela medida. O benefício envolve um recurso de R$ 280 milhões para o Amazonas e R$ 2,3 bilhões em todo País.
Deputados da comissão da base aliada e da oposição se posicionaram favoráveis aos relatos das lideranças dos pescadores e declaram apoio à revogação da Portaria que suspendeu o Defeso no Amazonas. “Com a coleta da assinatura de todos os lideres de partido, encurtamos o caminho para pôr o requerimento em votação na Câmara. Sem isso, o pedido teria que passar pelas comissões de Meio Ambiente, Agricultura e CCJ. Mas, com a assinatura dos líderes, o requerimento vai ser votado na quarta-feira da semana que vem, em regime de urgência, e a gente vai derrubar”, declarou o deputado federal Silas Câmara (PSD), autor do requerimento que pede a suspensão da Portaria que pôs fim ao período do Defeso em todo País.
Quinze lideranças da pesca de várias regiões do interior do Amazonas participaram da audiência presidida pelo deputado federal Silas Câmara, que cedeu quinze minutos para o deputado estadual e presidente da Comissão de Agricultura, Pecuária, Pesca, Abastecimento e Desenvolvimento Rural (CAPPADR) da Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas, Dermilson Chagas (PDT), expor um panorama da pesca, do período de reprodução das espécies de peixes amazônicos e de questões sociais enfrentadas pela categoria de pescadores no Estado. Na quinta-feira (22), as lideranças da pesca e os deputados do Amazonas deverão ser recebidos no Ministério do Meio Ambiente para uma reunião com a ministra Izabella Teixeira.
“O Ministério do Meio Ambiente diz que a suspensão foi feita com base em estudos da região de cinco anos. Não me parece que esse estudo tenha sido feito no Amazonas. A portaria já seria absurda em colocar o País de forma igual, porque o Defeso no litoral foi feito e pago. Mas no Amazonas, inicia em novembro. O Governo Federal não pode por meio de portaria convencer os peixes a se reproduzirem só daqui a cinco meses. A reprodução das espécies tem o curso da água. Na seca, o peixe morre. Ele não se reproduz”, declarou Dermilson Chagas.
Para Chagas, a medida mascarada de ação de combate à fraude tem como único efeito punir a população mais fragilizada. “O pescador de grande escala invade o Amazonas. O MMA poderia botar uma barreira em Tabatinga para ver que ia desabastecer vários países. Porque, por semana, dois cargueiros posam em Leticia levando peixes nossos. Numa ação em que a nação brasileira não ganha nada. Levam peixe de todo tamanho. E essa Portaria só faz prejudicar o pescador artesanal”, afirmou.
Duas deputadas do PMDB, Jessica Sales (Acre) e Simone Morgado (Pará), afirmaram que darão votos favoráveis ao requerimento de suspensão da Portaria nº 192 e se dispuseram a assinar a convocação da ministra Kátia Abreu (Mapa), que é do mesmo partido que elas. “Essa ministra não recebe nem a gente que é do partido dela”, declarou Simone Morgado.
Jessica Sales afirmou que é um absurdo resolver crise econômica punindo os trabalhadores. “Esse partido que se diz tão social e tão favorável à causa dos trabalhadores trata desse jeito os pescadores. Também assino para convocação da ministra Kátia Abreu e não posso concordar com uma medida que pune os trabalhadores, os pescadores”, afirmou.
A deputado federal Conceição Sampaio (PP) afirmou que o Governo está cheio de contradições por não ouvir ninguém. Criticou que os pescadores e as comissões do parlamento não tenham sido ouvidos antes da edição da portaria. “Como pode a rodovia BR-319 não pode avançar por problemas ambientais, mas aqui vejo que o Ministério do Meio Ambiente dizer que pode pescar porque não tem dano ambiental?”, questionou.
O deputado Pauderney Avelino (DEM) afirmou que a portaria foi feita por burocratas que não tem o menor conhecimento da região amazônica.
Portaria e protestos
Os pescadores tentam evitar as graves consequências sociais e ambientais da Portaria nº 192 do Governo Federal, assinada pelo MAPA e MMA, no dia 5 de outubro. Na portaria, os ministérios suspendem o defeso e o pagamento do benefício referente à pesca da pirapitinga, mapará, sardinha, pacu, aruanã e matrinxã, antes proibida para garantir a reprodução das espécies. A medida, que afeta 110 mil famílias de pescadores no Amazonas, foi tomada sob a justificativa de recadastrar os beneficiários do sistema e revisar as áreas de abrangência para evitar as fraudes.
No último final de semana, protestos envolveram lideranças de 30 municípios de todas as regiões do Amazonas. No sábado, em Novo Airão, cerca de 100 pescadores percorreram as principais ruas do município protestando contra a decisão. Em Lábrea, mais de 1 mil trabalhadores da pesca se reuniram no centro da cidade. No domingo, o movimento chegou em Manacapuru, onde 300 pescadores pediram o cancelamento da medida. Os pescadores também foram às ruas no município do Urucará.
Planalto desconhece realidade do Amazonas
O deputado estadual Dermilson Chagas criticou o estudo que o representante do Ministério do Meio Ambiente apresentou como base para a suspensão do período do Defeso. “Se tivéssemos um estudo sério da região, estaríamos debatendo defeso por calha de rio, porque o nosso Estado tem dimensões continentais e situações diversas. O peixe que se reproduz no alto rio Negro não é o peixe que se reproduz no Purus. O Amazonas é formado por um complexo geográfico com diferenças gritantes por calha de rio: o alto Rio Negro está isolado, o Juruá está seco. O Madeira cheio e o peixe raro por uma série de questões ambientais”, declarou.
Dermilson afirmou que os ministérios deveriam se concentrar em fazer estudos que procurasse avançar e não retroceder no debate ambiental e de preservação das espécies de peixes no Amazonas. “Estamos falando aqui de um ciclo de reprodução diferenciada de várias espécies. O senhor está falando de seis espécies. E as outras, que já não é tem o mesmo tamanho como o jaraqui? Se não criar um mecanismo de substituição do trabalho do pescador, ele não terá outra alternativa a não ser pescar. Os estudos técnicos deveriam ser anuais. Não podem ser a cada cinco anos. A mudança climática é um fato”, afirmou.