EDITORIAL
MANAUS – Desde que o sistema de abastecimento de água e esgotamento sanitário de Manaus foi privatizado, há 21 anos, o município já teve quatro empresas como concessionárias dos serviços: Manaus Saneamento (2000), Águas do Amazonas (2007), Manaus Ambiental (2012) e a atual Águas de Manaus (2018).
Em que pese algum investimento feito pelos grupos que controlam essas empresas concessionárias, é o dinheiro público que ergue a maior parte das obras para a melhoria dos serviços.
Não era essa a promessa quanto o então governador Amazonino Mendes anunciou que a Cosama seria privatizada. O contrato de concessão assinado em 4 de julho de 2000 não tinha qualquer previsão de investimento público nos sistemas de abastecimento de água e tratamento de esgoto sanitário. Tudo deveria ser feito pela concessionária.
Uma mudança no contrato de concessão feita no 1° termo aditivo, assinado pelo então prefeito Serafim Corrêa, em 10 de janeiro de 2007, introduziu a possiblidade de o Poder Público investir e repassar os bens à concessionária para exploração do serviço.
Naquele termo aditivo estava previsto o seguinte: “Eventuais bens provenientes de investimentos públicos no curso da concessão, sob qualquer modalidade de parceria, que passarem a ser a ela vinculados para manutenção deverão ser contabilizados de forma segregada e não integrarão, em qualquer hipótese, a base de cálculo de qualquer amortização, depreciação ou indenização de bens reversíveis não amortizados”.
Aquela previsão aparece porque o Governo do Amazonas já estava se preparando para fazer o investimento público na nova captação de água da Ponta das Lajes, na zona leste de Manaus, que depois ganhou o nome de Proama.
Mas chama a atenção também nesse 1° termo aditivo o item 5.6 (Cláusula Quarta): “Excetuados aqueles prevenientes de recursos onerosos, os investimentos públicos no curso da concessão, sob qualquer modalidade, não integrarão a base de cálculo da composição tarifária.
Trocando em miúdos, ficou acordado que os investimentos públicos não teriam qualquer impacto no preço da tarifa. Neste caso, os impactos seriam para reduzir o valor e nunca aumentar, uma vez que o dinheiro público estaria financiamento o serviço explorado pela empresa privada.
Em 29 de outubro de 2008, Serafim Corrêa e a empresa Águas do Amazonas assinaram o terceiro termo aditivo para incluir o investimento público como obrigação do Poder Executivo estadual. Logicamente, tudo em comum acordo com o governador da época, Eduardo Braga.
“Caberá ao Estado do Amazonas realizar os investimentos para a consolidação do abastecimento de água de Manaus através do sistema Ponta das Lajes, conforme termo de compromisso firmado entre o Estado do Amazonas e o Poder Concedente” (Cláusula Segunda – Item 3.2.2.). O poder concedente é a Prefeitura de Manaus.
A justificativa usada para a entrada do Poder Público como investidor dos serviços que deveriam ter investimentos da concessionária foi a de que houve uma expansão da cidade desde a privatização, com ocupação desordenada nas zonas norte e leste de Manaus, o que tornou a concessão inviável economicamente e impossível de se cumprir as metas.
Além dos investimentos no Proama (sistema de captação e tratamento de água), a Prefeitura de Manaus precisou fazer os investimentos na rede de distribuição de água.
Em 2012, quando o então prefeito Amazonino Mendes assinou o 4° termo aditivo ao contrato, a concessionária ganha um novo presente: a tarifa de esgotamento sanitário, que até aquele momento custava ao consumidor 80% do valor da tarifa de água, passou a custar 100%. Ou seja, se o consumidor usar água equivalente a R$ 100, pagará R$ 100 de tarifa de esgoto: total da fatura R$ 200.
Também no 4° termo aditivo, Amazonino amarrou a “doação do Proama” à concessionária de água e esgoto de Manaus.
“No tocante às obrigações constantes da Cláusula 6ª, que se referem à operação, manutenção e administração do Complexo Proama, fica desde já acordado entre as partes que estas só passarão a ter eficácia após a assinatura do termo de compromisso entre o Estado do Amazonas e o Município de Manaus, com a interveniência-anuência da concessionária e da Agência Reguladora dos Serviços Públicos Concedidos do Estado do Amazonas – Arsam.”
Em 4 de abril de 2014, o então prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto, assinou o termo de compromisso e passou o Proama para a concessionária.
A assinatura foi “vendida” à população como um grande feito para por fim ao problema crônico de falta de água nas duas zonas mais populosas de Manaus: norte e leste.
O que não foi dito naquele momento é que o investimento público feito no Proama e na rede de distribuição de água não voltaria como benefício para a população. Foi um presente à empresa privada que assumiu o controle da água e do esgoto de Manaus há 14 anos e não deu conta de fazer que estava contratado.
Os detalhes dessa história e algo semelhante que vem ocorrendo também no sistema de tratamento de esgoto, o ATUAL está contando na série de reportagens “Saneamento: o privado financiado pelo público”. A primeira matéria está na manchete deste domingo.