Do ATUAL
MANAUS – O STM (Superior Tribunal Militar) manteve a condenação de um sargento da Marinha do Brasil que foi integrante da missão de Paz das ONU (Organização das Nações Unidas) no Líbano.
Na primeira instância da Justiça Militar da União, em Brasília, o sargento foi condenado a quatro anos, cinco meses e 22 dias de reclusão. Ele foi acusado de abuso sexual cometido contra duas mulheres libanesas e de divulgação de imagens em aplicativo de mensagens. A ação penal correu em segredo de justiça e a sentença de primeiro grau é de maio de 2021.
Na mesma sentença, o militar também recebeu do Conselho Permanente de Justiça, da 1ª Auditoria Militar de Brasília, a pena acessória de exclusão das Forças Armadas. O réu foi acusado pelos crimes de constranger alguém, sob ameaça, a manter ato libidinoso diverso da conjunção carnal, crime previsto no Código Penal Militar, e por divulgação de cena íntima sem autorização, crime previsto no Código Penal Brasileiro.
O graduado, que fazia parte do contingente brasileiro dos blue helmets (capacetes azuis), em que os membros representam, em primeiro plano, a ONU, e, depois, o próprio país, teve a pena aumentada em um quinto, justamente por representar a ONU e o Brasil.
O caso ocorreu entre abril e junho de 2019. Segundo o Ministério Público Militar, o sargento, durante o desempenho das funções na missão da Força Interina das Nações Unidas no Líbano, conheceu duas mulheres em um aplicativo de relacionamento e manteve íntimo relacionamento com ambas.
Em determinado momento, constrangeu uma delas, mediante violência e sem consentimento, a praticar consigo ato libidinoso, abusando da confiança depositada nele pela vítima. O militar também transmitiu a terceiro, por aplicativo de mensagens, sem o consentimento da ofendida, cena de sexo, envolvendo a vítima, identificando-a expressamente como sua namorada.
Em juízo, o militar negou a prática de agressão ou violência e não esclareceu o tipo de relacionamento que mantinha com a mulher.
A juíza federal da Justiça Militar da União Flávia Ximenes Aguiar citou, no voto, que a defesa do militar sustentou que não haveria prova de que a imagem analisada no processo fosse de uma das vítimas.
Mas a juíza afirmou que mesmo que a imagem não estivesse suficientemente associada à mulher, a contraprova, aventada pela defesa, somente seria possível por intermédio de violação íntima ainda maior em relação a ofendida, a exigir o inexigível que a ofendida, ou mesmo outra pessoa que recebeu as imagens, apresentasse suas partes íntimas para serem comparadas com a foto divulgada, a fim de contradizer a associação de imagens feita.
“Impensável tal possibilidade. Ora, se ele manda uma foto de rosto, abraçado com a vítima, dizendo que esta é a ‘minha namorada libanesa’ e, depois, manda uma foto, mantendo conjunção carnal, e afirma ser esta a sua namorada, então, restou configurada a violação da intimidade da libanesa, uma vez que a imagem do ato sexual foi a ela atribuída, sem chance, no repasse da imagem, de qualquer contestação”, disse.
Para a juíza Flávia Aguiar, todas as provas apontaram no sentido de que o acusado, com consciência e vontade, transmitiu o registro da cena de sexo, identificando como sendo ele próprio com a libanesa, sem que houvesse consentimento para tal associação de imagens e divulgação.
“Restou evidente que o sargento era ‘habitué’ e vezeiro em aplicativos de relacionamento e expôs o bom nome da Força de Paz e do Brasil ao se envolver, de forma leviana e irresponsável, com as locais, sem um mínimo de preocupação com o desenrolar de suas aventuras, a ponto de a ONU ter acionado as cláusulas do Memorandum of Understanding, para que o Brasil tomasse as providências sobre a noticia criminis registrada naquele Organismo Internacional”, diz trecho da decisão.
Os demais juízes do Conselho Permanente de Justiça seguiram o voto da juíza e condenaram o réu, que pode recorrer em liberdade.
Recurso do STM
A defesa do sargento recorreu ao Superior Tribunal Militar alegando haver debilidade do diálogo em língua estrangeira; de haver um relacionamento amoroso entre a vítima e o militar; e da exigência de laudo pericial nos crimes que deixam vestígio.
No Tribunal, houve pedido de vista e interpretações divergentes. Por fim, por maioria de votos, a Corte seguiu o voto do ministro Artur Vidigal de Oliveira que manteve a sentença de primeira instância.